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Entrevista ou interrogatório?

Prefeito Crivella durante entrevista coletiva (Tomaz Silva/Agência Brasil)

É possível que o prefeito Marcelo Crivella tenha brincado com bambolês na infância. É o que ele fez crê nas entrevistas sobre os tais “Guardiões do Crivella”, gente paga com o dinheiro do povo para enfrentar a imprensa nos arredores dos hospitais do Rio e defender o prefeito. 

Uma das entrevistas, ele concedeu à jornalista Bruna Fanti, do jornal O DIA. Ali, acuado pela insistência da jornalista por uma informação coerente com o que se viu nas cenas transmitidas pela TV, Marcelo Crivella, em determinado momento,  tentou constrangê-la com uma pergunta: “Isso é uma entrevista ou interrogatório?”.

Pedro Rafael, um dos criadores do Boletim da Liberdade, ingressou na Justiça com uma ação popular para obrigar o prefeito a sair da entrevista para o interrogatório. O juiz da causa já interpelou o prefeito. 

Marcelo Crivella tem sido criticado pelas decisões que toma como prefeito, mas elas são consequência de um modo de fazer política que aterrissou no Estado e na cidade do Rio de Janeiro em 1982, quando Leonel Brizola chegou, pelo voto popular, ao governo do estado. Na raiz está o populismo oportunista, que faz dos direitos da população favores prestados pelo governante do momento, por caridade e misericórdia. Crivella juntou a declaração da vontade de Deus nisso. 

Representante da esquerda impetuosa, carismática, Brizola, eleito governador do Rio em 1982, indicou Jamil Haddad e Marcello Alencar para a prefeitura do Rio. Cabe lembrar que até 1985, os prefeitos das capitais eram indicados pelos governadores. 

Na eleição direta de 1985, Brizola conseguiu eleger Saturnino Braga, com pouco mais de 30% dos votos, porque os contrários se dividiram e as eleições aconteciam em turno único. Depois, Brizola abençoou Marcello Alencar e tentou fazer o mesmo com Cidinha Campos. César Maia, contudo, foi eleito, depois de romper com Brizola não por razões ideológicas, mas, simplesmente, para ocupar o poder e dar curso à carreira política solo e, em seguida, criar seu próprio time. 

Depois veio Conde “que era César e César que era Conde” e, novamente, César, para um terceiro mandato, o pior deles. César não queria Eduardo Paes, que era César e deixou de ser para ser Cabral, do mesmo modo  não por divergência ideológica, mas, pelo desejo de ocupar por si mesmo o poder e dividí-lo com Cabral e com o PMDB. 

Em 2016, Eduardo Paes fingiu ser Pedro Paulo, para permitir a eleição do Marcelo Crivella ou do Freixo, com o intuito de retomar o poder com mais facilidade  adiante, como tenta fazer desde 2018, quando retornou ao clã dos Maias. 

Portanto, o populismo que não reconhece os direitos da população para distribuí-los como dádivas de quem manda, vem desde  Brizola, atravessou todos os governos na prefeitura do Rio e encontrou morada mais desorganizada no coração e na mente do Bispo. Não é por destino, por conseguinte, que o Rio esvazia-se, ano após ano, da importância política, econômica e cultural que teve antes daquele tempo. Tem gente que culpa a perda da Capital e a fusão. Se isso valer, eu culparei Mem de Sá e Estácio, por não terem permitido que fôssemos franceses. 

A cidade é governada por um mesmo grupo político e pelos mesmos métodos há 38 anos. Tivemos uma pequena folga com o primeiro período do César Maia e com Luiz Paulo Conde, mas sem grandes arranhões no modelo tradicional, que Marcelo Crivella só exagerou, porque até para ser populismo e oportunista é preciso ter competência. Ou, de sã consciência, se pode dizer que só Crivella desorganizou a cidade e tem “Guardiões”, gente paga com o dinheiro público para favorecer seus líderes na permanência na prefeitura? 

Se nesta eleição os cariocas não terem uma guinada na direção dos liberais, gente que reconhece e faz valer a ações do Estado com a cidadania, não por misericórdia ou favor, mas por obrigação constitucional, elegem quem quiserem e parem de reclamar, porque o modelo que avacalha o Rio há muito tempo sobreviverá. 

Sejam bem-vindos os liberais. É hora de enquadrar o Estado, nesta eleição, representado pelas prefeituras e câmaras municipais. 

Por Jackson Vasconcelos

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Podcast 21: Discurso e saúde

Já repararam que nos discursos políticos, quando o tema saúde é levantado, só se fala na doença? Os discursos deveriam falar da saúde dos cidadãos, isso quer dizer, da prevenção às doenças, de prevenir para que elas não aconteçam.

Esse é o tema do podcast da semana!

 

Por Jackson Vasconcelos

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Kamikaze

Oportunidades e ameaças são conceitos da estratégia e é prova de bom senso aproveitar as oportunidades e descartar as ameaças, seja anulando-as, seja transformando-as em oportunidades. 

Contudo, o presidente Jair Bolsonaro, assunto único do mundo político do Brasil desde a facada que ele levou em Minas Gerais, faz diferente. Ao que parece,  o presidente firmou uma aliança com as ameaças, num processo de estratégia negativa. Ou, se preferirmos o que diz o consultor de estratégias, Michael Raynor, temos aí um paradoxo da estratégia, situação que se verifica quando a principal causa do fracasso estratégico não é a estratégia ruim, mas uma boa estratégia que simplesmente provoca um erro. O presidente acredita piamente que a melhor estratégia de sobrevivência seja o conflito. Não é. 

O clímax dessa escolha está agora na relação dele com o Covid-19. A oportunidade de explorar a imagem de um governo que age para ajudar a população a suportar o mal – atitude que o governo federal, realmente, tem adotado – o presidente prefere uma briga inútil contra os fatos. No caso Covid, o presidente se porta como um soldado que caminha na direção oposta à do resto do batalhão. 

A opção pelas ameaças jogou a imagem do presidente numa areia movediça, que a faz afundar tanto mais o presidente se movimente.

Vejam vocês se não tenho razão. 

Jair Bolsonaro foi eleito presidente a bordo de uma campanha nunca imaginada competitiva e levou com ele, para Brasília, um bom número de deputados federais e senadores aliados.

Esse grupo de parlamentares definiu a Presidência da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, neste caso, disputada entre uma velha e experiente raposa, Renan Calheiros, e um senador desconhecido fora do Pará e de sobrenome complicado : Alcolumbre Tobelem. 

Com a ajuda dos senadores aliados ao Presidente da República, Alcolumbre derrotou Calheiros com requintes de humilhação. Se vencesse a velha raposa ou, se ela, pelo menos, saísse fortalecida, teríamos uma pedra no sapato do presidente da república, uma ameaça forte ao projeto dele. 

O resultado da disputa no Congresso Nacional somou-se à garantia que o presidente obteve dos eleitores para condução do governo do jeito que bem entendesse. 

Isso deu ao presidente e aos auxiliares que ele escolheu sem ouvir partidos ou aliados, situação totalmente nova na República, segurança para  aprovação das reformas essenciais à criação de um Brasil novo, onde o Estado deixe de ser carrasco dos contribuintes e distribuidor de privilégios entre apadrinhados e bajuladores do poder. 

Em paralelo, o apoio popular ao presidente  crescia impulsionado por imagens inéditas e fortes. A primeira ocasionada pela decisão do presidente de entregar à esposa o privilégio do mais importante discurso da posse, aquele que acontece no Parlatório do Palácio e é assistida no mundo todo. A decisão produziu uma cena maravilhosa nunca ocorrida na história das nações. 

A senhora Michelle Bolsonaro, por sua vez,  deu o recado de maneira magistral. O presidente e a esposa criaram a imagem de um governo reformador e inclusivo. Esta atitude em qualquer lugar do mundo valeria bastante e, por aqui, vale bem mais, porque somos um país que ainda discrimina as mulheres na política e cuida pouco das pessoas com deficiência. 

A liberdade para a escolha dos ministros e de uma ministra, sem ouvir o Congresso Nacional ou os partidos, acrescentou mais valor à imagem do presidente e na esteira correram nomes de bom peso, como Paulo Guedes, Sérgio Moro, Tarcísio, Teresa e outros. O Banco Central, o Banco do Brasil, a Petrobras, a Caixa Econômica e todas as empresas do governo passaram ao comando de gente com qualidade pessoal e competência reconhecidas. Interrompeu-se o canal de comunicação do Estado com o financiamento de interesses pessoais e partidários. E a popularidade do presidente chegava à cabeceira da pista para levantar voo.

Talento ou sorte? 

Na arte de administrar as oportunidades e ameaças estamos descobrindo que o presidente tem mais sorte que talento. 

Neste ponto, dou um salto até a Segunda Guerra Mundial, para encontrar por lá os “ventos divinos”, os kamikazes. 
Derrotados várias vezes na tentativa de manter os americanos longe das ilhas filipinas, ponto estratégico para a guerra, e já com poucos soldados, equipamentos de mar, terra e ar, os generais japoneses convocaram voluntários. 

Chamados com base no Código de Honra do Japão, que estabelece ser melhor morrer do que viver como um covarde, os soldados voluntários foram convocados para morrer pela pátria e pelo imperador, ser supremo a quem, as vontades de todos os japoneses  deveriam estar subordinadas.

A imagem mais conhecida dos kamikazes está vinculada aos aviões que eles jogaram sobre a frota de porta-aviões americanos. Os jovens pilotos eram enviados ao combate só com combustível para a ida, fugindo do risco de, no momento do lançamento, se arrependerem. 

Mas, eles também agiram em terra, prendendo minas em volta do próprio corpo e se atirando debaixo dos tanques inimigos. Com a tática, os japoneses retardaram o avanço das tropas americanas. Isso não adiantou muito, mas os que morreram, certamente, levaram a ideia de ter valido a pena.

Em nome do imperador e da honra, mais de 70 mil jovens japoneses perderam a vida na aplicação da tática suicida. 

O Presidente do Brasil é um kamikaze, mas sem alvo definido. Ele atira-se à morte todos os dias, jogando-se contra os adversários e, cada vez mais, contra os próprios aliados. No final, ele poderá morrer sem honra, mesmo que não seja um covarde. 

Do mesmo modo como é um estrategista com sinal trocado, o presidente é um kamikaze que se lança contra os próprios aliados, transformando-os, com velocidade, em inimigos. Jair Bolsonaro não perdoa, não negocia. Contrariado, ele amarra uma mina em volta da cintura e se atira, sobe num avião de guerra e se lança ao mar. 

De atrito em atrito, o presidente reduziu a margem de conforto que tinha no Congresso Nacional e perdeu apoios na sociedade. 

Por sorte e, ao que se vê, não por talento, o Kamikaze Bolsonaro assumiu em janeiro de 2019, o comando de um avião abastecido para uma viagem de oito anos e com garantia de retorno, em glória, para a base. Mas, ele fez um rombo no tanque, que perde combustível enquanto o avião voa. 

Ainda há tempo para salvar a viagem? Claro que sim. A estratégia é uma ferramenta de trabalho quase milagrosa. Se o presidente quiser salvar o próprio governo deveria começar por evitar os atritos.  

Na estratégia, o atrito produz o mesmo efeito que na física: reduz a aceleração. Ao mesmo tempo, o presidente deveria identificar, com rapidez, as oportunidades e apoios que ainda lhes restam e potencializá-las ao máximo, para enfraquecer as ameaças, que estimulou até agora. O presidente precisa de um reset no sistema de governo e de comunicação. 

Quando a gente cuida de projetos políticos, a imagem é a matéria-prima. Nesse ambiente, o pior não é o impeachment nem a renúncia, situações que não acredito possíveis. O problema está na imagem que o presidente deixará registrada nas páginas da história. Isso sim é importante e deveria ser a preocupação principal na cabeça de alguém a quem a sorte confiou o destino de uma Nação. 

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Que raios de Estado!

O isolamento é o mal menor da epidemia. O medo do futuro é pior. Que país, afinal, encontraremos nós, quando deixarmos a caverna? Será que, como os personagens de Platão, teremos medo de enfrentar a realidade por desconhecermos o quanto ela pode ser bela à luz do sol e da liberdade? Qual a melhor estratégia para após o confinamento? 

Sábado (28), o ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, declarou: “O mundo sairá dessa sem vencedor, nem perdedor, mas sairá diferente. Sairá um mundo reflexivo, que terá que repensar os valores, a dinâmica social e como nós vamos nos comportar daqui pra frente”. 

Estou com dificuldade para entender a ausência de perdedores, porque quem morreu ou ainda morrerá perdeu a luta do mesmo modo como quem tem ou terá entre os mortos gente sua. 

Se há perdedores, existirão vencedores, os sobreviventes e aqueles que da epidemia conseguirem tirar alguma lição. 

As empresas privadas, aquelas que podem, estão dando uma contribuição relevante ao Brasil. Certamente, não por altruísmo, mas por compreensão da força que tem o capitalismo, quando dá à relação capital-trabalho, o sentido de um bom negócio. 

Adam Smith viu assim, na Riqueza das Nações: “Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro, que esperamos o nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelos próprios interesses. Apelamos não à sua generosidade, mas ao seu amor próprio, pois nunca conseguiremos sensibilizá-los pelas nossas necessidades, mas pelas vantagens que eles podem obter”. 

Sobre as ajudas do Estado, das empresas e bancos às pessoas durante a epidemia, a revista Exame trata numa matéria que o editor intitulou com a pergunta:  “Quem vai salvar a economia?”. Os jornalistas Natália Flach e Rodrigo Caetano responderam. Os bancos estão lá com o papel de sempre: emprestar a juros altos e fazer isso com o semblante de caridade. 

As empresas, com os exemplos da UBER, IFood, Starbucks e Facebook e de algumas fundações. O Estado, com os governos dos EUA, da Alemanha, China, Reino Unido, Japão, França, Dinamarca, que decidiu bancar 75% dos salários dos empregados das empresas privadas para evitar demissões, e o Brasil, com a proposta menos ambiciosa de todos os países citados. Não por insensibilidade, mas por incapacidade. 

O Brasil tem dificuldades para oferecer mais, porque somos uma economia tradicionalmente travada e que tem uma estrutura de serviços públicos em colapso, mesmo nos dias normais. 

A causa disso tudo é o tipo de Estado que temos. Ele é caro. A overdose de tributos, burocracia e ineficiência tem feito de nós uma Nação com uma economia debilitada, apesar de todo o potencial de crescimento que ela tem. 

O COVID-19 terá prestado um excepcional serviço ao Brasil se convencer a Nação e, principalmente, aos seus agentes públicos, que o Estado precisa pesar menos sobre o setor privado para que ele possa produzir melhor e com mais qualidade. Desse modo, ele gerará empregos e também tributos para dar ao Estado, numa situação de emergência, a capacidade de fazer melhor do que tem feito agora. 

Vale ler a matéria da Exame, que está de cara nova.  

Tomara que o ministro Mandetta esteja certo quando diz que do tempo difícil do coronavírus, “sairá  um mundo reflexivo, que terá que repensar os valores, a dinâmica social e como nós vamos nos comportar daqui pra frente”. Se isso ajudar o Estado a rever posições, aí, sim, a dor terá gerado uma criança sadia e mais feliz.   

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Podcast 13: Uma aula do professor coronavírus

No podcast da semana, Jackson Vasconcelos fala sobre a lição que a pandemia do coronavírus está dando para os políticos do Brasil, principalmente para os prefeitos.

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Podcast 3: A crise da Saúde no Rio

Todos os dias estamos vendo as mesmas imagens na TV: o sofrimento das pessoas nas portas dos hospitais e postos de saúde, principalmente no Rio de Janeiro. Esse é o assunto do 3º podcast de Jackson Vasconcelos.