O coronavírus apareceu no Brasil com as consequências que a gente conhece e, num piscar de olhos, reacendeu uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que propõe transferir as eleições deste ano para 2022. A proposta foi apresentada no início do ano passado por um deputado federal do MDB de Santa Catarina.
O argumento do projeto, no ano passado, era fazer coincidir todas as eleições, num estilo de eleições gerais, que levariam o povo a decidir, de uma só vez, a Presidência da República, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, os Governos Estaduais, Assembleias Legislativas, as Câmaras Municipais e Prefeituras. Algo semelhante, o Brasil já viveu em 1982, quando prorrogados foram os mandatos dos prefeitos e vereadores. Naquele ano, só não houve eleição para Presidente da República, ainda indireta.
O argumento de agora seria usar o dinheiro do fundo eleitoral no trabalho de combate ao vírus e, na voz do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, evitar que o Congresso Nacional trabalhe menos no combate ao vírus e mais nas campanhas municipais. É claro que a proposta do ministro apresentada diretamente aos maiores interessados, os prefeitos, fez sucesso. E a legítima má vontade que tem o povo com o financiamento dos partidos com dinheiro público ajuda o discurso.
Se acontecer o adiamento, o povo, mero detalhe nas formulações legislativas no Brasil, será obrigado a conviver mais dois anos com prefeitos e vereadores que gostaria de ver pelas costas, simplesmente, para que o Estado Brasileiro faça melhor uso do dinheiro que os contribuintes entregam. Será que fará? Certamente, não. Afinal, sabe-se que é costume no Brasil, o Estado arrancar dinheiro com o argumento de melhorar o atendimento médico e, no final, desviar o que foi arrecadado para outras finalidades.
Mas, a proposta é uma boa oportunidade para se debater o financiamento público para as campanhas eleitorais e sustento dos partidos.
A gente financia com o dinheiro público todos os partidos, gostemos ou não de todos ou de alguns ou mesmo de nenhum. O Congresso Nacional decidiu que seria assim e assim é. Podemos até reclamar do fato, mas sabendo que isso de nada adiantará. O mal está feito.
O problema dos fundos de campanha e partidário é o mesmo relativo a todos os tributos, numa situação em que o povo paga, recebe pouco de volta e não é consultado sobre o destino do dinheiro.
O legislador brasileiro deveria criar mecanismos legais que permitam ao contribuinte designar a preferência dele pelos partidos que é obrigado a financiar por intermédio do Estado. Em outros tempos, a consulta seria um processo complicado, mas com a tecnologia do presente, é um ato simples de vontade, que pode ser confirmado com o apertar de uma tecla no computador ou no telefone.
Então, quem leia pela cartilha do MDB, do DEM, do PTB ou de qualquer outro partido, que declare a sua preferência ao Tesouro Nacional, que destinará aos de preferência dos eleitores a quantia proporcional às indicações que cada um recebeu.
Se no final do processo, ninguém quiser financiar partido algum – situação bem possível em razão da imagem desgastada dos partidos – os filiados que se virem para melhorar a imagem dos seus partidos ou para buscar financiadores, como se fazia no passado. Os recursos registrados no Orçamento para o financiamento das campanhas e dos partidos seriam redistribuídos na forma que a Lei de Diretrizes Orçamentárias autorizasse.
Mas, eu tenho certeza que os partidos, por facilidade, segurança e rapidez, farão campanhas para conquistar o coração e a fidelidade dos eleitores, para deles ter algo mais que o voto, a confiança.
Aí sim, com essa medida, acabaríamos de vez com os partidos de aluguel ou que têm donos, porque quem estivesse a pagar a conta com a chance de cobrar pelo serviço, não deixaria a situação correr frouxa como acontece hoje.
Que tal?
Eis aí uma boa estratégia que conseguiria fazer do dinheiro público que vai para as campanhas e para o sustento dos partidos, uma oportunidade de participação política mais efetiva, com gosto de cidadania, e não mais uma ameaça à democracia representativa, como acontece hoje.
*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.
Por Jackson Vasconcelos
Foto: Adriano Machado/Reuters