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POR QUE TRUMP VENCEU? 

Jackson Vasconcelos, 12 de novembro de 2024

Se você deseja uma pista para a razão da vitória do republicano Donald Trump, busque na opinião que têm os americanos da classe média sobre as políticas públicas dos democratas, que fazem caridade aos pobres com o dinheiro de quem trabalha duro e paga impostos. Uma boa dica está no livro “Era uma vez um sonho”, escrito por J. D. Vance, eleito vice-presidente na chapa republicana. J. D. Vance escreveu o livro no tempo em que nem sonhava estar com Trump na empreitada. 

Vamos lá: 

Ele conta as experiências dele como caixa num mercado perto da casa da avó, com quem ele, na época, morava:

“(…). Também aprendi como as pessoas jogavam o jogo da assistência social. Compravam duas embalagens com uma dúzia de refrigerantes com cupons e depois os vendiam com desconto por dinheiro. Eles passavam suas compras separadamente, comprando comida com cupons, e cerveja, vinho e cigarros com dinheiro… Nunca entendi por que nossas vidas eram uma luta sem fim enquanto aqueles que viviam da generosidade do governo tinham um monte de quinquilharias com as quais eu só podia sonhar… A cada duas semanas eu recebia um contracheque e sempre reparava a linha que mostrava os impostos federais e estatais que eram debitados do meu pagamento. Pelo menos, com essa mesma frequência, nosso vizinho, viciado em drogas, comprava cortes de T-Bone, que eu era pobre demais para comprar, mas era forçado pelo Tio Sam a comprar para os outros… Cientistas políticos escreveram páginas e páginas tentando explicar como a população da região central dos Apalaches e do Sul passou de democrata convicta a republicana convicta em menos de uma geração… Grande parte da explicação está no fato de que muitos brancos da classe trabalhadora viram exatamente o que eu vi trabalhando no Dilman’s. Desde os anos 1970, a classe trabalhadora branca passou a se voltar para Richard Nixon porque começou a perceber que, como um homem disse: “o governo estava pagando para pessoas que vivem de assistência social e não fazem nada! Eles estão rindo do nosso país! Nós somos trabalhadores e eles estão rindo da nossa cara porque trabalhamos todos os dias!” (referência: Rick Perlstein, Nixonland: The Rise of a Presidente and the Fracturing of América (2008). 

Fica aqui a minha sugestão de um ótimo livro. 

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AH, SE EU PUDESSE! 

Jackson Vasconcelos. Rio, 04 de novembro de 2024

Se eu pudesse; se eu tivesse como, pararia de pagar impostos imediatamente após a reunião do Presidente da República com os governadores, fato ocorrido na semana passada. Naquele momento, o Estado brasileiro declarou-se impotente para cumprir a única atividade para a qual foi criado: garantir a minha segurança. Hobbes sobrou em sabedoria quando me garantiu que essa deveria ser a única função do Leviatã, quando ele foi criado. Fio-me em Hobbes, não só pelas credenciais intelectuais dele, mas porque faz todo o sentido quando ouço dele, que o Estado surgiu do medo do império do poder do mais forte. Então, todos cedemos poder para um ente – os agentes do Estado – para que eles, em nosso lugar usem a força para garantir a nossa segurança.  

A reunião dos governadores com o Presidente da República e com um ministro do Supremo Tribunal Federal, dois organismos do Estado que, no presente, se complementam, foi patética. O Ministro da Segurança Pública e Justiça apresentou uma proposta de Emenda Constitucional, para uma Constituição que tem mais remendos do que texto original. A proposta do ministro é simples: a União quer tirar poder dos governadores, que reclamam mais poderes para si mesmos. E sabe-se à larga que toda vez que um agente do Estados pede mais poder, ele quer, na verdade, mais dinheiro. 

Santa Edwiges! Eu entrego ao Estado Brasileiro quase metade de tudo o que ganho com o meu trabalho e abro mão do direito de usar a força em minha defesa para ter segurança e sou submetido a uma sessão em que os agentes do Estado dizem pra mim, que se eu não entregar-lhes mais dinheiro e mais poder, não terei segurança. Fazem isso, sem me explicarem o que andam a fazer com o dinheiro que já recebem e com o poder que me tomam. 

O que me resta fazer? Exercer com mais diligência e inteligência o poder que me resta: o de substituir os agentes do Estado por outros que, sendo meus iguais, compreendam que não dá mais para seguir como estamos indo. Que tal? 

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IMPRENSAZINHA RUIM, HEIN?

Entrevista com o Ministro José Múcio.

Jackson Vasconcelos, 02 de novembro de 2024

“Eles agora estão mostrando o que são”. “Graças às Forças Armadas não houve golpe no dia 8 de janeiro”. “O Presidente Lula quer um novo avião, que não virá por enquanto”. “Não entendi. Vocês falam todos juntos, e eu não consigo entender”.

Essas são declarações do Ministro da Defesa, José Múcio, feitas durante a entrevista da semana no Portal UOL. Josias de Souza, Fabíola Cidral e Tales Faria, entrevistaram o ministro.

Ele é um político experiente, engenheiro e músico. Portanto, tem paciência, habilidade e ouvidos bons para identificar os acordes. Os três entrevistadores são inquisidores. Gostam de apertar aqueles que aceitam ser entrevistados por eles. Fabíola, âncora, abriu a entrevista com card publicado pelo polícia da Venezuela, onde se vê, borradas a imagem da bandeira brasileira e da silhueta do Presidente Lula, com os dizeres: “El que se meta con Venezuela SESECA” – Se dá mal. E questionou o ministro. Deu-se o seguinte diálogo:

  • Essa mensagem divulgada pela polícia venezuelana pode ser lida como uma ameaça?
  • Olha, esse assunto da Venezuela é um assunto ligado à diplomacia brasileira. A gente sabe, que cada um tem uma posição sobre a relação do Brasil com a Venezuela. Eu, por exemplo. O meu trabalho foi fechar a fronteira, aumentar o número de soldados; colocar blindados, quando eles ameaçaram invadir. Eu fico satisfeito com essas coisas, pois eles vão mostrando o que, verdadeiramente, são. É uma opinião pessoal. Não há mais o que contestar sobre o caminho que eles tomaram. Só cabe a nós tomar cuidado.
  • Mas, o senhor entende como uma ameaça? O senhor acabou não respondendo à minha pergunta.

Eita! Como não respondeu? Está mais do que respondido. Sobre a ameaça, sim, mas não sobre quem contestava o que são, verdadeiramente, os venezuelanos. Eu esperei isso da jornalista, pessoa que adora provocar polêmicas. Ora, sabe-se que do Lula à presidente do PT, Gleisi Hoffmann, bastante gente no governo andou a proclamar que há democracia na Venezuela. Lula chegou a homenagear o Maduro.

Minha conclusão: gente fraca, não?  E houve mais. Se você quiser verificar, aqui vai o link https://youtu.be/6qMD4DDng4Y?si=St9p69GeZy2f-eb0

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ANISTIA!

Jackson Vasconcelos, 31 de outubro de 2024

A história de nossa gente está marcada por anistias e, se há um símbolo para ela, Juscelino Kubitschek é o melhor candidato. E se houver um segundo lugar no pódio nacional, eu o daria ao João Figueiredo. 

Pois bem, somos um povo dado a perdoar. 

Há no Congresso Nacional um grupo de parlamentares buscando anistiar dos condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023, quando baderneiros liderados, sabe-se lá por quem, saíram a invadir prédios públicos e a promover quebradeiras. 

Desejo a anistia, pois, certamente, entre os punidos, estão pessoas que nada tiveram com a bagunça e estavam em Brasília, em frente aos quartéis do Exército, com o propósito de reivindicar a permanência de Jair Bolsonaro na Presidência da República, depois de ter ele sido vencido na eleição. Gente que não se conformava em entregar o país ao Lula. 

O que queriam, então? Que o Exército agisse em nome deles, uma vez que as urnas não foram suficientes. Eles deveriam ser punidos por isso? Nunca. O próprio Exército deu-lhes a resposta devida ao não agir. Caberia à Justiça, depois de apurados os fatos e identificados os baderneiros, puni-los e nem precisaria ser com penas de prisão. Bastaria que impusesse a quem promoveu e executou a quebradeira, a obrigação de pagar pelos prejuízos.

Mas, os exageros da Justiça – poder que se torna muito perigoso quando exagera, assim como acontece com a polícia – não podem desfigurar a intenção de quem estava nas ruas, em Brasília, em frente aos quarteis do Exército, no dia 8 de janeiro. Insisto: o objetivo do grupo era conseguir que o Exército garantisse a permanência na Presidência da República de um presidente derrotado na eleição. Quiseram repetir o que houve no Brasil em 1964, quando os militares sustentaram a decisão do Congresso Nacional de exonerar o presidente eleito, forçando a mão no uso da Constituição. Dada a senha, os militares assumiram o poder, praticaram uma ditadura altamente cruel e foi uma luta enorme tirá-los de lá. 

Permitam-me andar um pouco mais com essa história, para lembrar que Jair Bolsonaro, ainda presidente, estimulou a população a buscar a ajuda do Exército, assim como incentivou a ira dos magistrados. O Exército disse não. Os magistrados, estes sim, aceitaram a provocação. Aproveitaram-se dela.

O que fez Jair Bolsonaro após as prisões dos “companheiros”? Cara de paisagem e agiu como se o assunto não fosse com ele. E só após estar seguro de que poderia dizer alguma coisa sobre o tema, posicionou-se a favor da anistia e o fez, timidamente. 

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OS BACANAS E AS FAVELAS

Jackson Vasconcelos, 21 de outubro de 2024

Vejam só! Meio & Mensagem, sob o título “Potencial (Ainda) Inexplorado)”dá notícias da pujança econômica das favelas brasileiras, trabalho feito com base numa pesquisa (tracking) da organização “Nós – Novo Outdoor Social”. A matéria está assinada por Fernando Murad, que prometeu novos capítulos. 

Os números apresentados pela matéria, de fato, indicam um “conglomerado” econômico pujante. O Brasil possui mais de 10 mil favelas, a maioria no Sudeste. Nelas há 6,5 milhões de residências ocupadas por 17 milhões de pessoas e 260 mil empresas com CNPJ. Gente que consome 167 bilhões de reais. A matéria não dá o período. Mas, certamente, é um valor anual. 

Claro que essas são boas notícias sobre um tema sempre apresentado de forma negativa para a população, com o estigma de marginalidade e violência. O trabalho do “Nós – Novo Outdoor Social” é um esforço que se soma a outros tantos de pessoas que moram nas favelas e gritam para o mundo em volta: “estamos vivos, estudando, trabalhando, dando empregos e produzindo. Amamos viver”. 

O Meio & Mensagem avisou que a matéria é a primeira de uma série sobre a economia nas favelas. Não está dito, mas é possível que a iniciativa tenha o G-20 como objetivo. O encontro acontecerá no Rio em novembro e dias antes abrirá espaço para o que chamam de G20 Social, algo que o Ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, com o estilo bem do Partido dos Trabalhadores, identificou como a oportunidade para o povo dar o seu recado para os “20 bacanas de paletó e gravata ou 20 mulheres bem vestidas, que tomam decisões para o mundo todo”. 

Meu primeiro contato intelectual com as favelas se deu quando, numa visita à Biblioteca Nacional, em 1980, encontrei uma pesquisa publicada no Estadão, em abril de 1960, mês da inauguração de Brasília, com o título “Aspectos Humanos da Favela Carioca”. Obtive uma cópia, estimulado pelo tema e curioso sobre o motivo de um trabalho com mais de mil páginas ter sido financiado e divulgado por um jornal de São Paulo, referindo-se às favelas cariocas e ter sido coordenado por um padre francês, o economista Louis Joseph Lebret. Li e estudei todo o trabalho. 

Existiam no Rio de Janeiro, na época, 16 favelas, Jacarezinho, Morro de São Carlos, Favela do Esqueleto, Barreira do Vasco, Favela Vila do Vintém, Parada de Lucas, Vila Proletária da Penha. Cordovil, Morro do Telégrafo, Morro do Bonsucesso, Morro da Providência, Favela do Escondidinho, Praia do Pinto. Rocinha, Parque Proletário da Gávea e Cantagalo. Hoje são quase 800. O Censo de 2010 do IBGE identificou 746. 

Cinquenta anos após a publicação da pesquisa, um grupo de professores intelectuais organizou um “colóquio”, para reavivar a pesquisa. Isso em 2010, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ. Aconteceu em maio. Eu passei por lá. Na época, eu andava envolvido com a campanha do Peter Siemsen para a Presidência do Fluminense e isso prejudicou a minha vontade de assistir todas as palestras e apresentações. O evento ocorreu durante três dias. 

Contudo, anos depois, fuçando o tema na Amazon, encontrei o livro “Favelas Cariocas ontem e hoje”, um compêndio sobre o encontro. O livro ofereceu um CD com a pesquisa de 1960 completa. O CD é algo impossível de usar hoje por falta de computadores que permitam. Eita evolução rápida. O livro é de 2012, tem 516 páginas. Nele, Licia do Prado Valladares, pioneira no estudo sobre as favelas cariocas, autoridade no tema, respondeu à minha dúvida sobre o fato de o Estadão ter financiado e divulgado a pesquisa em abril de 1960. 

Escreveu ela: 

“Convém agora explicar o paradoxo do financiamento de uma pesquisa sobre o Rio de Janeiro por um jornal de São Paulo. Discutir essa questão, aparentemente sem importância, vai nos ajudar a esclarecer os propósitos e o contexto político em que a pesquisa foi realizada. 

Em primeiro lugar, voltemos ao contexto político geral. Na segunda metade dos anos 1950, a construção da nova capital, Brasília, mobilizou todos os setores da economia brasileira, todos os grupos e partidos políticos, a imprensa e os meios de comunicação. Juscelino Kubistchek, defensor das propostas desenvolvimentistas, era atacado pela UDN, partido das elites conservadoras, e pelo jornal O Estado de São Paulo. Este órgão de imprensa buscava desestabilizar Juscelino publicamente, atacando em especial a construção da nova capital, considerada desastrosa do ponto de vista econômico. Os editoriais e os artigos defendiam a ideia de que seria preferível investir os milhões lutando contra a pobreza no Rio de Janeiro. De fato, a pobreza não parava de crescer, ameaçando cada dia mais os bairros ricos da capital, e há bastante tempo as favelas constituíam um importante tema do debate político. A realização de um grande estudo científico sobre as favelas seria, portanto, capaz de fornecer ao jornal Estado de São Paulo argumentos sólidos contra a política de descentralização do poder federal.” Em resumo: “Senhor Presidente, pare de gastar com a construção de Brasília e coloque dinheiro para acabar com a miséria no Rio de Janeiro”. 

Para não tornar esse texto em um relato cansativo, encerro aqui, aproveitando o que está na abertura – as notícias sobre a economia pujante das favelas brasileiras – para sugerir a leitura do livro que me serviu de base para nossa conversa e de outro, esse da Lícia Valladares, “A invenção da favela. Do mito de origem a favela.com”  que aborda os desafios para se compreender uma favela globalizada e conectada, composta de uma geração nova, que Lícia chama de “universitários da favela”.  A obra da Lícia fala de bem perto com a matéria do Meio & Mensagem. 

Pois bem, gente. Apesar de tudo o que fazem contra às pessoas que residem nas favelas e comunidades, lá tem gente que luta todos os dias para produzir e viver melhor. Se os governos entendessem que a felicidade completa está numa medida simples, seria tudo mais fácil. Basta que tirem as armas de lá. 

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OBRIGADO, JOSÉ SAUD

Jackson, 12 de outubro de 2024

Sem muito desejar o trabalho com campanhas eleitorais, depois de ter participado de 30 desde 1982, bateu na minha porta o convite para a campanha de reeleição do Prefeito de Taubaté e lá fui eu.

Foi um trabalho árduo durante todo o tempo e o resultado foi ruim. Contudo, conheci um ser humano que tem poucos semelhantes na política. Os bons seguem desaparecendo porque os eleitores votam por votar e municiados com ódio. Em um ambiente assim, prevalece a irracionalidade.

Quero deixar aqui o meu depoimento sobre José Saud, Prefeito de Taubaté. Ele é um ser humano que a política leva tempo para compreender, mas que um dia, ao olhar para trás, entenderá, certamente, com arrependimento. Ele diz que não é político. Eu discordo. Ele representa a política sadia, onde a paixão pelas pessoas que precisam dele está na flor da pele e onde os conflitos são resolvidos sempre de forma pacífica, sem rancor e sem ódio. Por mais ingratos que fossem os que dele receberam gestos de confiança, ele nunca, nunca mesmo, os destratou ou demonstrou mágoas.

Por ser bom, ele acredita que todos são capazes de uma bondade simples: honrar o que combinam, mas quase nunca é assim.

Muitas vezes, pensei sugerir a ele que desse a alguns um tratamento diferente. Parei, pensei e concluí que seria inútil. Ele é incapaz de devolver as ingratidões ou de articular estratégias para destruir alguém. Até mesmo, com relação ao Ortiz Júnior que lhe fez todo o mal, ele nunca levantou acusações pessoais. Tudo o que Saud fez foi com o intuito de colocar a verdade na pauta e Ortiz esteve nela por representar o outro lado da verdade: a mentira.

Numa das suas melhores obras, Machado de Assis criou Quincas Borba e construiu um diálogo entre Quincas e Rubião, que ouso usar aqui para traduzir o sentimento que guardo da minha participação na campanha do Saud:

“Ah, meu caro Rubião, isto de política pode ser comparado à paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo; não falta nada, nem o discípulo que nega, nem o discípulo que vende, coroa de espinhos, bofetadas, madeiro, e afinal morre-se na cruz de ideias, pregado pelos cravos da inveja, da calúnia e da ingratidão”.

Gosto tanto dessa passagem que com ele escrevi um livro: “Isto de política, meu caro…Uma vida pela democracia”, sobre outro herói da política com quem vivi grandes momentos da trajetória do Brasil do tempo dos generais até o retorno da democracia. Tudo isso, entremeado por várias campanhas eleitorais que deram solidez à minha paixão. Escrevi sobre Rubem Medina.

Bem, sou muito grato ao Saud, por ele ter feito reviver em mim a paixão pela política, que andava morna no meu coração.

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É PRECISO MUITO CUIDADO

Jackson, 7 de outubro de 2024

O momento do encontro do eleitor com a urna é delicadíssimo. Qualquer passo em falso pode provocar um tombo. Assim aconteceu na véspera da eleição para a Presidência da República em 2022. Os aliados de Jair Bolsonaro, Roberto Jefferson e Carla Zambelli produziram cenas que, certamente, mexeram com o sentimento dos eleitores indecisos. 

Este ano deu-se o mesmo com a campanha do candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal. Ele abriu bem a campanha, conseguiu dominar o cenário durante quase todo o tempo, até que extrapolou os limites da arrogância engraçada para a arrogância insuportável. Mas, ainda assim, mantinha-se com certa vantagem para uma disputa com dois turnos. 

Na reta final, Marçal apareceu com um atestado para reafirmar a acusação que vinha fazendo ao Boulos de ser viciado em cocaína. Em poucos minutos a farsa caiu, provando-se que o atestado era um estelionato. Certamente, o fato tirou Marçal do segundo turno. 

Como política é um cipoal de fatos repetidos, muitos até iguais, lembro aqui do episódio de 1988 que, em razão do assassinato de operários da CSN, em Volta Redonda, por tropas do Exército, com repercussão nacional, Luiza Erundina, uma candidata com tendência para a derrota, terminou por ser eleita Prefeita de São Paulo. 

Os momentos próximos do dia da eleição são momentos bem delicados. Um erro derruba todo o prédio. 

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DEMOCRACIA SEM POVO

Jackson. 5 de outubro de 2024

Há quem queira uma nova Constituição por acreditar que desse modo impedirá decisões dos ministros do STF julgadas por muitos como inconstitucionais. Há quem defenda uma nova Carta por outros motivos. Se satisfeita a vontade, teremos a oitava Constituição. A primeira foi feita há 200 anos, em 1824 e a última, ainda em vigor, está com apenas 36 anos de idade. 

Do que sei, essa última foi a única a contar com a participação do povo desde a escolha dos constituintes por eleição direta. O povo esteve presente nos corredores e galerias do Congresso Nacional durante todo o tempo da elaboração da Carta. Pessoas de todos os lugares do Brasil chegaram a Brasília. Gente de todas as etnias, religiões, sexo, escolaridade, padrão de vida. Pessoas com deficiência. Pessoas com emprego e pessoas sem emprego. Quem não conseguiu ir a Brasília participou de fóruns, debates e conversas com os parlamentares e jornalistas. 

A elite acomodou-se. Depois, resolveu adaptar o documento aos seus interesses e hoje a Carta já tem mais de 200 emendas promulgadas e sabe-se que há um número maior ainda de propostas nos escaninhos do Congresso Nacional aguardando deliberação. 

Insatisfeita, a elite faz e refaz leis; faz, refaz e emenda constituições;  depõe e coloca presidentes, instala ditadura e até muda regimes, como aconteceu em 1889, quando proclamou a República com o intuito de livrar-se do risco de ter um terceiro reinado com Isabel, autora da Lei Áurea, decisão contrária à vontade da elite brasileira. 

Encontrei no livro “Campos Sales. Da Propaganda à Presidência” o relato sobre todo o movimento que levou o Brasil da Monarquia à República: 

“Aumentavam-lhe a probabilidade de uma próxima vitória definitiva…” pela instauração da República…”O Imperador tinha-se descuidado negligentemente de preparar o espírito da princesa Isabel, dando-lhe uma educação cívica mais compatível com as altas funções de imperante, que o direito de sucessão lhe havia destinado…” 

Em outra passagem, relata Campos Sales: 

“O Sr. Saraiva, na sua conferência de Petrópolis, adiantara ao Imperador este parecer: O que Vossa Majestade deve fazer ao findar este reinado é entregar à nação a coroa que ela deu a V.M. em 1831.” 

  • Mas, minha filha? 
  • A princesa é muito religiosa, segundo se diz, e deve resignar-se.” 

Sérgio Buarque de Holanda numa das entrevistas que concedeu à revista VEJA, publicada nas Páginas Amarelas no dia 28 de janeiro de 1976, com o título “A DEMOCRACIA É DIFÍCIL”, afirmou: “No Brasil sempre foi uma camada miúda e muito exígua que decidiu. O povo sempre está inteiramente fora disso. As lutas, as mudanças são executadas por essa elite e em benefício dela, é óbvio. A grande massa navega adormecida, num estado letárgico.(…). Até agora, todas as revoluções dentro da história do Brasil foram de elites, civis ou militares, mas sempre elites…”

Vilfredo Pareto definiu a elite na obra Trattato di Sociologia generale, publicada em 1916: “A teoria da elite ou classe eleita foi elaborada por Vilfredo Pareto e consiste na tese de que uma pequena maioria de pessoas é a que conta em todo ramo ou campo de atividade e que, mesmo em política, é uma tal minoria que decide sobre os problemas do governo. Essa teoria foi um dos pontos fundamentais da doutrina política do fascismo e do nazismo” (Dicionário de Filosofia. N. Abbagnano). 

Se queremos uma nova Constituição para o Brasil, que tal tentarmos viver uma segunda vez a experiência de 1988, trazendo o povo para a conversa? Nem que seja só para ela dizer se aceita as mudanças que a elite tem feito no tratado combinado em 05 de outubro de 1988.

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ISONOMIA? NÃO. HIPOCRISIA, SIM.

Jackson. 24 de setembro de 2024

O motivo mais relevante em defesa da existência de uma Justiça Eleitoral é a garantia de que os candidatos concorrem em igualdade de condições, situação definida pela lei eleitoral como isonomia.

Nunca houve isonomia nas disputas por mandatos eletivos. Nunca mesmo, até pelo fato de que os candidatos têm habilidades pessoais e são diferentes entre si. Uns sabem lidar melhor com as campanhas do que outros. No entanto, a lei e a Justiça Eleitoral autorizam e chegam até a determinar o desequilíbrio nas condições oferecidas a uns candidatos em detrimento de outros e seguem adiante para vestir com as vestes da hipocrisia o que defendem como isonomia.

Há inúmeros exemplos e de bastante tempo. Existe, por exemplo, o desequilíbrio na disputa em favor daqueles que exercem funções públicas, gente que conta com assessores, estruturas, influência políticas e outras vantagens.

O exemplo mais gritante de desequilíbrio está na distribuição do Fundo Eleitoral e do tempo de TV e rádio, instrumentos pagos com o dinheiro de todos os contribuintes. Os recursos são entregues aos partidos com base no número de mandatos que conquistam. Ou seja, aqui já se tem a primeira distorção. A situação piora pelo fato de os partidos não terem democracia interna, o que os transforma em feudos de seus presidentes. Por isso, numa mesma campanha, há candidatos com milhões nas contas de campanha e com tempos elásticos de veiculação de suas campanhas na TV e no rádio, disputando com candidatos que recebem zero ou migalhas dos mesmos instrumentos.

Por isso, o poder não se renova e se tem o caso de filhos e filhas dos donos dos partidos que, na falta de disposição de lutar pela própria sobrevivência, buscam os salários e vantagens que os cargos públicos lhes dão.

O povo poderia romper isso? Poderia, mas como ele terá as informações essenciais para escolher os candidatos que não utilizam os privilégios das máquinas pública e partidária se as campanhas os tornam invisíveis aos olhos dos eleitores?

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APOSTO NA POLÍTICA.

21.05.2024

Google proibiu que campanhas políticas sejam impulsionadas pela ferramenta de anúncios Google Ads, o que implica também a suspensão da distribuição paga de conteúdos postados no Youtube. Essa é a resposta do Google às imposições da Justiça Eleitoral, uma delas, a obrigação das plataformas de manter um banco de dados com os conteúdos impulsionados pelos candidatos e partidos políticos.  As normas demonstram, uma vez mais, o grau de desprezo da Justiça Eleitoral pela política, representado pelas restrições à liberdade para se fazer campanhas eleitorais. 

Em razão desse sentimento dos magistrados e correlatos, tenho recebido sugestões para retirar toda a menção à política dos espaços onde publico conteúdos. Jamais farei isso, pois é preciso insistir na defesa da política, tanto quanto se faz a defesa da democracia, uma vez que a política é o único instrumento à disposição do ser humano capaz de tornar possível a convivência pacífica entre as pessoas. Por abolir a política, a raça humana torna-se cada vez mais um conjunto de bestas-feras, fato comprovado pela radicalização e fanatismo. 

É o caso de se perguntar: “É possível uma democracia sem política?” É, e essa situação está representada no populismo. Portanto, quando se toma a abominação à política por parte de quem diz defender a democracia com unhas e dentes e com todos os argumentos disponíveis, inclusive, o uso da força, fica-se com o sentimento de que, para essas pessoas, o populismo é bem-vindo. Ocorre que os populistas apegam-se ao poder a ponto de impedir o revezamento, a alternância, elemento essencial para definir a democracia. 

Quem por aqui anda a defender a democracia com o mesmo furor com que combate a política deveria ler com especial atenção, numa leitura compassada e anotada, o livro do filósofo basco, Daniel Innerarity, “A Política em tempos de indignação – A Frustração popular e os riscos para a democracia”. Como aperitivo, deixo aqui o registro da parte final do capítulo “A Condição Política”: “ O sucesso e o fracasso não são algo absoluto…O horizonte a partir do qual se avalia o sucesso ou o fracasso é diferente porque aquilo que é politicamente possível em cada momento está em constante mutação. Além disso, o êxito não é determinado pelos resultados imediatos; há muitos exemplos de derrotas que foram vitórias no longo prazo, do mesmo modo que há demissões que são, implicitamente, uma vitória. Claro que faz parte da arte da política intuir um estado de opinião do eleitorado, antecipar-se e corresponder ‘às suas expectativas, mas isso não basta para definir, com suficiência, uma política bem-sucedida, já que nesse caso o seu melhor exemplo seria o populista com menos escrúpulos. O sucesso na política e o sucesso político não são, necessariamente, idênticos. 

Numa sociedade estão sendo feitos, constantemente, juízos políticos no curto prazo (pesquisas, opinião nos meios de comunicação, eleições, etc.), mas cada uma dessas avaliações tem um prazo de validade próprio. As avaliações potencialmente duradouras exigem certo distanciamento. Aquilo que parece um êxito visto de perto pode ser um fracasso contemplado a partir de longe. (…) A agitação midiática, o ciclo eleitoral e o juízo da história são regidos por registros temporais diferentes e é quase impossível jogar bem em todos os terrenos. Aos grandes assuntos políticos, apenas a posteridade é que pode julgá-los com rigor, algo que sem dúvida deixará insatisfeito o político que os cidadão julgaram, pensa ele, com muito rigor…O que mostra bem que a política é uma tarefa tão difícil quanto pouco rigorosa.”