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A política é a arte; a estratégia é o pincel

A política é um admirável instrumento de relação humana. Ela torna possível a situação que a eleição na Alemanha criou, quando o povo elegeu um partido e um candidato de oposição sem derrotar um governo.  

O candidato da chanceler Angela Merkel e do partido dela, União Democrata-Cristã (CDU), perdeu a eleição, mas o governo dela, representado pelo Ministro das Finanças e pelo partido dele, o Social-Democrata (SPD), saiu vitorioso. Ressurgiu das cinzas. 

O modo como funciona a eleição na Alemanha leva o povo a eleger candidato e partido, mesmo não coincidentes,  e os eleitos que se virem para governar. Ou se unem num propósito comum ou o povo voltará a pronunciar-se. Há quem diga que tal fato só acontece nos sistemas parlamentares, mas é assim também nos presidencialistas. O eleitor escolhe quem governará e após isso, os partidos e governantes que se entendam para atender às expectativas que os eleitores registraram na hora do voto. 

Quando falta maioria ao presidente, ao governador ou ao prefeito eleito, isso não pode ser argumento para o fracasso. Eles que encontrem o caminho das possibilidades, assumam as consequências e cumpram o que prometeram aos eleitores. 

Para ajudá-los nesta arte da convivência, até com os contrários, existe a política. Então que a exerçam. Conversem, recuem, avancem, componham, porque o ato relevante é garantir ao povo que ele seja representado e plenamente correspondido naquilo em que acreditou. Para entenderem até que ponto podem recuar, avançar e compor sem perder o poder e os objetivos, há a estratégia. Então, que a utilizem. 

Nos sistemas parlamentares e presidenciais, isso tem o nome de democracia – o exercício do poder pelo povo, diretamente ou por intermédio de quem o representa, indicado pelo voto livre.  

Acontece que em terras brasileiras criou-se o rito de fracasso da política para abrir-se caminho para a corrupção como elemento de composição ou para a radicalização, que os modernos chamam de polarização. Neste ambiente os contrários não conversam e chegam a se odiar. No máximo, vendem a consciência e no fim da linha, o povo fica fora do jogo, a democracia padece, a política perde o sentido e a estratégia tem serventia pessoal. 

O Brasil precisa de uma reforma no modo como funciona a sua democracia. 

Vejam vocês. Angela Merkel venceu quatro disputas consecutivas e governou a Alemanha durante 15 anos, um feito e tanto num sistema que depende de composições políticas, algumas vezes até com os contrários. Ninguém sobreviveria tanto tempo no poder no Brasil, sem tornar-se um tirano ou velhaco. Já se viu isso. 

A disposição para o diálogo não substituiu a autoridade da Angela Merkel. Entre todos os exemplos, há o caso dos refugiados sírios. A chanceler dispensou a popularidade e o desejo de uma nova eleição. Ela, simplesmente, decidiu, não sem antes explicar suas razões, o que fez do ato, uma atitude de autoridade e não autoritário.  Foi uma decisão humanitária? Sem dúvida, mas, certamente, Angela Merkel percebeu no fato, a oportunidade de quebrar a imagem de impiedade que a Alemanha passou do tempo do nazismo. 

Olaf Scholz, do Partido Social Democrata (SPD) será, quem sabe, o novo chanceler da Alemanha. Mas, para isso, terá que compor uma aliança entre os partidos, numa situação que, certamente, levará dois extremos à convivência: o Partido Verde e o Freie Demokraten (AFD), que representa a extrema-direita. Que coisa, né? 

Para a política brasileira, se terá o representante do partido que visitou Lula na prisão e condenou as decisões de Sérgio Moro, em aliança com o partido que enviou a deputada Beatrix Von Storch, da extrema-direita, para uma foto com Jair Bolsonaro. Lá, para eles, esses atos são atos políticos, que nossa gente responde com a intolerância que substituiu a política. 

Boa semana para todos.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Pesquisa, pra quê te quero?

Há na praça uma onda de pesquisas de intenção de votos para a eleição de 2022 e, com base nelas, a comunicação antecipa a decisão do eleitor. Mas, no questionário delas existe um alerta que todos os analistas deveriam dar mais ênfase: “Se a eleição para presidente fosse hoje e os candidatos fossem esses…”. Acontece que a eleição não é hoje e muito menos se sabe se os candidatos serão mesmos os que estão sendo apresentados ao escrutínio do eleitor. Nisso está a margem de erro tendendo ao infinito. 

As torcidas animam-se, os institutos apresentam-se, a imprensa explora e a vida continua. Houve um tempo que as pesquisas serviam também aos financiadores das campanhas. Não que eles escolhessem com algum critério mais apurado o destino do dinheiro, mas tinham o argumento para fugir às pressões e aos pedidos dos derrotados por antecipação. No final da linha, colocavam um tostão em alguns, um tostão e meio em outros e milhões de tostões, por dentro e por fora, naqueles que estavam em posição de devolver, de imediato, mesmo antes da eleição, o investimento feito. 

Surgiu, então, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, nome pomposo para dar destino ao dinheiro dos contribuintes em direção às campanhas eleitorais. Ufa! Quem tem dinheiro próprio ficou livre, ainda que o seu dinheiro venha dos negócios ou das tramóias que os candidatos engendram. Então, para esses as pesquisas perderam o sentido e eles, então, deixaram de financiá-las. Os institutos tradicionais sucumbiram, buscaram fazer pesquisa para outros mercados e novos institutos surgiram, afinal de contas, a imprensa precisa de elementos para produzir matérias e um desses bons elementos é a curiosidade humana, o desejo ardente que temos de antecipar o futuro, nunca para tentar mudá-lo, mas para ter o que conversar com os amigos. 

Iludem-se, por exemplo quem imagina que todos os jogadores nas loterias jogam com o único objetivo de conquistar o grande prêmio. Não é. Se o benefício fosse exclusivamente esse, as loterias já teriam fechado. Quem joga, coloca uma “prata” no direito de sonhar. Jogo feito, prêmio conquistado e a grana irá para a casa na praia e para o desejo ardente de mandar o patrão para a lua. Quando o sorteio acontece, o sonho não acaba, mas transforma-se num novo sonho com as notícias sobre os ganhadores. 

Essa é a serventia das pesquisas eleitorais fora de época, e até mesmo, em alguns casos, na época. Sonhar o sonho de um bom governo ou de uma vingança. E a vida continua até o dia da sorte grande: o exercício do voto. Acontece que no dia do sorteio quem jogou o ano inteiro não aparece para fazer o jogo e quem lá vai são as torcidas e elas a gente sabe como votam. 

Mas, gostemos ou não, as pesquisas estão aí. Chegam como vindas numa avalanche e esse fato é boa oportunidade para se tratar o tema com alguns cuidados técnicos, com as formulações corretas e disso cuidei, ao meu modo, sem muito público, mas com aquele pelo qual tenho carinho, na quinta-feira no programa “Aqui tudo é política”, que está disponível. Mas, não o esgotei. O assunto é rico, magnífico e eletrizante e como, certamente, durante a semana que começa teremos novas pesquisas, retornarei ao tema no programa de quinta-feira e aqui, neste maravilhoso espaço, com considerações mais técnicas e exemplos de pesquisas que, no mundo todo deram errado. 

Abordarei com mais profundidade alguns textos e livros, um deles magnífico, “A Espiral do Silêncio”, de Elizabeth Noelle-Newman . A obra joga por terra a credibilidade de muitos institutos de pesquisas. Ela mostra como, muitas vezes, a opinião externada não é a verdade pura, mas resultado de algum constrangimento. 

Boa semana para vocês e com a lembrança que esta é a semana que abre a contagem regressiva de um ano até o dia da eleição. 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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O Discurso na ONU

A imagem é elemento essencial ao trabalho de quem dedica tempo às formulações de estratégia para o exercício da política e, por isso, eu levanto a dúvida: “Que imagem pode ter o Brasil diante do mundo e aos olhos dos 193 países membros da ONU e dos dois outros Estados observadores, a Palestina e o Vaticano, que assistem os discursos de abertura da Assembleia-Geral, por presidentes brasileiros eleitos? 

Fernando Collor de Mello, primeiro presidente eleito diretamente pelo povo brasileiro, lá esteve para o discurso de abertura e, algo depois, perdeu o mandato e foi cassado, acusado de corrupção. Luiz Inácio Lula da Silva lá esteve e após cumprir dois mandatos presidenciais e eleger a sucessora, foi preso pelo mesmo motivo que tirou Fernando Collor de Mello da Presidência. Dilma Rousseff, oradora de um brilhante discurso no primeiro mandato, que ressaltou o fato de ser ela “a primeira voz feminina a abrir a Assembleia-Geral da ONU” perdeu o mandato por desmandos administrativos. Michel Temer, lá também esteve, com a valsa nas mãos, depois de cumprir um curto período na presidência da república. Depois, a imagem dele divulgada no mundo todo foi de um presidente preso por corrupção. E, por fim, nas últimas assembleias, o Brasil se fez representar por um presidente, no Brasil, ameaçado de impeachment e no Brasil acusado de ser genocida. Um presidente que, sozinho no mundo, insiste em dizer que ele é o único sujeito certo quando não se vacina. 

As participações do Presidente Jair Bolsonaro, contudo, trouxeram uma vantagem para nossa gente, que passou a conhecer um pouco mais do que é a ONU e saber a razão de o discurso de abertura da Assembleia-Geral ser um privilégio de seus representantes. Uma dádiva de um brasileiro, aquele que foi o primeiro Secretário-Geral da ONU, o diplomata – diplomata de verdade – Oswaldo Aranha. 

Nossa gente conhece um pouco mais da ONU neste momento, porque existe uma radicalização absurda e improdutiva na política brasileira e essa atmosfera responde pelos aplausos de alguns e críticas de muitos aos discursos do Presidente do Brasil. Alguns e muitos falam do que, provavelmente, não conhecem, pela impaciência de ouvir e ler o que os políticos fazem e dizem. 

No Brasil, não há mais paciência no ouvir e no ler, seja o que for, se vier da política. O povo brasileiro está um tanto cansado de ver e ouvir coisas nas quais não consegue mais acreditar. 

Não temos orgulho de nossos presidentes, mesmo ela e eles tendo sido escolhidos por decisão nossa. Uma contradição! Um paradoxo! Alguma coisa está errada com nossos presidentes ou com nós mesmos. 

É hora de dar um tranco nesse modelo. Não acham? É possível partir para 2022 com os meus vícios, mesma impaciência e com candidatos requentados? Até quando vamos levar a política de qualquer modo, uns dizendo que a detestam e outros vilipendiando-a ? 

Não quero encerrar o texto de hoje sem chamar a atenção de minhas leitoras e leitores, certamente, todas e todos liberais, para o discurso de abertura do atual presidente do Brasil pronunciado na primeira participação dele na Assembleia-Geral da ONU, em 2019. 

Gente, como eu gostaria que ele acreditasse mesmo naquilo que disse para o mundo todo no primeiro momento do mandato! Não vou reproduzir na íntegra, para evitar que o meu artigo se torne longo demais, com palavras que não são minhas, mas que eu subscrevo. Para facilitar a pesquisa, deixo aqui o link da matéria onde está a íntegra do discurso.  Transcrevo um pequeno trecho como aperitivo:

“Em busca de prosperidade, estamos adotando políticas que nos aproximem de países outros que se desenvolveram e consolidaram suas democracias. Não pode haver liberdade política sem que haja também liberdade econômica. E vice-versa. O livre mercado, as concessões e as privatizações já se fazem presentes hoje no Brasil. A economia está reagindo, ao romper os vícios e amarras de quase duas décadas de irresponsabilidade fiscal, aparelhamento do Estado e corrupção generalizada. A abertura, a gestão competente e os ganhos de produtividade são objetivos imediatos do nosso governo…”

Estamos abrindo a economia e nos integrando às cadeias globais de valor. Em apenas oito meses, concluímos os dois maiores acordos comerciais da história do país, aqueles firmados entre o Mercosul e a União Europeia e entre o Mercosul e a Área Europeia de Livre Comércio, o EFTA.

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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A Constituição “pano pra manga”

Incansavelmente, com prazer, eu insisto que a política é uma arte, a arte da convivência, que pode ser sadia ou não, a depender da cabeça de quem a utiliza.

As cabeças insanas, a elas conferem insanidade e prisão. Às boas cabeças, a política dá bom sentido, boas relações de amizade, ensinamento e… liberdade. A política me trouxe dissabores e, por vezes, ainda me maltrata, mas me recompensa com as amizades e com a liberdade que me confere.

Separei o espaço de hoje para uma homenagem ao cidadão brasileiro, José Guimarães Menegale, que se vivo fosse, teria completado na terça-feira, dia 14 de setembro, 123 anos de idade. Mas, ele nos deixou em 1965, um ano e pouco após a proclamação da última ditadura, com a idade que tenho hoje, 67 anos.

Até sexta-feira, eu não conhecia José Guimarães Menegale, nem de ouvir falar. Perdi eu. Pelo bisneto dele, eu o descobri. Foi um liberal dedicadíssimo à educação, idealizador da Biblioteca Municipal de Belo Horizonte, quando Juscelino Kubitscheck, último presidente brasileiro, foi prefeito da cidade.

A política, portanto, me trouxe ao Boletim da Liberdade, a amizade com o Gabriel Menegale e por ele, acesso a uma das obras do bisavô José Guimarães, “O que é a Constituição”.

José Guimarães Menegale construiu uma aula para educar adolescentes e adultos para o exercício da cidadania. O livro fez parte de uma coleção, a Coleção Educar, projeto do Ministério da Educação e Cultura. Em que tempo? No tempo da Constituição de 1946. As páginas são preciosas, mas delas retirei alguns diamantes:

  1. “SEM LEI NÃO SE VIVE”. A abordagem começa pelas leis da natureza, até chegar-se ao ponto: “As leis não podem ser ditadas por um homem só. É indispensável que sejam criadas pelo próprio povo… “Alerta bem interessante para esses tempos em que um único ser humano ou onze deles criam leis com o argumento de interpretá-las.
  2. “UM INDIVÍDUO CHAMADO ESTADO”. José Guimarães ensina: “Nós sentimos a presença do Estado todos os dias, a todas as horas, por toda parte… Esse se julga com interesses e direitos superiores aos de todos os outros, porque é o Estado. Ele entende que pode mais, que é o mais importante porque age em nome e como representante do conjunto dos indivíduos constituídos em sociedade. Como dispõe de todos os recursos, que a própria sociedade lhe fornece, como dispõe do poder e da força, tende a abusar. Às vezes o Estado quer mais do que disciplina; quer submissão; quer mais que solidariedade, quer rendição; quer intervir em minha opinião, em meu pensamento, em minha atividade. Além de exigir que eu não dirija meu carro contramão, quer exigir que eu siga opinião que não é minha, mas a do governo que na ocasião o representa. No caso da contramão, é disciplina ao benefício da ordem geral; no caso da opinião, é opressão, em prejuízo da ordem, que é duradoura com a liberdade”.

Em seguida, José Guimarães explica o “Grande Estatuto – Constituição na Cabeça” e encerra: “Vimos o bastante para saber que a Constituição é o roteiro de nossa vida política e nossa carta de alforria e que, graças a ela, não somos escravos nem bonecos de mola…”

Pena que os meus leitores não tenham ainda acesso a esse pequeno, mas grandioso livro. Sugeri ao bisneto do José Guimarães que o republique e, quem sabe, seja um bônus para assinantes do Boletim da Liberdade?

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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O líder derreteu?

Para quem esteve nas ruas no Dia da Independência pode ser indiferente se a decisão de recuo do Presidente da República foi rendição ou acordo. As reações que li e ouvi mostram que Jair Bolsonaro frustrou as expectativas que ele mesmo criou e alimentou durante todo o período – da convocação do povo às ruas até o discurso estridente que fez em São Paulo. 

Mas, se a imagem do líder derreteu, o que ela representa permanece sólido e é nisso que devem trabalhar os arquitetos das campanhas para as eleições do próximo ano. 

Eu não estou sozinho na defesa da tese. Conto com algumas vozes autorizadas e entre elas, a da autora de “Menos Marx, Mais Mises – O liberalismo e a nova direita no Brasil”, Camila Rocha, uma jovem que representa o pensamento da esquerda, mas que hoje conhece todo o histórico dos liberais no Brasil, chamados por ela e por outros formuladores de “Nova Direita”. 

Lucas Berlanza, eu, Cibele Bastos, a quem Camila dedicou o livro, e a própria Camila, tivemos uma boa conversa na quinta-feira a convite do Boletim da Liberdade e dessa conversa, disponível na rede do Boletim, a Coluna Panorama deu notícia ao mundo, com a chamada: “Nova Direita não depende de Jair Bolsonaro, avalia pesquisadora”. 

A constatação mostra o amadurecimento político dos defensores da “Nova Direita” no Brasil, por não estarem à mercê de um líder, mas conscientes da necessidade de o país viver, para felicidade geral, uma experiência com governos liberais. 

Agora, quem será o candidato à presidência escolhido pela corrente não se sabe ainda. Alguns conservadores alimentaram a chance de o escudo e a espada permanecerem com Jair Bolsonaro, mesmo depois da gafe. Outros fogem dele. 

Caso a imagem de Jair Bolsonaro como líder conservador e representante da “Nova Direita” sobreviva ou não, os liberais precisam estar reposicionados na campanha para a Presidência da República e composição do Congresso Nacional. 

É-nos insuficiente a pauta conservadora ou de execução de privatizações. É preciso inserir na proposta o fim do patrimonialismo, este sim, o grande problema da política  brasileira. 

Contudo, ao inserir a proposta, Jair Bolsonaro e alguns que se apresentam pela direita do espectro político, terão dificuldades imensas para convencer. 

Raymundo Faoro, Weberiano, não deixou dúvida alguma sobre a imensa dificuldade que o Brasil terá para se livrar do vírus que deforma o Estado Brasileiro a ponto de mutilar a sociedade que o sustenta. Afinal, esse costume de dizer-se dono do Estado só pelo fato de se ocupar funções nele, vem desde o Brasil Colônia e permanece instalado no Brasil República. 

Enquanto o patrimonialismo for uma prática política considerada com naturalidade, os liberais serão apenas construtores de discursos, com o risco de apostarem em candidatos que em pouco tempo decepcionem.  E os representantes da esquerda, mesmo da “Nova Esquerda”, terão dificuldades imensas para defender o Estado, sua musa libertadora 

Camila Rocha mostrou as dificuldades dos liberais em várias partes do livro, quando cita as expectativas positivas deles com o Presidente Fernando Henrique Cardoso e as diversas tentativas de influência positiva que fez o liberal Paulo Rabello de Castro ao apresentar planos para os candidatos à Presidência. 

A minha esperança de viver dias melhores permanece, quando vejo jovens que não precisam envelhecer para entender o quanto o Estado é ruim para o povo brasileiro nas mãos dos “Donos do Poder”. 

Antes de encerrar, quero registrar um fato relevante para quem traça estratégias: a oposição ao Bolsonaro não está preparada para ele, que quando chuta a bola para fora, alguém vai lá e puxa a trave na direção da bola. Ele esteve no auge no dia 7 de setembro, pareceu dissolver no dia seguinte e, como a oposição manteve a mobilização do dia 12, ele reviveu, porque foi-lhe dado de presente as imagens de comparação. No dia 7, o povo nas ruas. No dia 12, quase ninguém. 

Boa semana para todos.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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O Estado emite moeda, não cria riqueza

Quando o Estado emite moeda provoca inflação, desvaloriza o patrimônio e o trabalho das pessoas. Ele também não cria riquezas, portanto, as toma de quem cria, com o argumento de garantir a todos qualidade de vida. Mentira! O Estado não faz isso, porque seus agentes querem qualidade de vida só pra eles mesmos e o dinheiro não é suficiente para atendê-los e também o povo. 

O sistema funciona como se você entregasse a um alfaiate ou costureiras um terno ou um vestido para serem reformados para uma festa e ele e elas lhe devolvessem farrapos, ficando, inclusive, com os botões. 

A conta está cada vez mais alta e nós temos a obrigação de pagá-la com os impostos e agora, novamente, com inflação e desemprego. No Brasil há, neste momento, 14.403 obras paradas, só de responsabilidade da União, quantidade de desperdício equivalente a 10 bilhões de reais – dinheiro jogado fora. Os dados são do TCU, apresentados à Comissão Externa da Câmara dos Deputados, que avalia os prejuízos das obras inacabadas realizadas com os recursos do Orçamento da União. 

No orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, FNDE, estão previstos quase 28 bilhões de reais para construção de escolas, creches e cobertura de quadras esportivas. Mas, as obras inacabadas já consumiram mais de 10% desse valor. 

Quem transita aqui no Rio de Janeiro entre a zona sul e a zona oeste da cidade, pela orla, encontrará uma ciclovia acabada e destruída em poucos meses. E quem percorre a principal avenida de acesso à cidade, a Avenida Brasil, a encontra com problemas, alguns deles causados por uma obra inacabada, hoje sede de cracudos. O Prefeito que construiu os dois momentos ao desperdício, construiu outros, foi embora, ficou 4 anos fora e retornou com o voto de quem pagou os prejuízos. 

No Estado de São Paulo há 1.139 obras paralisadas, a um custo total em torno de R$46,5 bilhões. 85% disso contratado pelos municípios e o restante, pelo governo do estado. Dados também do TCU. Quem visita São Paulo capital não tem como desconhecer a obra do consórcio monotrilho leste. Uma obra que já consumiu mais de 2 bilhões de reais. 

E por aí vai e quase desde sempre, por um motivo: o prejuízo fica com o contribuinte e nenhum agente público é pecuniariamente penalizado pelo desperdício, às vezes, bem ao contrário disso, os responsáveis são premiados com novas oportunidades para produzir mais desperdício.  

Está mais do que na hora de buscar outros profissionais para cuidar daquilo que os agentes do Estado não cuidam, mas isso só é possível se trocarmos os agentes que podemos, ou seja, aqueles que são escolhidos com o nosso voto. Em 2022, diante de nós estará, mais uma vez, a oportunidade para trocar. Faremos isso, ou permitiremos que novamente, nos enganem com o discurso arrumado da polarização, que fala bonito sobre os costumes, sobre corrupção, educação, saúde e outras coisas mais, sem demonstrar a mínima vontade de reduzir o poder que o Estado tem para dar prejuízos enormes à sociedade? 

Um Estado que acredita saber o que é melhor para as pessoas precisa ser enorme, interventor e controlador. É exatamente o Estado que temos, mas já podemos abrir mão deles, subir num cavalo, empunhar uma espada e gritar: “independência ou morte”. 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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É coisa de doido, gente!

“Tá todo mundo louco, oba! Tá todo mundo louco, oba!”. Faz tempo que não sei do Silvio de Brito, compositor dessa música, mas tenho lembrado muito dele ultimamente. Por algum motivo. 

Sobre loucos, o mestre Ariano Suassuna contou alguns causos. Entre eles, o do encontro entre dois loucos no corredor de um hospício. É um diálogo engraçado com jeito de lição. 

  • Ei! Ei, você aí. Cadê a continência? 
  • Continência? Por que eu faria continência pra você, maluco? 
  • Ora! Porque eu sou o imperador Napoleão Bonaparte.
  • Deixe de conversa, rapaz! Que história é essa de ser Napoleão Bonaparte. Quem nomeou você? 
  • Jesus Cristo! 
  • Eu? Não me lembro de ter feito isso. 

Eis aí o mundo moderno onde tem gente a cobrar continência dos outros por nomeação de um ente superior, incontestável, que está acima de tudo e acima de todos e responde pelo nome de “Minha Verdade”. 

Para ela não existe manual, estatuto, códigos nem Constituição, porque ela existe por si mesma, curtida e compartilhada por centenas ou milhares de seguidores. Seja porque motivo for. Os autores desse feito grandioso, são os donos da verdade. 

O dono da verdade é vaidoso. Também pudera! Ele acredita saber o que é bom e ruim para os demais seres humanos. E sabe mais. Pode até decidir quem os demais seres humanos devem amar, cultuar, odiar, demonizar. Quem errar nessas decisões, será banido. 

O escritor Lima Barreto, que poderia, por ser brilhante, receber as homenagens de um moderno dono da verdade com o título de “mulato de primeira linha”, se questionava: “Haverá contágio na loucura?”. Eu responderia que sim e sem vacina. 

Já que estamos a comentar a vida dos loucos, que tal uma ajudinha do Dr. Bacamarte, psiquiatra festejado por Machado de Assis em “O Alienista”? Bacamarte criou a Casa Verde, trancafiou nela todas as pessoas que não se encaixavam nos parâmetros de normalidade criados por ele mesmo. Não sobrou um só morador da cidade. 

Por ser o único sujeito com mente saudável, Dr. Bacamarte esvaziou a casa e fez dela sua residência. Mas isso aconteceu em outros tempos, porque por hoje, são muitos os Bacamartes e eles estão por aí a selecionar os loucos com base num único indicativo: os seus contrários. 

Diante dos donos da verdade, o que se faz com a liberdade de cada um para pensar e agir por mim mesmo? Quem tiver juízo, renunciará a ela. Caso não faça isso, que prepare o lombo para apanhar. Uma avalanche lhe cairá sobre a cabeça. 

Mas, ainda há um ponto a considerar. Temos visto que os donos da verdade mudam de opinião. Então, quem tiver juízo, não contrarie. Mude junto com eles. E quem queira ser o dono da verdade, antes faça qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, para crescer em curtidas e compartilhamentos até que num determinado número de seguidores se torne uma pessoa de prestígio digital. A partir daí é ir para o abraço. 

Boa semana para todos.  

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Quarenta e cinco anos sem presidente!

Sexta-feira fez 45 anos que JK faleceu. Quero falar sobre ele, mas antes aplaudir o artigo da Laura Ferraz, publicado no mesmo dia, no Boletim da Liberdade. Ela escreveu “Carta a uma afegã”. O texto emociona. É forte! É simples, claro, direto e perfeito. Carrega o sentido da liberdade e é o meu gancho para lembrar que estamos já há 45 anos sem o exemplo de um Presidente da República do Brasil que mereça o título.  

JK governou sob o slogan, “50 anos em 5”. Ele fez mais do que isso. Depois de Juscelino, elegeram Jânio Quadros e João Goulart, este para ser vice. Jânio o fez presidente. Em seguida, surgiram os interventores, sem campanhas, sem eleição e por imposição da vontade de um grupo de pessoas que acreditava saber o que seria melhor para o povo brasileiro. 

Aguentamos bem e quando não aguentamos mais, pressionamos. O destino vendeu-nos gato por lebre e recebemos Sarney, ao escolhermos, por representação, Tancredo Neves, E aí… Bem aí, sem intermediários, escolhemos Collor, Fernando Henrique, Lula, Dilma e, agora, Jair. 

É coisa pra se pensar. Não? Mas, “Se eu penso, eu choro”. Nisso está certo Moacyr Franco e mais certo ainda quando, na sequência, levanta a dúvida: “Será que eu sou maluco ou maluco é o mundo onde Deus me faz viver?”.

Seja como for, nós fizemos as nossas escolhas, tanto quando deixamos que escolhessem por nós; tanto quando escolhemos por nós mesmos. Então, porque diabos não escolhemos outros juscelinos? Outros presidentes democratas de fato, realizadores de verdade, conciliadores, “artistas do impossível”, título que o escritor Cláudio Bojunga dá ao Juscelino? 

Será que outros não existem ou será que não se apresentam? Somos uma nação de 214 milhões de brasileiras e brasileiros – de mais brasileiras do que brasileiros – e não existirá nem mais uma ou um único democrata no estilo do que foi Juscelino? Democratas, de fato? Gente que consiga entender que o povo nada mais quer do que ser livre para tocar a própria vida e cuidar de si próprio, tendo o Estado como um auxiliar capaz de garantir que todos do povo tenham o mesmo grau de liberdade. 

Claudio Bojunga é autor da melhor obra que li sobre Juscelino: JK, o artista do impossível. É uma aula não só sobre Juscelino, mas sobre a história da Democracia – dessa com letra maiúscula.  Em certa passagem do livro, na abertura do capítulo que retrata os primeiros movimentos do presidente eleito, Bojunga registra: “Dificilmente Getúlio diria como Juscelino, num discurso de campanha, “a democracia não é um dom de ninguém, não é favor de ninguém, não é um bem arrendado, que possa reverter ao seu dono permanente ou legítimo dependendo do bom ou do mau emprego que dele fizer seu usufrutuário”. 

Juscelino venceu a eleição com o Brasil sob Estado de Sítio e sobre isso, em outra passagem, Bojunga lembra o que disse o presidente ao escritor Josué Montello, antes de tomar posse: “O que me aflige é este estado de sítio. Não quero governar em estado de exceção. Já dei instruções para que se suspenda a censura à imprensa. Quero a imprensa desatada, mesmo para ser injusta comigo. No fim, veremos que ganha a parada. Meu Plano de Metas está pronto. Pronto e retocado. Agora, mãos à obra”. 

É o jeito certo de derrubar as críticas: trabalhando duro. Bem, diante disso, que se apresentem os candidatos à cadeira de Juscelino, que ainda está desocupada encostada em algum canto na Presidência da República. E deixo com você a última questão: será que erramos ao escolher ou errarmos os que, previamente, escolheram os nomes que nos foram submetidos? 

Boa semana.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Legitimidade e Legalidade

“Manda quem pode; obedece quem tem juízo”. Mas, quem pode mandar? Na resposta está o conceito de legitimidade e na maneira como manda quem tem o poder de mandar,  está a legalidade. 

Quem obedece tem juízo? Terá sim, juízo perfeito, se antes de obedecer, considerar a base da autoridade de quem manda. Terá nenhum juízo ou, simplesmente, medo quem obedece sem questionar o requisito básico de legitimidade. 

Quando quem manda são os agentes do Estado, existe aí a obrigação de uma premissa fundamental: quem lhes confere o título de legítimos autores das leis, normas e decisões de mando? 

Depende do tipo de Estado que estamos a cuidar, porque existem Estados com regimes variados e, portanto, com legitimidade diversa. A origem do poder de todos os regimes, no entanto, é o povo que pode abrir mão do poder em favor de qualquer um. 

Esse qualquer um, definido como agente do Estado, sabe disso e por saber, quando deseja se manter indefinidamente no poder sem ser questionado e tendo todo o poder que possa alcançar, trata de encontrar uma maneira de legitimar-se. Os reis faziam guerra; os sacerdotes, profetas e papas nomeiam-se representantes legítimos de Deus no mundo. Os ditadores e tiranos excluem os contrários, porque se não existem contrários, os a favor os legitimam. 

Contudo, os tiranos, um dia caem, porque ‘o poder corrompe a mais não poder”, como sentencia o escritor Cláudio Pellicano, autor de bons livros, um deles é “Não deixe que um dia de sol estrague o seu mau humor”, dedicado aos maus humorados. 

Ao corromper, o poder produz ganância e desconfiança, dois elementos que com o tempo, transformam os a favor em contrários e todos somados, produzem as revoluções. 

A revolução francesa é o exemplo mais claro de troca rápida de posições. Nela, os que guilhotinaram os contrários na entrada foram guilhotinados por outros, no processo. 

Mas, como se dá a legitimação do poder no Brasil? 

A Constituição Federal, elaborada pelos representantes do povo eleitos para esse trabalho, esclarece no primeiro parágrafo do primeiro artigo: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. 

Está aí definida a legitimidade. Para evitar que ela desapareça ou apodreça, os mandatos de representação têm tempo certo e tempo curto, quando comparado com o da vida humana. A vitaliciedade é, por conseguinte, um risco para a democracia, porque os vitalícios podem assumir o caráter de agentes legítimos por si sós, sem dependerem da vontade popular. O risco só desaparece quando a lei é o instrumento único do exercício da legitimação e os legisladores não são vitalícios. A legalidade é, então, fruto da legitimidade. 

Qualquer ato, decisão, norma ou lei originado no Estado Brasileiro será legítimo se resultar  da vontade do povo, expressa diretamente ou por intermédio das pessoas que ele elegeu para agirem em nome dele. Mas, para que isso funcione, é necessário que toda a população, ou pelo menos aquela que decide pelo voto, tenha consciência do valor das escolhas que faz ou conhecimento do conceito de legitimidade, para que, em nenhum momento, abra mão da prerrogativa. 

Eu duvido que a maioria dos eleitores  brasileiros tenha essa consciência. Uma elite, talvez, mas é próprio das elites brigarem para não serem maioria. Elas querem decidir como se fossem e para isso é básico que excluam quem, verdadeiramente, é. 

Por esse motivo, a lei no Brasil não é igual para todos. Ela tem aparência de igualdade, mas isso desaparece quando ela é aplicada. Afinal, “todos são iguais perante a lei”. Quando ela não identifica as diferenças sociais na aplicação, dificulta a vida de quem tem menos. 

O jurista Modesto Carvalhosa define a diferença entre uma “lei igual para todos”, princípio só encontrado  na constituição de 1824, no artigo 179, inciso 13 e “todos iguais perante a lei”. Ele partiu da diferença entre os conceitos, para construir o livro ” Uma Nova Constituição para o Brasil”. 

Logo, paremos com a cansativa e chata ladainha de cantar o risco para a democracia, quando alguém, sem legitimidade alguma, faz apelo pela ditadura ou tirania. O risco de se perder o pouco que se tem de democracia ou de não alcançá-la na plenitude, está na falta de consciência política, que cria a ignorância sobre os direitos e prerrogativas que tem o povo na relação dele com o Estado. 

Quem tem medo de ver a democracia soçobrar, que se adiante com o trabalho de criar consciência política em quem ainda é proprietário exclusivo da legitimidade para decidir quem ocupa as funções no Estado Brasileiro. Esta é a melhor ou única estratégia válida para consolidar a democracia por aqui. 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Reforma política fake

Deve-se olhar a proposta de reforma eleitoral que anda por aí e a chamam “reforma política”, com a lupa da estratégia, professora que nos ensina a ler as intenções nas ações, para que se possa fazer juízo perfeito dos atributos pessoais. Faz parte da personalidade dos astutos, usar as palavras e os títulos para despistar os interlocutores daquilo que eles realmente pensam, sentem e desejam.  É desse modo que se comportam, e se têm comportado ao longo do tempo, os reformadores de ocasião. Por isso, para cada campanha eleitoral, existiu uma legislação própria, como se quer agora. 

O que nos é apresentado como ótimo para melhorar a representação política é, na verdade – na mais absoluta verdade, como deve ser qualquer verdade –  uma tentativa de não colocar em risco os representantes eleitos até aqui. A renovação incomoda e contraria quem diz aos quatro ventos que deseja reformar. Os arquitetos da reforma se equiparam aos que projetam casas para si mesmos e não para os clientes que os contratam. 

Olhem, com atenção, alguns pontos da pretendida reforma. Ficarei, por enquanto, com o “distritão”, que a semântica leva para a consideração de um distrito enorme, grandão, assim, tipo gigante, onde o voto é válido em todo o estado. Mas já não é assim? É! O que querem, então? 

O sistema proporcional que desejam fazer desaparecer tem a vantagem de preservar o voto das minorias e, isso, não parece bom para quem não gosta da democracia ou não sabe exatamente o que ela quer dizer. 

A democracia não é, simplesmente, a prevalência da vontade da maioria, mas o reconhecimento da existência de uma minoria que, de igual modo, paga impostos e tem o direito de ter a sua vontade respeitada. Eis a vantagem do voto proporcional: a minoria se faz representar por intermédio dos partidos. O “distritão” é o sistema em que o voto da minoria vai ao lixo. 

O argumento que sustenta a tese é o do absurdo de um candidato ser eleito com menos votos que outro. À primeira e rápida leitura, isso parece óbvio e injusto. Injusto com quem? Com o candidato ou com o eleitor? Quem deve dar as cartas? 

O “distritão” elege só os candidatos mais votados até o número total de cadeiras na Câmara dos Deputados, Assembleias e Câmaras Municipais, ficando os demais nas suplências. E as suplências nos parlamentos não têm voz nem voto. O sistema proporcional tem, sim, um problema grave: o tamanho das regiões de representação – o “distritão”, que a proposta de um “distritão” amplia e na palavra dos astutos, melhora a qualidade da representação. 

Qual seria, então, a vontade do eleitor? Afirmo que sequer precisamos de pesquisas ou plebiscito para saber. Os costumes já anunciam faz tempo. É só ver como o eleitor tem decidido o destino do voto.  Há os candidatos eleitos com votos de todas as cidades de um estado (distritão) e os que são eleitos, majoritariamente, com votos de seus redutos (distrital). O eleitor já escolheu o distrital-misto. Cabe ao legislador dar uma pequena arrumadinha nisso: redefinir os distritos no mapa, para evitar que os votos distritais sofram dura concorrência dos endinheirados ou celebridades. 

Em entrevistas, a deputada federal Renata Abreu, de São Paulo e do Podemos, uma das relatoras da reforma, diz que o “distritão” seria a passagem de um modelo para o outro. Ou seja, primeiro detonam as minorias para, lá na frente, quando só Deus sabe, recuperá-las. 

É nessa toada que caminha a reforma eleitoral: com as palavras sendo usadas para esconder as intenções. Quem representa o eleitor, apesar da obrigação de defender os mesmos princípios e valores daqueles aos quais representa, não age desse modo. Representa a si mesmos e a seus valores. 

Ao eleitor cabe, portanto, o exercício da vigilância, da “eterna vigilância” que é o “preço da liberdade”, como alerta John Philpot Curran, um protestante irlandês liberal. A frase resume um texto mais precioso: “É destino comum do indolente ver seus direitos se tornarem presa fácil daqueles que não o são. A condição sob a qual Deus deu liberdade ao homem (ser humano) é a vigilância eterna; condição essencial que, se quebrada, terá como resultado a servidão imediata”. 

Se pelo menos os que se julgam liberais observarem, com mais atenção e com disposição para agir, a reforma que o Congresso Nacional deseja fazer na legislação eleitoral, já seremos, em número, gente suficiente para evitá-la. E, lhes asseguro, o problema não está só no “distritão”. Há muito mais a evitar nos 934 artigos que o Congresso deseja transformar em lei. 

Por Jackson Vasconcelos