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O réu, o juiz e o magistrado da eleição

A Justiça é o ponto de encontro das candidaturas do Lula e do Sérgio Moro. Um lá esteve como réu e o outro como o juiz que o condenou. O STF anulou os processos, por entender que o juiz julgou o que não poderia ter julgado. 

O caso todo voltou à estaca zero e o contribuinte ficou com a conta do desperdício, que soma horas de audiências, papeladas, operações de busca e apreensão, prisões, custo dos presos, despesas operacionais, atrasos em outros processos e, quem sabe, até os honorários dos advogados de defesa, que podem ter sido pagos com dinheiro destinado aos partidos.  

O réu, em campanha para a Presidência da República, alega que a anulação dos processos é uma absolvição e a prescrição decorrente de todo o tempo perdido, também. Ele se diz injustiçado, porque nada de concreto conseguiu o juiz contra ele, “a prova irrefutável, o batom na cueca”, como definiu Igor, apresentador do podcast Flow, quando entrevistou o juiz, o candidato Sérgio Moro. 

O juiz da causa, igualmente em campanha e adversário do réu, diz que não é bem assim e afirma: “O Lula não foi absolvido. Ninguém diz que ele é inocente. Na verdade, o que a gente está vendo é a anulação da condenação por corrupção, por motivos formais” e diz mais: “É aquela velha história, se você é rico e poderoso, a Justiça não chega pra você”. 

Ora, embora a preferência da Justiça pelas sentenças de condenação contra gente pobre e sem poder seja um fato percebido ou imaginado com justos motivos pelo povo, isso passa a ser um problema a mais para a sociedade, quando o fato é reconhecido por um ex-juiz criminal, com relação ao STF. Sim, porque foi da Suprema Corte a decisão de anular os processos contra Lula. 

Como primeira providência, numa atitude de respeito ao dinheiro do contribuinte, os agentes do Estado deveriam ser chamados ao pagamento dos prejuízos causados pela anulação dos processos. Quem errou ao julgar o réu ou quem anulou as sentenças. Numa democracia, os agentes do Estado devem satisfação ao povo e não estão livres para tomar decisões erradas e, depois, ligar o “dane-se” e cobrar a conta do povo.  

Lula e Moro são candidatos à Presidência da República e um magistrado do STF, no papel de Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, presidirá e fiscalizará o pleito. Se a discussão entre Lula e Moro não for esclarecida pelos agentes do Estado que criaram o imbróglio, o povo brasileiro irá às urnas em outubro com o risco de eleger um presidente que cometeu crimes graves e não foi punido e, portanto, sem autoridade moral para conduzir os negócios da nação ou eleger um agente público que, por descuido ou incúria, lhe causou um enorme prejuízo. Isso não é bom. 

Aí eu volto à cantilena, para perguntar: Que raios de Estado é esse? Qual a qualidade dos seus agentes e até quando o contribuinte brasileiro pagará a conta salgada da ineficiência e dos abusos contra ele? 

Semana após semana, mesmo sabendo do perigo de ser considerado um chato, insisto que precisamos rever o modo como trabalham os agentes do Estado Brasileiro na sua relação com a sociedade. Se somos uma democracia de fato, aqui só o povo é soberano para cobrar a conta com o direito de decidir esclarecido. 

Boa semana para todos. 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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“Só o político pode salvar o economista”

Se você, nos últimos dias, ouviu Ciro Gomes, quando ele definiu o slogan “Rebeldia da Esperança” e leu ou ouviu as homenagens ao Leonel Brizola, quando o calendário marcou os 100 anos do nascimento dele, entenderá a importância desse artigo. 

A frase que eu uso como título forma a capa de um livro do economista Antônio Delfim Netto. A frase, a foto e o conteúdo compõem um conjunto criativo de comunicação para uma campanha eleitoral. Delfim Netto apresentava-se como candidato à Assembleia Nacional Constituinte e iniciava uma nova fase na vida, como representante do povo. Ele foi eleito cinco vezes deputado federal por São Paulo e perdeu na sexta tentativa, em 2006. 

O título de partida do livro sintetiza a causa da conversão à política de um economista, naquele tempo tachado pejorativamente de tecnocrata, Czar da Economia. A foto dele e o nome do Delfim somam-se ao título para passar a ideia de metamorfose de um ser tido como intelectual esnobe para um humilde político. 

O conteúdo, uma coletânea de textos da participação do autor em eventos e entrevistas, comprova que a conversão dele não parou na identidade, mas atingiu a personalidade por completo. De interventor rígido no mercado privado, criador de estatais e co-autor do AI-5, Antônio Delfim Netto se tornou um liberal. Certamente, ele cumpriu com invejável disciplina o conselho dado por Jesus Cristo a Nicodemos: “Para alcançar a vida eterna, é necessário vos nascer novamente”. 

E nasceu! Então, o título do livro merece um adendo para ficar desse modo: “Só o político pode salvar o economista… e um liberal salvar um político”. E eu argumento com algumas passagens. Vamos a elas: 

Faz parte do livro, uma entrevista que Delfim Netto concedeu ao jornalista Ancelmo Góes, publicada no Jornal do Brasil, no dia 27 de julho de 1986, tempo em que o Brasil era governado por Sarney, o cara que inventou o Plano Cruzado, se deu bem e ao desinventar se deu mal. Coisa típica de Estado interventor. Na entrevista, Delfim Netto critica o plano, comenta com ironia o empréstimo compulsório criado pelo governo para tomar o dinheiro dos consumidores de gasolina e, com fina ironia, deu uma aula, onde mostrou que os governos, quando se apropriam de 100 unidades monetárias do contribuinte fazem com que elas, rapidamente, se transformem em 65 ou menos. “Os governos tomam o povo como um conjunto de imbecis que precisam deles para não fazerem besteira com o próprio dinheiro”. 

Adiante, Delfim expôs as propostas que pretendia defender ao ser eleito: “Vou defender coisas antiquadas. Primeiro, a propriedade privada, não como direito natural, mas como a única forma que o ser humano encontrou para definir seus espaços de liberdade. Em segundo lugar, a economia de mercado. A sociedade centralizada é incorrigível, uma droga do princípio ao fim. Em terceiro, a redução do tamanho do Estado. Ele hoje é um razoável produtor de aço, mas um péssimo produtor de segurança. Produz alumínio com eficiência, mas produz mal saúde e educação”. Uau! Tão atual como o dia de hoje. 

O livrinho é muito bom. No penúltimo capítulo, reproduz um texto do autor publicado pela revista IstoÉ em fevereiro de 1977, ano em que Delfim foi Embaixador na França. Lembro-me que para lá ele foi com o desejo de ficar distante do Presidente Geisel, que tinha mais simpatia pela ironia sisuda do Mário Henrique Simonsen, do que pelo jeito expansivo do Delfim. 

O artigo, que tem o título sugestivo de “Liberdade e Democracia”, de onde eu retiro uma pequena passagem: “A experiência histórica mostra que toda centralização do poder econômico nas mãos do Estado acaba no exercício discricionário do poder… Quando o Estado detém o monopólio dos empregos; quando o Estado detém em suas mãos o poder de empregar ou desempregar e manter desempregado; quando o Estado detém em suas mãos o poder de selecionar à vontade e sem controle quem recebe e quem não recebe benesses financiadas com os recursos da sociedade; então não é possível pensar-se nem em igualdade nem em liberdade”. 

Com olho nesta lição do Professor Antônio Delfim Netto, ouvi atentamente Ciro Gomes e li as homenagens ao Brizola, de quem sente saudades dele. Ciro é a reencarnação do caudilho. O Rio de Janeiro, cidade e estado, carregam até hoje as marcas de um político que não foi salvo por um liberal. 

Boa semana para todos.

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Os conselhos do Paulo Hartung

Erra quem diz que o mandato de um governador é de quatro anos, renovável por mais quatro se a população desejar. Vejam o caso do Estado do Rio. O governador de agora, com apenas dois anos de mandato, responde pelo pagamento de dívidas contraídas por seus antecessores. 

Pode-se dizer, então, que Sérgio Cabral, Pezão ou, quem sabe, Garotinho, Marcello Alencar, Benedita e Rosinha ainda andam por aí no governo, representados pelas dívidas que contraíram em nome dos contribuintes. Wilson Witzel também, pelos problemas que criou. Os argumentos de cada um deles e delas para o problema são variados, mas têm o ingrediente comum e cômodo da injustiça da União com o Estado. 

Se Cláudio Castro vencer o desafio de governar dando jeito na casa, seja só pelos dois anos e pouco, seja por mais quatro, o que ele conseguir fazer atravessará o tempo e assegurará vida melhor para quem, por escolha ou por origem, está no estado. Empresas e pessoas. Se ele, ao contrário, não encontrar as saídas, seu governo se juntará, em desgraças, aos demais. O tempo relativo, não absoluto, dos mandatos, diz da personalidade de um governante, que pode ser a de um estadista, de um simples governante de passagem pelo governo ou de um oportunista. 

Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo, dá sentido a uma conversa desse nível, pelo que fez no seu estado, com o reconhecimento da população, que três vezes lhe deu o governo do estado. Uma quarta ele não quis. Foi Senador, deputado federal, deputado estadual e prefeito de Vitória. Parte do sucesso que ele teve nasceu da capacidade de formar um bom grupo político. 

Por enquanto não sei os motivos que levaram o ex-governador Paulo Hartung a publicar no Twitter conselhos para os cariocas e fluminenses. Pelo que está dito lá seria só para fazer referência à participação dele num encontro na Casa Firjan. Mas, sabe-se lá ? As notas são de hoje, dia em que escrevo o artigo, segunda-feira, 17 de janeiro. Disse ele: “Quando o ES cansou de ver as coisas indo de morro abaixo, a sociedade se levantou e as forças políticas acompanharam, iniciando um processo de reconstrução do Estado. Enfrentamos o crime organizado, resgatamos o equilíbrio fiscal e produzimos históricos resultados na área social”. E disse mais, com uma frase que lembra Marcelo Crivella, que anda sumido: “Só cuida das pessoas quem cuida das contas…”. É verdade. 

Os conselhos do ex-governador são bons conselhos e há mais deles, bem mais, no livro que ele publicou, “Brasil, Desafios e Propósitos”. Uma coletânea de opiniões já publicadas em vários veículos da imprensa. A política é homenageada pelo Hartung, desde a introdução, quando cita a pensadora Hannah Arendt: “O sentido da política é dado pelo fato de ela ser um meio para um fim mais elevado, sendo a determinação dessa finalidade bem diferente ao longo dos séculos”. 

Paulo Hartung está sem partido. É o que se consegue saber quando se busca por ele nas redes. Eis aí uma oportunidade para os partidos que, ainda sem candidato a presidente, queiram fazer uma boa aposta. 

Bem. Até a próxima semana, gente. 

*Artigo publicado no Diário do Rio.

Por Jackson Vasconcelos

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A liberdade, substantivo feminino

O desejo de ser livre está presente na natureza do ser humano, no seu DNA desde a criação. Algo que nem Deus desrespeita. Ele acalma as tempestades, mas para levar Jonas a Nínive, precisou fazê-lo meditar no estômago de uma baleia até ser convencido, e para fazer de Saulo de Tarso, um apóstolo, precisou que ele criasse consciência da tirania dos romanos no apedrejamento de Estevão e caísse cego do cavalo no caminho para Damasco. 

Existem, contudo, os que querem ser mais do que Deus e por isso exigem a liberdade só pra si. A toma dos outros, porque a liberdade de todos tolhe o seu desejo de submeter os outros à sua vontade. Eis o sentido da tirania. O fato não seria um problema se o Estado não oferecesse aos autoritários os instrumentos de ação, porque eles ficariam só na vontade doentia de submeter os outros aos seus desejos, aos seus “instintos mais primitivos”. 

A História do Brasil, da derrubada da monarquia ao golpe de 64, tem exemplos de sobra de intervenção das forças armadas no processo político para ocupar o poder e de uso das polícias e de outros agentes públicos, para intimidar, prender e matar os recalcitrantes, aqueles que contrariam os tiranos. 

Então, no exercício da liberdade para escolher quem governa o Estado e quem o representa na elaboração das leis e dos orçamentos e quem, em nome dele exerce funções nos três poderes da república e fiscaliza o uso dos instrumentos de coerção que tem o Estado,  o povo precisa ter a garantia de que, no tempo certo e do modo certo, poderá substituí-los. A alternância no governo entrega o Estado ao seu legítimo dono, o povo. 

O voto é, portanto, um instrumento de garantia. Sabe-se, contudo, que os ditadores chegam ao poder pelos golpes, mas também pelo voto e nesta situação demoram bem mais para sair, porque o voto camufla a opressão com as vestimentas da legitimidade. Não precisamos viajar às eleições dos nazistas na Alemanha para confirmar o fato. Aqui mesmo, temos o exemplo de Vargas.  

Portanto, é algo indispensável, o ato de votar para escolher quem governará o Estado e o manterá como ente submisso à vontade do povo. Logo, para que a liberdade de toda uma Nação seja preservada e a democracia seja útil, o ato de conscientizar o povo para o valor da liberdade é essencial. 

Quem fará isso com mais propriedade? 

Na espécie humana, o gênero feminino entende melhor o conceito de direito, de liberdade e vida, pois, as mulheres, para conquistarem direitos semelhantes aos dos homens e terem liberdade, lutaram bem mais ao longo da história e ainda pelejam bastante. A melhor compreensão do valor da vida humana é delas por natureza, pois somente elas são capazes de gerá-la. 

Por suas qualidades, as mulheres tomam a iniciativa da luta pela liberdade e pela vida em todos os lugares do mundo, onde há tirania e opressão. 

Somos um povo que tem demonstrado medo de perder a democracia, principalmente, por sabê-la ainda não muito sólida. Então, deveríamos ter as mulheres mais presentes na política e no trabalho de conscientizar a nação sobre o valor que tem o voto como instrumento de prevenção e combate à tirania do Estado. 

Por onde elas deveriam entrar neste ambiente? Pelos partidos políticos. Eles, no entanto, entregues ao poder masculino, parecem não perceber isso ou não querer isso. É bom que queiram e é bom que percebam logo, porque está muito chato e perigoso ver a única porta de ingresso pelo voto no Estado Brasileiro fechada para quem, na espécie humana, conhece mais os estragos causados pela falta de liberdade.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.
Foto: Tela ‘A liberdade guiando o povo’, de Eugène Delacroix (1789-1863)

Por Jackson Vasconcelos

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O que é uma eleição?

Eleição é escolha. O eleitor, colocado diante das informações sobre os candidatos, decide qual deles receberá o seu voto. As campanhas eleitorais têm o propósito de oferecer aos eleitores as informações para que ele decida. Colocada a questão deste modo, a primeira percepção é de ser um processo racional e ele não é. Por isso, os resultados surpreendem até mesmo os institutos de pesquisa a cada eleição. 

No Brasil, muita gente diz que a eleição de 2018 foi um fenômeno, porque os resultados surpreenderam e, para alguns, até assustaram. Para essa gente, existe uma dúvida sobre a próxima eleição: “O fenômeno se repetirá?”. Mas, o que de fato aconteceu em 2018 no Brasil? Pouca coisa de diferente do que aconteceu em outros lugares do mundo: a eleição do inesperado.

Ora, quando se quer analisar o resultado de uma eleição, necessário se faz considerar todos os seus termos e isso só é possível observando-se todas as fases de uma campanha. Em 2018, o resultado é comparável a uma ressaca no mar, que acontece quando fortes ventos entram em contato com a superfície dos oceanos e impulsionam, com força, as águas na direção da orla marítima. 

Os ventos começaram a se formar no Brasil em 2013 com a população nas ruas, descolando-se da política, que segue caindo em descrédito ao longo dos anos. Nas eleições de 2018, os ventos ganharam força e velocidade a ponto de jogar na orla, um número expressivo de candidatos inexpressivos e alguns inesperados. 

A mesma ressaca aconteceu em outros lugares do mundo, em especial nos EUA, com a eleição de Donald Trump. O jornalista francês sediado na Itália, Giuliano da Empoli, identificou o fato e escreveu “Os Engenheiros do Caos”. 

Nele, o autor mostra um descolamento da sociedade do ambiente da política, estimulando movimentos como o “Movimento 5 Estrelas”, na Itália, que deu vida a Giuseppe Conte, como Primeiro-Ministro e elegeu Boris Johnson, Trump, Jair Bolsonaro e outros tais pelo mundo afora. 

As redes sociais criaram novos profissionais de comunicação, gente com capacidade para produzir conteúdo contundente e distribuí-lo com velocidade. Os algoritmos cuidaram de aprisionar  eleitores e candidatos em tribos específicas. É uma seleção prévia. Os candidatos falam só com quem tem interesse de ouví-los e quem os ouve, é levado a odiar gente de outras tribos. 

Quem lê “Os Engenheiros do Caos”, ou outros materiais sobre campanhas eleitorais modernas, pode ser levado a acreditar que, de fato, há um fenômeno totalmente novo na comunicação política. Há novidades, sem dúvida, mas nada totalmente novo. Nova é a velocidade e a fúria com que os conteúdos chegam à orla onde estão os eleitores. 

Faz-se campanhas diferentes. Eleições não. Os eleitores permanecem decidindo as eleições com base nos critérios de sempre. Votam naqueles candidatos que melhor se identificam com eles, que falam o que eles querem ouvir. E não há racionalidade que convença! Emoção, sim. As redes carregam emoções, como fez a imprensa tradicional com exclusividade. 

O eleitor escolhe pela simpatia e rejeita pela antipatia. Na simpatia e na antipatia não estão previstas as qualidades e competência dos candidatos para fazerem o que prometem fazer. 

Será sempre assim? Será, porque assim sempre foi. Nunca foi diferente. As redes só organizam “o cadastro” para colocar cada um no seu quadrado e fazer com que gente de quadrado diferente seja combatido. Deram velocidade e efetividade à comunicação. 

A TV e o rádio perderam poder numa campanha? Não, porque, para não perderem, uniram-se às redes, que repercutem as notícias, para dar-lhes a leitura que interessa a cada tribo. O conteúdo que sai da TV e do rádio é triturado na rede, traduzido na língua de cada tribo para produzir as emoções que conquistam o voto. 

Haverá uma nova ressaca em 2022? Quem sabe? Na vida dos mares já é possível prever quando elas acontecerão pela leitura correta da altura das ondas, da meteorologia, da pressão atmosférica, das correntes marítimas e etc. Com os instrumentos corretos, entregues a bons estrategistas, é possível, sim, prever que o mar estará calmo ou turbulento, mas saber quem será levado por ele até a orla é bem difícil. 

O ser humano, ao contrário dos ventos e das ondas do mar, é sempre imprevisível.

Por Jackson Vasconcelos

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Debate decide?

Entre todos os bons debates políticos que há como referência, o primeiro ocorrido na TV americana entre Nixon e Kennedy é o mais estudado, pelas lições no campo da imagem e conteúdo. Nixon chegou ao estúdio com uma vantagem de seis pontos percentuais na pesquisa de intenção de votos. Após o debate a diferença diminuiu aos poucos, mas com rapidez, até ser revertida a favor de Kennedy e de lhe dar a vitória. Nixon passou todo o tempo preocupado com o adversário. Kennedy falava para as câmeras como se falasse com o eleitor. 

A imagem física deu vantagens ao Kennedy. Tanto é que, após o debate, as pesquisas identificaram um fenômeno: quem ouviu pelo rádio deu vantagem a Nixon que, sem dúvida, tinha mais experiência e vigor com as palavras. Quem assistiu pela TV considerou Kennedy muito melhor. Já fiz vários comentários e análises sobre este debate. 

Os debates têm importância numa campanha, mas o resultado de uma eleição se dá pelo conjunto da obra, que começa no momento em que o candidato decide concorrer. Há os prazos legais, é verdade, mas que a política não respeita, porque os prazos legais estão no campo da racionalidade e campanha é sentimento, vontade, determinação. 

Se o candidato decidir muito tarde, terá que correr mais que os adversários; se decidir muito cedo, terá tempo para planejar com capacidade de avaliar cada passo. O aviso ao público se dá em tempo e com resultados diferentes, a depender da estratégia traçada pelo candidato. A ocasião dele ou dela compartilhar com outras pessoas o desejo de disputar será melhor aproveitada se considerada como estratégia. E, por ser uma decisão estratégica de um exame  com base nos conceitos de oportunidade e ameaça. O tempo certo de compartilhar definirá o tempo que se tem para planejar a campanha. 

A vontade de ser cria o discurso e ele, o debate, que se dá quando a mensagem do candidato, peça fundamental numa campanha, faz o adversário reagir. Sem a reação do adversário, não existe debate e o discurso segue o impulso que lhe deu o seu autor e pode passar pelo eleitor sem ser notado. Sabe-se que o eleitor notou o discurso, quando o adversário reage. Eu não considero como debate uma discussão ou troca de opiniões entre candidatos. Para mim aí se terá uma conversa, que pode ser agradável ou desagradável, para um ou para todos os candidatos. Para ser um debate a troca de opiniões e palavras deve provocar reações entre os adversários a ponto de elas serem capturadas pelos eleitores e transformadas em voto ou negação. 

O confronto com efetividade pode ser entre as imagens, ideias, opiniões, acusações, apoiamentos e, de forma mais fria, propostas. O relevante é saber que a qualidade e o teor dos debates como elemento de convicção é decisão do eleitor. Por isso, perde tempo o candidato que debate com os adversários se não compreender que eles são veículos, plataformas, simplesmente, que precisam atingir os eleitores pelas reações dos adversários. 

Para um estrategista o conceito é relevante, decisivo, quando ele prepara um candidato para um debate. Uma conversa fria, sem provocar reação dos adversários presentes e mesmo ausentes, não anima os apoiadores nem conquista novos. Ou seja, o candidato que chega aos debates com vantagem nas intenções de votos deve ficar na “retranca” e só oferecer energia ao debate se perceber que perde posições na imagem que tem com o eleitor. 

Preparar um candidato para um debate não é trabalho fácil, que se transforma numa rotina, porque cada debate é um novo jogo e pede novas estratégias. O candidato deve entrar em campo com uma meta objetiva e tendo um objetivo como meta. Digamos que esse objetivo seja se tornar mais conhecido, então, ele precisa ser contundente, ter presença forte. Mas, ser conhecido como o quê? Como um bom administrador público ou como um agente conservador, liberal? Que tema deve ser melhor aproveitado? 

Os debates relevantes para a história e estudos são os das campanhas presidenciais, mas há debates que aconteceram em outros tipos de campanha que ensinam bastante. Iniciei a prosa com um debate entre Nixon e Kennedy, nos EUA. A trajetória política de Richard Nixon tem muito a ensinar estrategistas. Ele fez uma carreira rápida até a Vice-Presidência da República. Perdeu a eleição para Kennedy, em seguida, se candidatou a governador da Califórnia, seu reduto eleitoral, e perdeu. A imprensa americana deu-lhe como morto. Se morreu, ressuscitou como Presidente da República ao vencer Hubert Horatio Humphrey.  E nessa estrada venceu outros debates. 

As campanhas presidenciais no Brasil aconteceram na TV, a partir de 1989, quando a sociedade conquistou o direito de eleger novamente os presidentes. O primeiro debate aconteceu nos estúdios da TV Bandeirantes, na abertura da campanha, no dia 7 de julho. Marília Gabriela moderou. Foi um debate rico, mas que não atendeu ao avisado pela moderadora: “Tem o objetivo de esclarecer os eleitores quanto às propostas e aos programas de governo dos candidatos”. A primeira experiência se estendeu no tempo: ficaram as frases de efeito, as provocações e as passagens mais engraçadas. 

Voamos no tempo em tecnologia, qualidade de comunicação e imagem e chegamos à eleição de 2018, quando houve uma reviravolta nos prognósticos das campanhas. A Bandeirantes saiu na frente, novamente, e, em razão da pandemia, ficou isolada na realização de debates. A tecnologia ofereceu ao eleitor a oportunidade de participar diretamente. A TV montou uma sala para pesquisa digital on-line. Novamente, prevaleceu a capacidade do candidato de, ao provocar os adversários, produzir fatos e conquistar eleitores.

Por Jackson Vasconcelos

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No jogo político, a imprensa tem lado

Um erro bem comum na política é enxergar a imprensa como uma arma do demônio e, nas campanhas, como instrumento de notícias imparcial. A imprensa, na política e nas campanhas, é um agente político. Vi políticos e candidatos acreditarem-se com vantagem, porque estariam protegidos pela boa relação com a imprensa. Mas, eles, em algum momento, decepcionam-se e aborrecem-se. 

A imprensa, na política e nas campanhas só tem boa relação com os fatos que conseguem audiência e se o ambiente é de polarização, como tem acontecido, ela aplica todos os seus esforços aí.  O Brasil tem um histórico bem interessante na relação da imprensa com a política: Samuel Wainer, Chateaubriand, Roberto Marinho, Lacerda, Ari de Carvalho, José Maria Rebello, que faleceu no finalzinho do ano passado, com 94 anos de idade. Ele criou o Binômio, um jornal dedicado, quase exclusivamente, a fazer oposição a Juscelino Kubitschek. 

O historiador Cláudio Bojunga, biógrafo de Juscelino, autor do livro “JK o artista do impossível”, registra: “Juscelino também era bombardeado por um jornaleco chamado O Binômio, precursor da imprensa alternativa, editado por José Maria Rabelo e Euro Arantes, cujo primeiro número saiu no dia 22 de fevereiro de 1952. O nome já era uma gozação do slogan do governador, que eles reescreveram como “sombra e água” fresca, insinuando que concordavam com Oscar Dias Correia em apresentar JK como indolente e gozador da vida(…). José Maria Rabelo diz hoje que O Binômio foi “uma brincadeira que a política levou a sério”. 

Numa das viagens de JK, governador, a Araxá, ele levou, na comitiva, o empresário de jogos e turismo, Joaquim Rolla. O Binômio produziu a manchete: “JK foi a Araxá e levou Rolla”. O secretário de Segurança Pública, Geraldo Vidigal – disse Bojunga, alegou ofensa às tradições morais do povo mineiro e mandou recolher a edição. 

No livro do Bojunga há várias outras menções ao tipo específico de relação da imprensa com a política. Mas, quem quiser ir além disso, pode usar a biografia de Samuel Wainer, “Minha Razão de Viver – Memórias de um Repórter” ou ao “Chatô, o Rei do Brasil”. E muitas outras obras. 

O Presidente Jair Bolsonaro não gosta da imprensa. Hillary Clinton também não. O ex-Presidente Trump, muito menos. Fernando Henrique Cardoso, nem se fala! Lula apanhou muito. Brizola odiava o Sistema Globo de Rádio, jornal e tv e era odiado por ele. Ari de Carvalho, proprietário do jornal O Dia, enquanto viveu,  pintava e bordava com os políticos que não se alinhavam com ele. 

Então, seria razoável dizer que a imprensa, no jogo político, é um agente de oposição. Mas não é bem isso. Ela é um agente político que, por conveniência dos editores e interesse comercial, ou até mesmo por espírito de vingança dos repórteres, pode ser de oposição ou de situação. 

O jornalista Maurício Dias me disse algumas vezes: “Não acredito em liberdade de imprensa, mas em liberdade de expressão e liberdades políticas. Os veículos de comunicação têm interesses políticos, econômicos e comerciais”. Esta declaração está presente também numa longa entrevista que ele concedeu ao Mercado de Notícias, disponível no Youtube.

A política e a imprensa são temas que se misturam e quem faz política precisa conhecer muito bem esta relação se quiser sobreviver com sucesso. Mas, quem faz imprensa no segmento da política também necessita, para não estimular o risco de ser usado. 

No histórico da relação da imprensa com a política existem casos – muitos casos – que mostram o quanto isso acontece. Um bom exemplo é a substituição da Ministra Dorothea Werneck pelo político Francisco Dornelles no Ministério da Indústria e Comércio no governo Fernando Henrique Cardoso. 

O presidente queria a troca, mas não tinha como justificá-la com a Ministra. Então, o jornalista Márcio Moreira Alves ajudou com uma coluna dedicada exclusivamente ao Francisco Dornelles, do título ao ponto final. 

Não se pode encerrar um artigo em que se trate da relação da imprensa com a política sem trazer um caso clássico: Watergate. Dois jornalistas, Bob Woodward e Carl Bernstein levaram um presidente americano à lona – Richard Nixon. A história foi reproduzida num livro do qual se fez um filme, “Todos os homens do presidente”. 

É um clássico de preservação da fonte, que só se soube quem era quando o próprio informante declarou-se muitos anos depois do fato. Um clássico também de investigação realizada pela imprensa. O  informante nunca deu uma informação aos jornalistas, mas pistas, que eles perseguiram na apuração. Sobre o tema é também relevante a leitura de Garganta Profunda, outro clássico sobre a relação da imprensa com a política. 

Por Jackson Vasconcelos

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A demagogia é ponto de encontro entre o réu e o juiz

Ano de 2003. Posse do Presidente Lula. Ele criou e anunciou o Programa Fome Zero, o publicitário Duda Mendonça criou a campanha e a Associação Brasileira de Agências de Publicidade pagou a conta do lançamento. O programa seria sustentado por doações feitas pelo número 0800 707 2003. Não preciso tomar o tempo de vocês para explicar o que aconteceu com o Programa, com Duda Mendonça e com as empresas de publicidade envolvidas com o governo. 

Quando ouvi o jingle de lançamento do programa, vi logo que alguma coisa não batia bem entre a letra e a ideologia do PT. O jingle serviria bem, muito bem mesmo, como um hino liberal. Transcrevo para argumentar, mas vocês podem encontrar a peça no youtube. Se quiserem, eis o endereço: https://youtu.be/I0vphplWlX8 

“Todo mundo tem direito de plantar; todo mundo tem direito de colher. Todo mundo tem direito de ganhar, pra todo mundo comer. Todo mundo tem direito de ensinar; todo mundo tem direito de aprender. Todo mundo tem direito a trabalhar, pra todo mundo ter direito de comer…”.

Os liberais entendem que é obrigação do Estado garantir os direitos que a sociedade conquistou e ela mesma estabeleceu nas leis que autoriza e chancela. E tais direitos estão acompanhados por deveres de cidadania.  

Os demagogos não. Para eles os direitos são concessões que o Estado faz por ser caridoso. Não deveres para todos. Para alguns, sim. Para os demais, privilégios e prerrogativas. Por isso, a campanha do Fome Zero baseou-se em doações, apesar do jingle que diz que o trabalho, o ensinar e aprender, o plantar e colher, resolvem a fome. 

A demagogia é uma estratégia de comunicação. Aristóteles, em sua obra “A Política”, define como adulação para conquistar o poder. E nenhuma outra necessidade humana é tão propícia para a demagogia como é a fome. Por isso, o Fome Zero do Lula ganhou corpo novo discurso do seu algoz, Sérgio Moro. Chama-se “Força-tarefa nacional para erradicação da pobreza”. Ele diz que será algo parecido com a operação Lava-Jato. Será criada uma Agência para erradicação da pobreza e farão parte dessa agência, “Os melhores entre os melhores da administração pública”. Dito por ele, pessoas que, certamente, serão escolhidas por ele e como são os melhores entre os melhores, serão gente que não é pobre. 

Moro se diz um liberal. Na JP News ele afirmou ser. Fez isso assim meio se defendendo, mas fez. Disse ele: “Na economia eu sou bastante claro…sou um liberal”. Bem, como ele é um liberal, poderia adotar o que ensina o jingle do Fome Zero. 

O melhor programa de erradicação da pobreza é a redução do Estado, para que seja possível reduzir os impostos, diminuir a burocracia e deixar que o povo trabalhe e se prepare da melhor forma para encontrar os melhores trabalhos. Com o Estado pagando auxílio-moradia para juízes que têm casa própria e cedendo dinheiro para os partidos pagarem salários para os seus candidatos, teremos pobreza por um bom tempo.

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Rodrigo Pacheco e o “mínimo necessário”

Por mais que eu queira evitar o Estado Brasileiro como tema, menos consigo, estimulado por discursos vazios sobre o assunto, pronunciados por gente que é importante na política brasileira e poderá ser mais relevante ainda no futuro. 

Na quinta-feira (9/12), foi a vez do Senador Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado Federal e candidato a Presidente da República por vontade do PSD. Ele fez a abertura do Seminário “Para onde vai o Brasil”, promovido pelo Correio Braziliense. O Seminário ocupou mais de quatro horas do meu tempo, para ouvir considerações de técnicos e políticos sobre o que tem sido o ano e o que poderá ser o próximo. Evidentemente, sentiu-se o calor da campanha presidencial. 

O discurso do Senador Rodrigo Pacheco foi frio, confuso nos conceitos e mineiro demais ao citar os funcionários públicos no contexto em que citou a necessidade de uma reforma administrativa: “Que possa fazer com que o Estado, sem demonizar os funcionários públicos, tenha o tamanho do Estado necessário…”.

Depois disso, o Senador caminhou a trilha de considerações sobre o Estado Brasileiro que, segundo ele, não pode ser o Estado mínimo defendido por alguns, porque sendo mínimo, ele seria egoísta. 

“No Brasil de tantos déficits de inclusão, de educação, de todas as ordens”, disse, literalmente, o Senador, “Seria pensar que o Estado não participasse, por exemplo, de programas sociais para matar a fome, e a fome imediata das pessoas. Isso seria muito egoísta. Precisamos de um Estado necessário para fazer políticas públicas eficientes, priorizando as atividades fins, bem mais do que as atividades meio”. 

O Senador falou 20 minutos e antes de encerrar, pediu: “É fundamental não deixar de ter otimismo e entusiasmo com o Brasil e ter esperança”.  Sim, eu tenho e sou otimista. Mas, afinal, o que é um Estado necessário? Eu entendo, sem ser egoísta, que é o Estado mínimo, para se ter, por exemplo, o mínimo suficiente de funções e estruturas para garantir à população os serviços pelos quais ela paga regiamente. 

Outro exemplo de Estado mínimo necessário seria um Estado onde não se teria, por exemplo, três senadores para cada estado da federação e cada um com dois suplentes. Não bastariam dois por estado e suplentes seriam os que tiveram votos e não foram eleitos? Um bom começo, não?

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos