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“Caguei… caguei pra CPI!”

O desabafo ou desaforo do Presidente da República aconteceu no encontro de quinta-feira dele com o canal do Youtube e do Facebook. Literalmente, ele disse “Inclusive, né… Eu não vou entrar em detalhes sobre essa CPI desse… do Renan Calheiros e Omar Aziz, que dispensa comentários e não vou responder nada pra esses caras. Não vou responder nada pra esse tipo de gente. Em hipótese alguma. Que não estão preocupados com a verdade e sim desgastar o governo. Por quê? O Renan, por exemplo, é alinhadíssimo ao Lula. Ele quer a volta do Lula a qualquer preço. Portanto, não vou responder a questões da CPI. Hoje, eu acho, não sei se foi o Renan, o Omar e o saltitante, fizeram uma festa lá embaixo, na presidência, entregando um documento, pra eu responder perguntas da CPI. Vocês sabem qual é a minha resposta, pessoal? Caguei! Caguei pra CPI”. 

Deixo as considerações sobre a qualidade do que foi dito para vocês e me restrinjo ao que me cabe no ambiente da estratégia, a ferramenta que identifica atributos, oportunidades, ameaças, cenários e conquistas numa disputa eleitoral. 

Para ser melhor no trabalho que lhe cabe, um estrategista deve se colocar nos dois ambientes da disputa. É o que faço para construir o presente texto. 

A mensagem do presidente chegou a quem o apoia como uma palavra de ordem, de uma atitude valente e de reação autêntica, mas com o mesmo sentimento com que atingiu os adversários. Porque, ao dizer com veemência, quase aos gritos, que não está nem aí para a CPI, Jair Bolsonaro demonstrou, mais uma vez, que a CPI, na verdade, na verdade, lhe traz incômodos. 

O Presidente está irritado – irritadíssimo com quem ele diz que despreza. Eu, se pudesse, aconselharia a todos os competidores a ler “A Arte de Ter Razão”, de Schopenhauer, um conjunto de estratagemas criados pelo filósofo para orientar quem precisa enfrentar debates e vencê-los. O livro diz que a verdade dos argumentos não importa, isso é coisa para a lógica. Embora entendido como um “manual antiético”, o livro tem o objetivo de desmascarar os impostores. Vejam o que está dito no estratagema 8: “Desestabilize o oponente: Ao ser provocado à raiva, o oponente perde o equilíbrio e a racionalidade para julgar corretamente e perceber a própria vantagem. É possível fazê-lo ficar com raiva por meio de repetidas injustiças, de algum tipo de truque e pela insolência”. 

Depois vá ao 27: “Deixe o seu oponente desequilibrado: Se o oponente ficar bravo de maneira inesperada com um argumento, então deve-se insistir nele com mais afinco, não simplesmente por ser bom deixá-lo com raiva, mas porque se supõe que o ponto fraco de uma linha de pensamento foi atingido e que nesse ponto o oponente está mais vulnerável para ser atacado. 

Como acredito que nem o Presidente nem os seus algozes tiveram algum tempo para Schopenhauer, o jogo na CPI segue empatado, com os dois lados fazendo raiva, um no outro, mutuamente e cada um buscando o que é melhor para si mesmo e esquecendo-se dos aliados. 

O Presidente, numa luta para vencer a oposição, faz sempre o que é melhor para ele, ainda que isso dificulte sobremaneira a vida de seus aliados. Na oposição ao Presidente, cada grupo faz o que acha ser melhor para ele mesmo, também sem alinhamento com os que estão do mesmo lado. 

Ora, se nenhum dos lados tem tempo para Schopenhauer,  que dedique, então, algum para Nash, em “Uma Mente Brilhante”. Nash contesta Adam Smith, para mostrar que o melhor resultado numa disputa será alcançado quando, num grupo, cada um faça o que é melhor para si e para o grupo. É o “Equilíbrio de Nash”. 

Sim, porque o objeto da cobiça não é a vitória de um grupo sobre o outro, mas a vitória de um deles na conquista do eleitor, numa disputa que se dará em dois turnos e numa situação que comprova que a cada eleição o número de eleitores descrentes cresce, exatamente, pela confusão na comunicação e ódio no ambiente da competição. Exatamente, como acontece num dos episódios do filme, quando todos os rapazes queriam conquistar uma loira que estava em companhia de algumas amigas, e Nash complementando ou contrariando Adam Smith, avisou: “o melhor resultado numa disputa é obtido, quando todos num grupo fazem o que é melhor para si e para o grupo”. Teoria dos Jogos. 

Quem sabe na disputa pela presidência da república não surge alguém com uma mente brilhante e tira do jogo aqueles que só querem o melhor para si mesmos? 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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O dia em que Jean Wyllys e Bolsonaro concordaram

Algo inusitado aconteceu no fim de semana: Jean Wyllys e Jair Bolsonaro expressaram a mesma opinião, cada um a seu modo próprio, sobre a declaração do governador Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul. Ele declarou-se gay, na entrevista que concedeu ao Pedro Bial.

Jean Wyllys desacreditou a declaração do governador, quando escreveu: “É ridículo ver héteros querendo impor a nós, LGBTQs assumidos e na luta desde sempre, que louvemos sem crítica o outing de um governador de direita que até ontem era jagunço de um racista homofóbico que se revelou genocida. Fica fácil assumir-se gay e catalisar a solidariedade acrítica dos cúmplices e ingênuos, quando o movimento “LGBTQ” virou um “nicho de mercado rentável”.

Jair Bolsonaro caminhou a mesma estrada, com o jeito debochado que lhe é próprio. A declaração dele aconteceu na entrada do Palácio da Alvorada, momento em que, todos os dias, ele se encontra com eleitores dele. Sobre a declaração do governador, disse Jair Bolsonaro: “O cara, ontem, achou que é o máximo. Se achando o máximo. Bateu no peito: eu assumi. É o cartão de visita para a candidatura dele”.

Jean Wyllys e Jair Bolsonaro fizeram coro harmônico no papel de tentar determinar o comportamento de outra pessoa, atitude altamente autoritária e que distancia os dois do campo liberal. À esquerda e à direita, estão postos os autoritários. Talvez por isso, o liberal Ortega, no livro “A rebelião das massas”, afirme: “Ser de esquerda, como ser de direita, é uma das infinitas maneiras que o homem pode eleger para ser um imbecil. Ambas são, de fato, formas de hemiplegia moral…”

Mas, se a declaração do governador Eduardo Leite de ser gay causou frisson e se fez matéria na imprensa, a intenção dele na entrevista, me pareceu outra. Antes de entrar neste aspecto, chamo a atenção para a melhor parte de tudo o que disse o governador ao Pedro Bial. Eduardo Leite definiu os termos da reforma que ele defende para o Estado Brasileiro: “Um Estado que precisa ser repensado na sua estrutura, no seu tamanho, para definir onde ele deve estar mais presente, onde ele libera para que o setor privado possa assumir um papel mais relevante. Um Estado que tenha também uma proposta sobre inclusão social, sobre o respeito à diversidade, sobre trazer as pessoas para o serviço público com mais qualidade. Para quem o governo serve? O Estado deve tocar na vida das pessoas que mais precisam”.

Eduardo Leite falou também sobre as credenciais que tem para ser Presidente da República: as reformas que promoveu em Pelotas e no Estado do Rio Grande do Sul. E complementou referindo-se, claramente, aos principais adversários, Lula e Bolsonaro: “Precisamos tirar o Brasil dos extremos. O debate não pode ser sobre o que fomos (Lula), nem sobre o que somos (Bolsonaro), mas sobre o que podemos ser no futuro”.

Em seguida, Pedro Bial fez a pergunta que produziu a declaração que incomodou Jean Wyllys e Jair Bolsonaro. Deixemos claro, que Pedro Bial não perguntou sobre a opção sexual do governador, mas sobre as prévias do PSDB, onde Eduardo Leite concorre com outros tucanos, entre eles, João Dória.

A pergunta do Pedro Bial foi: “O governador de São Paulo, João Dória tem 2 trunfos: é o governador do estado mais importante do país e trouxe a primeira vacina. Que trunfos  você tem que João Dória não tem?”

A resposta do governador me passou o desejo dele de responder ao Doria de modo subliminar. “Integridade. Ser por inteiro. Eu nunca falei de um assunto que eu quero trazer pra ti aqui no programa, que tem a ver com a minha vida privada e que não era um assunto até aqui, porque se deveria debater mais o que a gente pode fazer na política e não exatamente o que a gente é ou deixa de ser. Mas, nesse Brasil com pouca integridade, a gente precisa debater o que se é, para que fique claro e não se tenha nada a esconder. Eu sou gay…”

Durante seis minutos e catorze segundos, esse foi o tema da entrevista. E alguma coisa na longa resposta do governador me diz que o fato de ele ser gay pode ter sido usado como atributo negativo na disputa interna no PSDB e – tomara que não – exatamente pelo governador João Doria. das prévias no partido e, ao quando ele se apresenta para a disputa prévia. Se eu estiver certo, teremos Jean Wyllys, Jair Bolsonaro e João Dória no mesmo papel autoritário. E, cá entre nós, a imagem deles me permite a dúvida.

Olhando o todo da entrevista e o que dela separaram Jair Bolsonaro e Jean Wyllys, socorro-me de um pequeno trecho de um livro bem interessante para os tempos atuais: “Podres de Mimados”, de Theodore Dalrymple, que indico como boa leitura. Diz o autor: “É comum que se pense ter uma opinião sobre um assunto, algo que é ativo, é mais importante do que ter qualquer informação sobre aquele assunto, que é passivo; e que a veemência (sentimento) com que se sustenta uma opinião é mais importante do que os fatos (conhecimento) em que ela se baseia”.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Montagem/Fotos: Daryan Dornelles (Jean Wyllys) e Fabio Pozzebom/Ag. Brasil (Jair Bolsonaro)

Por Jackson Vasconcelos

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O pior senado da república

Hoje o Senado Federal está representado pela CPI da Pandemia, porque nada mais se ouve ou se assiste com relação àquela Casa. Para a política, se temos a imagem, temos a realidade; se temos um pedaço, temos o todo. Então, aos olhos do povo, o Senado Federal é, no momento, o que está posto pela CPI do Covid-19. “Do Covid”, e não como alguns jornalistas dizem, “Da Covid”, porque o vírus é masculino, como é a totalidade dos membros da CPI. E já aí, começa a lista dos elementos a demonstrar a falta de qualidade do colegiado. 

O ambiente é de machos machistas, como ficou claro quando algumas senhoras lá foram para prestar esclarecimentos. Outras CPIs foram deselegantes e desrespeitosas com as mulheres, mas nenhuma de forma tão brutal e direta como se viu recentemente. 

A CPI que representa o Senado é composta por 18 senadores, 11 titulares e sete suplentes. Dezesseis são representantes do norte e do nordeste brasileiro. Só dois senadores, um titular e um suplente, representam o sul do país. Nas posições principais, estão os senadores Omar Aziz, presidente, que representa o Amazonas, Randolfe Rodrigues, o Amapá, e Renan Calheiros, Alagoas.

Ora, se o Senado é a casa de representação dos estados da federação, há alguma coisa errada quando o sul, o sudeste e o centro-oeste são ausentes ou irrelevantes. Este é outro fato que desequilibra as deliberações da CPI. 

Partamos agora para a pior notícia para os contribuintes: os custos. Não consigo ser exato, mas a falta de exatidão não prejudica a tese, porque está  abaixo do custo real, mesmo considerado o fato de se ter uma razoável transparência, algo que só se conseguiu há pouco tempo. 

Estamos no ano de 2021. O último dado é de 2019, onde se tem para o Senado Federal um custo de R$ 4.383.751.104,00. Em 2015, quatro anos antes, foi de R$ 3.816.510.496,00 (dados do orçamento do Senado). Portanto, os gastos cresceram, numa legislatura, R$ 567.240.644,00. Como o Senado só existe para os Senadores, nada há de errado eu dizer que cada um dos 81 deles custa, por ano, aos contribuintes brasileiros, R$ 54.120.384,00. 

Dito de forma redonda e literal, 54 milhões de reais por cabeça ou quatro milhões e meio de reais por mês. Romário custou menos a cada mês que foi um dos melhores do futebol brasileiro. 

Separados dos demais, os dezoito senadores da CPI custam, por ano, R$ 974.166.912,00. Poderia ser menos? Evidente. Dois dados – um deles por comparação – indicam a possibilidade, se considerarmos todos os demais gastos como essenciais. Os dados são do Portal da Transparência do Senado Federal, que divulga os gastos dos senadores com as despesas para o exercício do mandato político (pedir o voto), função separada da legislativa e da fiscalização. Para cada senador existe uma lista, onde se lê as seguintes rubricas: 

  1. Aluguel de imóveis para escritório político (suplementar ao gabinete luxuoso que cada um tem na sede); 
  2. Aquisição de material de consumo (item também adicional ao material que o Senado fornece nos gabinetes da sede);
  3.  Locomoção, hospedagem, alimentação e combustível;
  4. Contratação de serviços de apoio ao parlamentar, (sabendo-se que para esse trabalho o Senado Federal já conta com um quadro qualificado de assessores servidores públicos, vários deles e, de regra os mais caros, lotados nos gabinetes dos senadores. Portanto, a rubrica é para contratação de assessoria complementar e externa);
  5. Divulgação da atividade parlamentar, para uso pessoal e exclusivo, (esclarecido que o Senado possui canais de comunicação próprio, TV, rádio e rede digital);
  6. Passagens aéreas;
  7. Serviços de Segurança Privada. 

Abrigados nessas rubricas, os 18 senadores da CPI gastaram, em seis meses, o valor total de R$ 2.306.099,30. A média, por senador, foi de R$ 128.116,60.  O Senador Zequinha Marinho (PSC-PA) está na cabeça dos gastos com R$ 215.415,62. Na outra ponta, com os menores gastos está o Senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), com R$ 56.400,00. 

Aqui começa o elemento de comparação. Se o Senador Tasso consegue exercer as mesmas funções por um valor quase três vezes menor que a média, qual o motivo dos demais gastarem o que gastam? Por que o Senador Zequinho Marinho faz o mesmo que o colega por quatro vezes mais? O Senador Alvaro Dias (Podemos-PR), que não compõe a CPI, apresentou o valor de R$ 1.341,65. Literalmente, menos de mil e quinhentos reais para seis meses. 

O que faz um senador custar ao contribuinte bem mais do que um colega, que exerce as mesmas funções? Além de tudo isso, se tem as despesas causadas pelas decisões da CPI. Cada requerimento aprovado produz gastos e boa parte dos requerimentos nada tem a ver com o trabalho de investigação. Quem tiver dúvida, por favor, consulte. Os pedidos estão debitados ao desejo de quem necessita aparecer. A CPI é um colegiado, onde as decisões deveriam ser coletivas. No entanto, ela funciona semelhante às cortes superiores, onde a decisão monocrática sobressai. Cada astro, uma estrela! 

Quem sabe quanto custa a conta do Estado no lombo do contribuinte e, exatamente, até onde o Estado deve ir para não se tornar um fardo pesado e inútil, não permitiria o que se vê em Brasília. Mas, quem pensa desse modo, não está lá e se lá estiver, é em absurda minoria. Olhem a composição inteira do Senado Federal e vejam se vocês encontram gente com o pensamento do Roberto Campos, do Marco Maciel, do Afonso Arinos, do Severo Gomes…Todos eles senadores em seu tempo na política. 

Como não os temos mais e nenhum outro senador representa, na relação com o Estado Brasileiro, o que eles representaram, eu não sou injusto quando digo que estamos diante do pior Senado da República. 

Encerro com um bom exemplo da História de Roma, contada por Margaret Thatcher. Escreveu ela que um jornalista empenhado em preparar uma matéria sobre o Vaticano, entrevistou o Papa João XXIII. Perguntou ao Papa: “Quantas pessoas trabalham no Vaticano?”. “A metade”, respondeu o Papa. Eu abuso do exemplo, para indagar: Quantos senadores trabalham no Senado? Deixo com vocês a prerrogativa da resposta. 

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João versus Amoêdo

Quando eu já tinha quase pronto o artigo da semana, onde comentava a qualidade do Senado Federal, por mim classificado como o pior da história, recebi do bom amigo, Fred Luz, uma indicação: a entrevista que João Amoêdo concedeu ao Renan Santos, do Movimento Brasil Livre, MBL. Parei para assistir e mudei o rumo da prosa. Deixei para a próxima semana as minhas considerações sobre o Senado Federal, representado hoje, na mente brasileira, pela CPI da Pandemia. 

Sobre o Senado Federal, inspirou-me um texto do ex-senador Jarbas Passarinho, falecido em 2016, “Nem Pizza, nem guilhotina”, que ele escreveu em razão da CPI do Orçamento, presidida por ele em 1994. Um primor de texto, ao qual voltarei na próxima semana. 

Sigamos, rumo à entrevista do João Amoêdo. É longa, com mais de uma hora e meia de duração, mas por conta do entrevistador. Renan Santos fala muito, questiona pouco, estica demais a conversa. Deve ter ocupado mais o tempo da audiência do que o próprio João Amoêdo. 

O Brasil precisa de um liberal na presidência, uma experiência que seria, sem dúvida, sadia, para uma nação que desde a proclamação da república sobrevive com dificuldade às atitudes e decisões de um Estado preguiçoso, desonesto, corporativista e caro. João Amoêdo é o candidato a presidente mais preparado e toca isolado no campo liberal. 

O problema que vejo no João é a dificuldade que ele tem para compreender que entre ele e a cadeira presidencial existe um evento indispensável: a campanha eleitoral. João parece não gostar disso. 

Ele está certo, por exemplo, quando diz na entrevista que é fundamental partir com o apoio integral e incontestável do partido, mas não tem a paciência necessária para construir esse caminho. A impaciência dele o fez ouvir calado as estocadas do entrevistador no governador Zema, único governador liberal e do Partido Novo. 

Dias antes da entrevista, João Amoêdo chegou a propor o Zema como candidato e até perdoou o governador por não ter efetivado um programa amplo de privatizações. João deve ter mudado de opinião, quando o governador se juntou à bancada federal do Novo para dar apoio a outro candidato à presidência e não ao João. 

Ora, gente, uma campanha eleitoral é um processo de convencimento que caminha do núcleo para fora, como acontece quando uma pedra cai na água. A comunicação de convencimento não dá saltos. Sem seus discípulos e apóstolos, Cristo teria ficado em Jerusalém. Os discípulos fizeram os apóstolos e eles o crescimento da Igreja. 

Outras questões me chamaram a atenção na entrevista. Uma, a ideia de João ser o candidato contra Lula e Bolsonaro. Não é por aí. João é o melhor candidato e até agora o único com possibilidades reais de substituir o Bolsonaro na polarização. Ciro que cuide do Lula, para substituí-lo no jogo. 

Essa turma que lida com campanhas eleitorais criou uma tal “terceira via”. Existem os terceiro, quarto, quinto ou sexto candidato. Até aqui, Lula e Bolsonaro são os candidatos a substituir. E, pensem comigo se não tenho razão: João terá mais oportunidades se enfrentar o Lula no lugar de enfrentar o Ciro, que atende a todos os vícios de um povo acostumado, por ignorar os liberais, a ser explorado pelos agentes do Estado. 

Outra e última questão, para não abusar do tempo. João elogiou a resolução e inteligência estratégica do Ciro, deixando claro que o seu projeto para o Brasil é diferente do dele. Perfeito, João! 

Contudo, se João deseja mesmo ser presidente, precisa imitar o Ciro, o Lula, o Bolsonaro em determinação e demonstração da vontade de querer ser. A imposição é improdutiva num projeto que requer a motivação de todos. Campanha é paixão. 

A entrevista do João ao Renan deveria ser revista pelo Amoêdo numa autocrítica, porque se João vencer o Amoedo na largada, teremos um liberal na Presidência da República em 23, sem dúvida. 

Encerro indicando para vocês outra entrevista do João Amoedo, no GPS Político. Também é muito bom. Gabriela comanda o programa e todas as entrevistas dela, ela abre com uma régua, onde o entrevistador tenta encontrar o seu ponto ideológico. João Amoêdo encontrou-se como conservador liberal, à esquerda estão colocados os neoliberais e à direita, a extrema direita”.  Onde estará o verdadeiro adversário do João? A régua do programa tem extrema esquerda, social democrata, liberal democrata, neoliberal, conservadores liberais e extrema direita. Façam suas apostas!

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Terceira via. Tem isso mesmo?

João Amoêdo desistiu de ser candidato a presidente. Será mesmo? Eu tenho dúvida, porque sem a candidatura dele o partido Novo terá dificuldade para eleger deputados federais em número suficiente à garantia de sobrevivência do projeto do partido de ser relevante na Câmara dos Deputados. 

A campanha está desenhada com dois candidatos em pólos opostos, Jair Bolsonaro e Lula. Os institutos de pesquisa e imprensa apontam  uma terceira candidatura para alívio dos eleitores de nenhum dos dois. Falam em polarização como se ela fosse uma novidade e numa terceira via como se houvesse provas de possibilidade. É nesse contexto que enquadraram a candidatura do João Amoêdo. 

A polarização sempre esteve nas eleições para a presidência e a valer os percentuais apresentados para 2022, quem surgir no cenário só será viável se, e somente se, tirar eleitores de um dos dois em número suficiente para substituir integralmente um dos pólos. Tirar dos dois, em conjunto, é improvável, porque os perfis são radicalmente diferentes. Os eleitores de um odeiam os eleitores do outro a ponto de se separarem de velhos amigos, de gente da família e até de evitarem a eternidade no mesmo lugar. 

A polarização é uma velha companheira das eleições no Brasil, principalmente das presidenciais. Mas, fala-se nela como se fosse uma novidade! Da mais antiga à mais recente, todas foram resultado de polarização raivosa. Para não tornar o artigo maçante, fiz o corte em 1989, primeira eleição direta após o arranca-rabo entre Jânio Quadros e Henrique Teixeira Lott, tendo sido, Adhemar de Barros, a busca de uma terceira via. 

Em 1989, quem diria, que Fernando Collor chegaria à presidência? Por que chegou? Por ter polarizado a campanha com Lula e pelo fato de Brizola ter se inserido para ser uma terceira opção. Dividiu o primeiro turno com Lula, mas não com peso suficiente para evitá-lo no segundo turno. 

Depois tivemos 1994 e nova polarização, naquele ano entre Fernando Henrique e Lula, uma campanha radicalizada e acirrada a ponto de fazer com que Lula e o PT votassem contra o Plano Real, por ser a bandeira do adversário. Naquela eleição Lula só venceu no Rio Grande do Sul. Em 1998 Ciro Gomes tentou polarizar com FHC para tomar o lugar do Lula, Eita! Nem isso é novidade! FHC venceu no primeiro turno, ainda com a bandeira do Real. 

Em 2002, Lula finalmente chegou lá, numa campanha polarizada entre ele e José Serra e não entre ele e FHC. O presidente Fernando Henrique ajudou Lula de uma maneira tal que José Serra, candidato do seu partido, só venceu em Alagoas. Garotinho tentou tirar Lula do páreo, mas não conseguiu substituí-lo integralmente. Só evitou que a eleição do Lula ocorresse no primeiro turno. 

Tivemos nova polarização em 2006, entre Lula e Alckmin, porque José Serra, do seu partido,  resolveu fazer corpo mole, para não disputar com Lula e evitar que Alckmin, sendo presidente, disputasse a reeleição em 2010. José Serra, abandonado pelo FHC em 2002, jogou Alckmin às feras em 2006. 

Chegamos a 2010, quando José Serra apresentou-se para derrotar a guerrilheira Dilma Rousseff. Pule de dez! Marina Silva quis ser a terceira via, para tirar Dilma do jogo, mas mordeu os votos do José Serra, que quase perdeu no primeiro turno, com o corpo mole do Aécio Neves, companheiro de partido, ferido e humilhado por Serra na pré-campanha. 

Em 2014, Eduardo Campos quis ser a terceira via para substituir Dilma Rousseff. Faleceu. Marina Silva entrou no jogo e escolados, os dois outros candidatos, Dilma e Aécio, resolveram empurrá-la para fora do campo. Marina não entendeu o processo, defendeu-se como pôde dos dois e não de um só e ficou barrada no primeiro turno. No segundo, tentou resolver indo para o pólo do Aécio. Era tarde.

Em 2018, foi Bolsonaro num pólo e o PT no outro. Quem tentou se enfiar no meio, ficou pelo caminho. Só teria chance quem substituísse um dos dois. 

Está claro, portanto, que não há essa história de terceira via, em campanhas polarizadas entre dois candidatos, como está mais do que evidente, que as campanhas tendem sempre à polarização. O terceiro candidato, para se viabilizar e vencer precisa substituir um dos outros na preferência do eleitor. É desse modo que vejo a candidatura do João Amoêdo. 

Para ser viável, Amoêdo precisa ter os votos arrependidos de Bolsonaro e, para vencer, substituir o capitão na preferência de grande parte dos demais. Caso contrário, Amoêdo só reduzirá as possibilidades de Jair Bolsonaro ser reeleito. No hemisfério do Lula ocorrerá o mesmo se Ciro roubar a cena. Portanto, a polarização seguirá e haverá equilíbrio entre as forças. 

Jefferson Viana publicou aqui um artigo interessante: “Vida e Morte da Terceira Via”. Em um trecho, ele nos presenteou com uma frase do liberal Roberto Campo, que me dá uma mãozinha aqui: “A chamada terceira via é incompetência para praticar o capitalismo e covardia para aplicar o socialismo”. Jefferson complementa: “Na política posicionamento se faz necessário, pois na tentativa de agradar a todos não agrada ninguém…”.

Ora, se Lula e Bolsonaro têm o tamanho eleitoral que lhes determinam as pesquisas, a vida dos demais candidatos será bem difícil. Todos funcionarão na linha de levar a disputa para uma posição mais equilibrada entre os dois principais ou para desequilibrar a balança na direção de um deles. Poderá ser diferente? Ah! Sim. Poderá, porque o eleitor é o “senhor da razão” e só decide no momento mais próximo do dia da eleição. E se decidir diferente, será uma grande novidade. 

Candidato de centro numa eleição polarizada? Não há precedentes. Quem insistir nesse caminho terá o destino da Igreja de Laodicéia: “Tomara que foras fria ou quente! Porque és morna, vomitar-te-ei da minha boca” (Apocalipse 3:16). Se Ciro ou Amoêdo quiserem ter chances de vitória terão que substituir Lula e Bolsonaro na disputa. E isso, até aqui, vale para qualquer outro candidato a presidente. 

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Mark versus Trump

O Boletim da Liberdade noticiou a decisão do Facebook de fixar em dois anos o prazo de banimento do ex-presidente Donald Trump, uma punição antes aplicada por prazo indeterminado e comentada por mim aqui em janeiro com o título “Viva a liberdade”. O artigo está disponível nos arquivos do Boletim e aqui no meu espaço, do Aqui Tudo é Política.

Conhecendo o assunto, você teria segurança para esclarecer a razão do banimento? O que eu sei é o que disse a equipe do Facebook, quando aplicou a pena e agora, ao mudar o prazo do castigo. 

Da primeira vez, a justificativa foi: “Os riscos de permitir que o presidente use a plataforma neste momento são simplesmente grandes demais”. Naquele momento, o presidente estava prestes a entregar o governo ao sucessor, denunciava fraudes na eleição e era acusado de estimular alguns malucos a invadir o Capitólio. Teria sido isso? 

Agora, ao definir um prazo para a penalidade, o senhor Nick Clegg, vice-presidente de assuntos globais do Facebook, informou que as atitudes de Trump “Constituíram uma violação grave de nossas regras que merecem a maior penalidade disponível sob os novos protocolos”. Então, as empresas do senhor Mark Zuckerberg entenderam como graves as atitudes do ex-presidente e por isso, aplicaram-lhe a pena máxima. Ou seja, há um catálogo de protocolos e penas. 

O protocolo considerado, certamente, foi aquele dedicado a combater condutas prejudiciais, proteger e oferecer suporte para a comunidade do Facebook. A regra combate condutas nocivas contra outras pessoas com atos de ajuda aos prejudicados, remoção dos conteúdos e bloqueios dos acessos e desativação das contas. Mas, quem classifica as condutas como prejudiciais?  

O Vice-Presidente Nick Clegg explica. Ele cita um painel de especialistas e adiciona um alerta, ao avisar que o ex-presidente poderá ter o prazo da pena ampliado, a depender do comportamento dele.  Eita! Que comportamento deverá adotar o ex-presidente para cair nas graças da turma do senhor Mark Zuckerberg? 

Ora, se há condenação, um processo deveria existir e, sendo real, acolher direito de defesa e contraditório, além de identificar com clareza os julgadores e penas. Não? 

Como nada disso eu consegui encontrar, porque me parece, de fato, não está posto, permaneço com a suspeita que levantei no artigo publicado em janeiro: o senhor Mark Zuckerberg é o dono da bola e só jogará o jogo dele quem ele decidir que deve jogar. 

Será isso um atentado à liberdade? Quem sabe? Mas, antes de avançar com as conclusões é preciso considerar o fato de que a qualquer um é dado o direito de criar seus próprios espaços de comunicação sem depender das estruturas de comunicação do senhor Mark Zuckerberg. Assim como é garantido a quem não goste do modo como o cara administra o que é dele o direito de evitá-lo. O limite de resistência das empresas do senhor Mark é fixado no número de usuários dispostos a abandonar o uso da ferramenta se discordar dos procedimentos do dono. O consumidor e usuário são soberanos na relação.  

A atitude da turma Zuckerberg é arrogante, sem dúvida, mas o Estado poderia fazer alguma coisa? Sim. Uma só: evitar que o senhor Mark Zuckerberg crie dificuldades para outros empreendedores que pretendam concorrer com ele. Tão somente. Sabe-se que não será uma concorrência fácil, como para ele também não foi, mas as democracias são realmente eficientes no ambiente das concorrências.  

Quando surgirem os concorrentes, o senhor Mark sofrerá com eles os problemas que a imprensa tradicional está tendo com as redes de comunicação direta e a humanidade seguirá em paz.  

No terreno da estratégia política está colocado o fato de o  ex-presidente Donald Trump, desaparecido há algum tempo aos olhos do mundo, reaparecer na notícia do banimento. Ele, certamente, saberá o que fazer com isso no próximo ano, quando o Congresso Nacional dos EUA será submetido a novas eleições. 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Uma mulher e muitas atitudes

Edith Piaf é a história de uma vida sofrida, mas bela. “Mas”? Não. Uma vida sofrida e bela, porque a beleza da vida da Edith Piaf está na capacidade  que ela deve para superar os obstáculos cruéis que a vida colocou diante dela. “Capacidade”? Não. Força e convicção. Edith, algumas vezes, alertou: “Não é pelo sofrimento que damos valor às coisas?” E “Se tudo vai mal, só pode melhorar. Então, melhorará. Fatalmente, há esperança quando tudo vai mal”. 

Sem conhecer a história da Edith Piaf, dificilmente se entenderá o peso dessas palavras, como também não o quanto tem dela na música e na letra de “non, je ne regrette rien”. Traduzido: “Não! Eu não lamento nada! Nem o bem que me fizeram. Nem o mal, isso tudo me é bem indiferente!”. Houveram homens na vida de Piaf que lhe fizeram bem e outros que muito mal, mas a todos, indistintamente, a todos, Piaf recompensou com o que podia fazer de melhor. 

Quem não conhece a história dessa mulher e pretende conhecer pode tê-la, por inteiro, em filmes, entrevistas e livros, um em especial, “Piaf uma vida”, de Carolyn Burke. Na linha dos documentários, há um muito bom, “Os últimos dias de um ícone”, narrado pela Sandy, uma boa surpresa. Desse documentário vem a história que separei para este espaço, que sabe lidar com o Estado. Conhece bem os problemas que ele nos causa e as fábulas às quais ele dá vida. Uma delas, a de que a cultura para ser feliz depende dele e de seus agentes. 

No início da década de 60, o Olympia estava praticamente falido, prestes a fechar as portas. Já tinha demitido todo o pessoal. Bruno Coquatrix, diretor e proprietário do espaço, desesperado, visitou Piaf, para pedir a ajuda dela. 

Por aqui, ele, certamente, teria ido bater às portas de um político influente para conseguir arrumar o dinheiro, quem sabe, uma emenda parlamentar ao Orçamento Público! Mas, ele foi buscar a ajuda de quem, pela arte, entenderia o valor do Olympia. 

Piaf estava fora dos palcos há mais de um ano. Tinha recebido a visita de Charles Dumont e Michael Voucaire, autores de “non, je ne regrette  rien”. Piaf juntou as peças e reabriu o Olympia. Contratado para 30 dias, o show ficou em cartaz dois meses, em razão do sucesso, com 100 apresentações e, algumas vezes, duas num mesmo dia. 

Piaf já estava doente e a relação dela com a doença e o palco foi outra lição de vida e superação. O Olympia renasceu. A carta que ela recebeu do proprietário, Bruno Coquatrix, diz tudo: “Querida Edith, você fez um milagre ao superar de novo todos os espíritos do mal (…). Você fez outro milagre por aguentar dois meses. Estou envergonhado. Você me deu seu talento, a sua genialidade mas, acima de tudo, parte de sua determinação e da sua força física. Na verdade, você me deu parte de você”. 

Caminho para a conclusão, com uma frase que está no final do livro “Mulheres e Poder”, das escritoras Débora Thomé e Hildete Pereira de Melo: “Durante a história e também na construção deste livro, vimos como as mulheres tentaram por diversos caminhos, romper com os tetos de vidro que as sociedades lhes impuseram. De vidro porque eram quase invisíveis, possíveis de quebrar, mas limitantes do seu crescimento”. 

Nessa frase está Edith Piaf, assim como estão outras mulheres que souberam ultrapassar as dificuldades, por maiores que fossem, com o simples desejo de oferecerem o que têm de melhor à sociedade, mesmo quando ela as oprime. 

E não há como falar de opressão sem citar que para todos nós, o Estado sem controle e autoridade absoluta como acontece aqui, é opressor e, em sendo assim, fere muito mais as mulheres, porque os espaços que elas ocupam na política ainda é bem menor do que poderia ser. 

Retorno ao livro da Débora e Hildete: “O Brasil tem um enorme esforço a fazer, por ocupar um dos últimos lugares no ranking da presença feminina nos parlamentos da América Latina e do mundo. A política sempre foi um espaço masculino e hostil para as mulheres que, historicamente, tiveram sua atuação restrita ao espaço doméstico”. 

Estou certo das dificuldades encontradas pelas mulheres para terem participação maior na política, uma situação que passou pela proibição de exercer o voto, criou nas mulheres um sentimento mais forte pela liberdade, essência de quem deseja que o Estado atenha-se ao papel de garantidor dos direitos e de servidor público. 

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O voto

O político Guilherme Boulos está nas “Amarelas da VEJA”. Segue a toada daquilo que chamam de esquerda, mas é patrimonialismo escancarado, representado pela apropriação do Estado por seus agentes políticos ou não. 

Eu leio e ouço as entrevistas e discursos dessa turma com uma enorme interrogação: por que governando o Brasil desde 1930, os patrimonialistas têm a coragem de criticar e jogar no colo dos outros, o desastre provocado por eles mesmos? 

Na mesma revista e edição está Fernando Schüler, professor do Insper, com “A República do Privilégio”. Ele compara as estruturas administrativas à disposição dos parlamentares da Suécia e do Brasil e, no caminho de encerrar, depois de críticas contundentes ao modelo brasileiro, ele diz: “O ponto é a aceitação tácita do sistema de privilégio, do modelo patrimonial, e a timidez de nosso espírito de reforma…”.

Nenhuma vírgula do texto é novidade, sequer a frase de encerramento retirada de um livro ainda não publicado pelo economista e, igualmente, sujeito bom de escrita, Gustavo Franco: “O problema é verificar que a apatia simplesmente não funciona”.   

Ora bolas, o Estado Brasileiro é como é, porque os nacionais parecem não se incomodar com isso. Ou, quem sabe, a favor dos brasileiros, não seja bem assim. Mas, na verdade, na verdade, se tenha um sistema político por aqui que desqualifica a democracia e a empobrece. 

O pensador italiano Norberto Bobbio, falecido em 2004, tinha autoridade intelectual para criar conceitos e ele definiu a democracia como um método para tomar decisões coletivas, onde duas regras são fundamentais: todos participam da decisão direta ou indiretamente e ela é tomada pela maioria, após uma discussão livre da qual todos participam. 

Então, se considerarmos Bobbio, o exercício do voto não é elemento suficiente para definir uma democracia. No Brasil falta uma das regras básicas, qual seja, a discussão livre da qual todos participam. As campanhas eleitorais deveriam ser o ambiente de liberdade que ofereceria aos eleitores as mais qualificadas informações para decidir. Não é assim, porque  o desejo de permanência eterna no poder dos que lá chegam tem prejudicado as campanhas, para torná-las garantias de continuidade. Esse tem sido o papel a que se presta a legislação eleitoral. 

É possível vencer essa barreira? Sim, é. A tecnologia nos deu o caminho, quando ampliou e amplificou os canais de comunicação direta entre os eleitores, candidatos e partidos. Juntem-se isso ao fato de as leis serem feitas pelos eleitos e teremos a fórmula para tornar o Brasil um país onde o Estado seja servidor de todos e não empregado de uns e verdugo dos demais. 

Contudo, para decidir bem, o eleitor precisa ter informações melhores. E o modo de esclarecê-lo melhor não será a boa fotografia da paisagem onde está o candidato, ou dos animais de estimação dele, ou ainda do prato que escolheu para o almoço ou jantar; a roupa que veste, a palhaçada que faz e a piada que conta. Será preciso tratar a política com a linguagem da política. 

Os patrimonialistas viventes no poder, pelo menos, desde 1930, estão aí postos. Bem colocados num universo de muita conversa fiada. Para eles, a comunicação política como está é bem conveniente. Quem deseje tirar do poder os patrimonialistas chamados de esquerdas terá o trabalho de fazer uma comunicação melhor. E só os liberais definem o Estado do modo como ele realmente é por aqui e tem, por isso, capacidade e potencial para vencer os patrimonialistas.   

No próximo ano, o povo brasileiro votará para decidir o que fará com a presidência da república, escolherá os 513 deputados federais, os 27 senadores os entre 81 membros da Casa, os 27 governadores e 1.059 deputados estaduais. Os escolherá entre os candidatos que cada um dos mais de 30 partidos apresentará. 

A lei eleitoral autoriza que cada partido indique candidatos para uma vez e meia o número de cadeiras na Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas, inclusive no Distrito Federal. Façam vocês a conta de quantos candidatos estarão em campanha no próximo ano. Para vencer essa parada – uma parada duríssima – a primeira providência dos liberais deveria ser consertar a comunicação. O caminho bom é entender que a disputa não será contra a esquerda, no conceito que ela tem no resto do mundo, mas contra os patrimonialistas, definidos por aqui como a turma que, desde 1930, está aboletada no poder. 

Se você é um liberal, pare, pense e mova-se. Ainda é tempo. 

Boa semana para todos.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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CPI COVID-19, uma propaganda enganosa

Antes de vencer o tema de hoje sobre a CPI COVID-19, presto as minhas homenagens ao Prefeito Bruno Covas, falecido ontem, e ao avô dele, Mário. Os dois foram exemplos de liderança política sadia, atualmente, uma lacuna. 

Os generais, para sobrevivência do regime de 64, castraram o surgimento de novas lideranças políticas e, por isso, quando atravessamos o túnel escuro da ditadura, encontramos do lado de cá, quase exclusivamente os antigos líderes, e, entre eles, poucos nos deram legados hereditários de qualidade. Um deles foi Mário Covas, com Bruno; outro, Antônio Carlos Magalhães, com Luiz Eduardo e ACM Neto, outro ainda, Miguel Arraes, com Eduardo Campos. Temos, então, que pouquíssimas lideranças se formaram pós 64 e algumas por hereditariedade. É passada já a hora de se pensar nisso e agir com rapidez para se ter novos líderes e nosso desejo é ter um futuro melhor. Que ninguém se iluda. O caminho é a política, é o voto, é a participação de todos. 

Isso dito, preciso agora tratar da CPI COVID-19. Ela é uma propaganda enganosa, porque seus membros e criadores prometem ao povo brasileiro decisões que são importantes na convivência com a pandemia. Mas, não é isso o que eles nos entregam. 

Vemos nas sessões da CPI um infernal bate-boca e assistimos a depoimentos sem pé nem cabeça, como o do ex-ministro das Relações Exteriores e do ex-Secretário  Especial de Comunicação Social da Presidência da República, este, então, chegou a receber do relator, senador Renan Calheiros, perguntas para as quais as respostas já estavam com a CPI. Portanto, a atitude do relator teve o objetivo claro de criar constrangimentos espetaculares. Ele conseguiu! 

As Comissões Parlamentares de Inquérito são instrumentos à disposição da minoria parlamentar para investigar as decisões suspeitas do Poder Executivo. E todos os “investigadores” são representantes do povo ou dos estados, como acontece no caso do Senado Federal. Então, nós e os estados deveríamos ser a causa do trabalho deles e não somos. Com evidências, não somos. Eles, e os projetos pessoais deles, são a razão da CPI. 

Se você tiver um tempinho e vontade, passe os olhos nos requerimentos aprovados pela CPI, disponíveis no site do Senado Federal. Você conhecerá pedidos e depoimentos que causarão, ao final, despesas demais para nenhuma decisão pertinente. 

O próprio requerimento de criação da CPI é uma abstração. Nele está dito que o “fato determinado para criação (exigência constitucional) é a investigação de ações, erros e omissões do Poder Executivo no enfrentamento da pandemia COVID-19 no Brasi”l. Agora, como falar de erros e omissões no enfrentamento de uma pandemia que o mundo todo só conhece superficialmente e para a qual não se tem resposta pronta ainda? 

Está claro que o final da viagem será um lugar vazio ou um precipício. 

A respeito das Comissões Parlamentares de Inquérito escreveu o advogado Ovídio Rocha Barros Sandoval, autor da melhor obra que conheço sobre o tema, “CPI ao Pé da Letra”, prefaciado pelo ex-ministro Saulo Ramos: “De há muito, sempre existiu a tentação de transformar a CPI em tribunal de inquisição. Assiste-se assim, à transformação dos inquéritos parlamentares em arma política, de pura conveniência partidária de um grupo de parcialidade sem o objetivo de resguardar a legalidade, a moral administrativa ou os legítimos interesses do Tesouro. Uma transformação que importa em fraude à Constituição”

Essas situações acontecem no Brasil porque os seus agentes promotores não se incomodam com a conta que espetam no contribuinte e essa é a minha repetida invocação a quem possa me ouvir e decidir. 

O liberal Vargas Llosa identifica a nossa civilização como a do espetáculo. Com esse sentido é fácil entender a CPI da Pandemia. Os senadores desejam bastante a popularidade, mas não pela intelectualidade ou pelo espírito público, mas pela capacidade histriônica de criar exibições que a mídia aproveita para fazer dinheiro. É em tudo lamentável. Lamentável e caro. Principalmente, para um país que deveria ver diminuído o peso insuportável que o Estado coloca sobre os ombros da população. 

Eleições são processos que custam muito dinheiro, não para os candidatos, mas para toda a Nação. Por isso seria de bom conselho, que depois dela os eleitos cumprissem o papel para o qual foram escolhidos e não é o de serem eternamente candidatos, como se vê acontecer, agora, na CPI da Pandemia. 

Boa semana para vocês. Até a próxima segunda-feira. 

Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Antônio e Paulo

Por causa do satânico COVID-19, estamos a viver tempos de precipitados anúncios fúnebres de gente que ainda vive. Assim foi que, na semana passada, me chegou a notícia do falecimento do senador gaúcho Paulo Paim, quando, na verdade, faleceu Antonio Paim, aos 94 anos. De comum entre os dois, o sobrenome e a posição na cadeia evolutiva. 

O Boletim da Liberdade, em primeira mão, deu a notícia do falecimento do Antônio Paim, a quem dedico o assunto de hoje. Contudo, antes de avançar, faço registro de uma matéria publicada pela revista VEJA desta semana, assinada pelo Thomas Traumann, sobre o que “os cactos de Juliette ensinam aos candidatos a presidente”. 

Juliette tornou-se campeã do BBB e “cactos” são os seus seguidores. O ensinamento é sobre o uso das mídias digitais na composição da estratégia de vitória dela. 

Não entrarei nos pormenores da matéria, que deixarei para o meio apropriado, o programa ao vivo de quinta-feira. Eu toco no assunto aqui para lamentar que alguém acredite valer como ensinamento para quem disputa mandatos no Estado Brasileiro, as lições de Juliette para os seus “cactos”. Se assim for, teremos candidatos cada vez mais divorciados da arte de fazer política para casarem-se em definitivo com o espalhafatoso espetáculo de desumanização. O belo e bom da disputa política é a arte de convencer pelo debate, vencer pelo contraditório e dar ao ser humano o lugar essencial no mundo. 

Dito isso, eu retorno ao curso da minha argumentação de hoje, sobre Antônio Paim e a notícia falsa sobre o Paulo xará, separados eles por um processo de amadurecimento político, que eu diria ser, na verdade, de conversão, assim como aconteceu com Saulo de Tarso, depois tornado Paulo, no episódio na estrada para Damasco. Uma conversão sem volta, porque a nova vida passou a ter mais sentido que a antiga. Saulo deveria ter recebido Antônio como nome novo. 

Numa conversa maravilhosa que teve com Bruno Garschagen – disponível no YouTube – Antônio Paim conta como se deu o processo de saída dele do comunismo rumo ao liberalismo. Uma conversão! 

A entrevista, gente, é maravilhosa! É uma aula de vida que faz uma hora parecer aqueles poucos minutos que os profissionais modernos de comunicação dizem ser a oportunidade única de chamar a atenção de alguém. 

Antonio Paim, no diálogo com Bruno, disse que chegou a se preparar “interiormente para virar um bolchevista”, o que significava, disse ele, perder o mínimo de humanidade, para não ter amigos, família e alma. “Uma coisa brutal”. Nesse momento, Antonio Paim traz à memória o verdadeiro autor do Big Brother, George Orwell: “No 1984, Orwell dá um exemplo de como o processo comunista é a desumanização da pessoa. Tem lá as sessões de ódio”. 

A minha primeira experiência literária com Antônio Paim foi em 1980 ou 81, pelos textos dele nas apostilas do Curso de Introdução ao Pensamento Político Brasileiro, um curso de extensão promovido pela Universidade de Brasília. Antonio Paim publicou a “Opção Totalitária”, “Correntes e Temas Políticos”, este com Reynaldo de Barros, “O Socialismo” e “O Caudilhismo”. 

Daquele tempo em diante, passei a ser leitor assíduo das obras do Antônio Paim. De duas, gostei bastante: “A Querela do Estatismo”, estudo sobre o patrimonialismo e “História do Liberalismo Brasileiro”, que de edição mais recente – de 2017, acredito – fazem parte Bruno Garschagen, Lucas Berlanza e Marcel van Hattem, autor do posfácio. O prefácio é do editor, também intelectual, Alex Catharino. São quatro pensadores que tomam a cultura política como algo que faz bem mais pelos seres inteligentes do que transformá-los em “cactos” 

A história de Antônio Paim é mais uma prova de que o liberalismo não chega à vida das pessoas num improviso, principalmente, no Brasil, onde o Estado vicia e engana até mesmo os mais avisados. Olhem o caso do outro Paim, daquele que é Senador da República pelo Rio Grande do Sul. Ele e todos os que pensam como ele acreditam que o Estado é capaz de multiplicar pães e peixes, mesmo que não haja entre o povo, quem ofereça ao milagre as primeiras unidades, situação que o próprio Cristo não pode dispensar. 

Este meu texto chegará às minhas leitoras logo após o Dia das Mães e não quero perder a oportunidade de dizer que o Estado Brasileiro, por não ter alma, jamais será mãe. É Lady Macbeth, aquela que pediu aos demônios para lhe tirarem a humanidade e não Maria, aquela que cumpriu a nobre missão de fazer retornar a esperança ao mundo. 

Os agentes do Estado, quando querem ser mãe para uns, são madrastas para todos os outros. Para serem mães para Paulo, mães jamais serão para Antônio. 

Feliz semana. Feliz dia das mães! 

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos