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O dia em que Jean Wyllys e Bolsonaro concordaram

Algo inusitado aconteceu no fim de semana: Jean Wyllys e Jair Bolsonaro expressaram a mesma opinião, cada um a seu modo próprio, sobre a declaração do governador Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul. Ele declarou-se gay, na entrevista que concedeu ao Pedro Bial.

Jean Wyllys desacreditou a declaração do governador, quando escreveu: “É ridículo ver héteros querendo impor a nós, LGBTQs assumidos e na luta desde sempre, que louvemos sem crítica o outing de um governador de direita que até ontem era jagunço de um racista homofóbico que se revelou genocida. Fica fácil assumir-se gay e catalisar a solidariedade acrítica dos cúmplices e ingênuos, quando o movimento “LGBTQ” virou um “nicho de mercado rentável”.

Jair Bolsonaro caminhou a mesma estrada, com o jeito debochado que lhe é próprio. A declaração dele aconteceu na entrada do Palácio da Alvorada, momento em que, todos os dias, ele se encontra com eleitores dele. Sobre a declaração do governador, disse Jair Bolsonaro: “O cara, ontem, achou que é o máximo. Se achando o máximo. Bateu no peito: eu assumi. É o cartão de visita para a candidatura dele”.

Jean Wyllys e Jair Bolsonaro fizeram coro harmônico no papel de tentar determinar o comportamento de outra pessoa, atitude altamente autoritária e que distancia os dois do campo liberal. À esquerda e à direita, estão postos os autoritários. Talvez por isso, o liberal Ortega, no livro “A rebelião das massas”, afirme: “Ser de esquerda, como ser de direita, é uma das infinitas maneiras que o homem pode eleger para ser um imbecil. Ambas são, de fato, formas de hemiplegia moral…”

Mas, se a declaração do governador Eduardo Leite de ser gay causou frisson e se fez matéria na imprensa, a intenção dele na entrevista, me pareceu outra. Antes de entrar neste aspecto, chamo a atenção para a melhor parte de tudo o que disse o governador ao Pedro Bial. Eduardo Leite definiu os termos da reforma que ele defende para o Estado Brasileiro: “Um Estado que precisa ser repensado na sua estrutura, no seu tamanho, para definir onde ele deve estar mais presente, onde ele libera para que o setor privado possa assumir um papel mais relevante. Um Estado que tenha também uma proposta sobre inclusão social, sobre o respeito à diversidade, sobre trazer as pessoas para o serviço público com mais qualidade. Para quem o governo serve? O Estado deve tocar na vida das pessoas que mais precisam”.

Eduardo Leite falou também sobre as credenciais que tem para ser Presidente da República: as reformas que promoveu em Pelotas e no Estado do Rio Grande do Sul. E complementou referindo-se, claramente, aos principais adversários, Lula e Bolsonaro: “Precisamos tirar o Brasil dos extremos. O debate não pode ser sobre o que fomos (Lula), nem sobre o que somos (Bolsonaro), mas sobre o que podemos ser no futuro”.

Em seguida, Pedro Bial fez a pergunta que produziu a declaração que incomodou Jean Wyllys e Jair Bolsonaro. Deixemos claro, que Pedro Bial não perguntou sobre a opção sexual do governador, mas sobre as prévias do PSDB, onde Eduardo Leite concorre com outros tucanos, entre eles, João Dória.

A pergunta do Pedro Bial foi: “O governador de São Paulo, João Dória tem 2 trunfos: é o governador do estado mais importante do país e trouxe a primeira vacina. Que trunfos  você tem que João Dória não tem?”

A resposta do governador me passou o desejo dele de responder ao Doria de modo subliminar. “Integridade. Ser por inteiro. Eu nunca falei de um assunto que eu quero trazer pra ti aqui no programa, que tem a ver com a minha vida privada e que não era um assunto até aqui, porque se deveria debater mais o que a gente pode fazer na política e não exatamente o que a gente é ou deixa de ser. Mas, nesse Brasil com pouca integridade, a gente precisa debater o que se é, para que fique claro e não se tenha nada a esconder. Eu sou gay…”

Durante seis minutos e catorze segundos, esse foi o tema da entrevista. E alguma coisa na longa resposta do governador me diz que o fato de ele ser gay pode ter sido usado como atributo negativo na disputa interna no PSDB e – tomara que não – exatamente pelo governador João Doria. das prévias no partido e, ao quando ele se apresenta para a disputa prévia. Se eu estiver certo, teremos Jean Wyllys, Jair Bolsonaro e João Dória no mesmo papel autoritário. E, cá entre nós, a imagem deles me permite a dúvida.

Olhando o todo da entrevista e o que dela separaram Jair Bolsonaro e Jean Wyllys, socorro-me de um pequeno trecho de um livro bem interessante para os tempos atuais: “Podres de Mimados”, de Theodore Dalrymple, que indico como boa leitura. Diz o autor: “É comum que se pense ter uma opinião sobre um assunto, algo que é ativo, é mais importante do que ter qualquer informação sobre aquele assunto, que é passivo; e que a veemência (sentimento) com que se sustenta uma opinião é mais importante do que os fatos (conhecimento) em que ela se baseia”.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Montagem/Fotos: Daryan Dornelles (Jean Wyllys) e Fabio Pozzebom/Ag. Brasil (Jair Bolsonaro)

Por Jackson Vasconcelos