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Um convite para morrer

Trago à análise hoje a entrevista do Ciro Gomes ao Broadcast do Estadão, para mostrar a vocês um discurso que não deve fazer quem deseja ser candidato a presidente de um país de gente em desespero à busca de esperança. Não é por acaso ou falta de sorte que Ciro Gomes já foi candidato a Presidente da República três vezes e todas elas derrotado. A razão: o discurso equivocado.

Entrevistado por duas jovens jornalistas, Ciro discorre sobre o desejo de punir os parlamentares do PDT que votaram a favor da reforma da previdência, principalmente, a jovem deputada Tábata do Amaral. Age com arrogância quando chama para ele a exclusividade de ter lido as sessenta e tantas páginas do projeto. E chega à pergunta sobre o futuro político dele: 

Pergunta: O Bolsonaro fez questão de se colocar ali como candidato à reeleição, para que não haja confusão sobre quem será o nome do governo. O senhor já se coloca como alternativa da oposição ao Bolsonaro? Como está sendo esse trabalho dentro do PDT? 

Resposta (um convite ao suicídio coletivo): 

“Com a experiência que eu tenho, devo dizer uma coisa a vocês, que vai ficar aqui documentada. O Brasil vai passar por tanta confusão, por tanto desmantelo, por tanta frustração, que haverá aí uma convulsão na política muito forte. Espero que isso não descambe para a violência pura e simples, porque as energias estão se acumulando pra isso”, e segue…

“O dissídio nacional está sendo… porque na medida em que a população… imagine um jovem da periferia de São Paulo… qual é a expectativa de pertencimento que ele tem nessa ficção em que está se transformando esse negócio chamado Brasil? Sabe qual é o futuro desse garoto que está estimulado pelo compre, compre, compre sem ter dinheiro? A morte ou a cadeia. E ele sabe disso. Está vendo os coleguinhas dele sumirem pela morte e pela cadeia, numa estúpida guerra contra as drogas que já está perdida”, tem mais…

“E a elite branca e prepotente querendo fazer do sonho dela uma casa em Miami. Isso está por aí para acontecer. Então a minha compulsão é continuar fazendo o que eu fiz a minha vida inteira. Cumprindo a minha obrigação. Se isso vai virar um não uma candidatura é evidente que não vou andar mentindo. Já fui candidato três vezes. É evidente que eu gostaria de ser presidente do Brasil. Mas, será que vale à pena ainda? Será que restará um país governável se essa gente destruir as portas da industrialização perdida do país, entregando a EMBRAER pra Boeing e fechando a porta do Complexo Industrial Militar como potencial de progresso do Brasil? Isso é trivial. O Brasil está esquartejando a Petrobrás…”.

O diálogo está no tempo entre 19:17 e 21.48. Daí eu pergunto: caberia ali a crítica, sim, mas com uma mensagem de esperança, não?

Por Jackson Vasconcelos

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E os partidos, hein?

Quem manda num partido político manda mesmo. Nenhum problema essa atitude teria para a democracia, se as deliberações tivessem alicerce num conjunto de normas, em um estatuto criado e aprovado pelos filiados, e se as convenções de delegados valessem. Não é assim. Nas deliberações partidárias prevalece a vontade de quem dirige o partido que, quase sempre, tem mando perpétuo.

Os problemas acontecidos na relação da deputada federal Tábata Amaral com o PDT, do deputado federal Aécio Neves com o PSDB e dos dirigentes regionais desse partido no estado do Rio de Janeiro com a intervenção federal, que fez do suplente de senador Paulo Marinho presidente local, são exemplos recentes do modelo. Mas a história dos partidos está repleta de casos iguais ou semelhantes.

Outra causa não houve para o passeio do político Ciro Gomes e de muitos líderes políticos por vários partidos. Também não existiu para Lula ter criado o PT, Brizola, o PDT, os dissidentes do MDB, o PSDB, e Marina Silva ter queimado energia para criar a Rede. A lista de projetos políticos que precisaram de novo abrigo partidário é extensa.

Os partidos políticos deixaram de ser o ambiente onde o debate é esclarecedor, onde a deliberação pelo voto é resultado do discurso capaz de convencer. Nos partidos, quem pensa diferente de quem dirige não perde tempo com a arte de convencer. Sabe que não adianta o esforço e cai fora, para criar um partido para chamar de seu e, curiosamente, nele faz valer a regra que lhe causou problemas.

Quando incharam o fundo partidário, a vontade de comer encontrou a fome. Sem identidade ideológica e entregues ao pragmatismo dos dirigentes, os partidos tornaram-se um mercado para bons negócios, parte de um processo iniciado com o poder dos dirigentes de distribuírem, discricionariamente, tempo de TV e rádio. O fim do financiamento das campanhas por pessoas jurídicas fez crescer o poder dos dirigentes dos partidos, porque com eles está, com quase exclusividade, o poder de financiar as campanhas.

Chegamos, então, à situação presente. Alguém, para ser candidato, precisa estar filiado a um partido e ser reconhecido como tal pelos dirigentes. Para ter dinheiro para a campanha, necessita da boa vontade dos mesmos dirigentes, porque com eles está o poder de distribuir o dinheiro do fundo eleitoral.

Para ter acesso à TV e ao rádio, nos tempos de campanha, está submetido à deliberação dos dirigentes. A liberdade que viria com a vitória é uma ilusão para quem exercerá um mandato originado numa eleição proporcional (vereador, deputado estadual e deputado federal). Se o sujeito contrariar os dirigentes do seu partido será punido, porque o mandato pertence ao partido e como o partido é dos dirigentes, a conclusão é óbvia.

Se os problemas criados pelos partidos ficassem limitados às eleições, a questão que levanto seria grave. Torna-se gravíssima quando eu amplio o foco sobre o tema para verificar que são eles, os partidos, instrumentos de exercício do poder nos governos e o caminho de legitimação da alternância no poder. Eles, em última instância, controlam o aparelho do Estado que presta os serviços à população. É muito poder para estar sempre nas mãos de meia dúzia e a serviço do capricho do jogo político.

Por isso tudo, a política empobreceu e os governos, idem. Afinal, os partidos estão aí para serem o padrão da política, o ambiente para o debate e disputa democrática pelo poder. Deveria ser nos partidos, a primeira lição de um político sobre a conquista e conservação do poder e do reconhecimento da alternância como um santo remédio para a democracia.

Para tornar melhor a política, está claro, que alguma coisa precisa acontecer com relação aos partidos. Eu nenhuma dúvida tenho que o caminho seria uma reforma na base deles, para obrigá-los a democratizar as deliberações, para que as decisões ocorram pelo voto dos delegados convencionais e, quando o assunto produzir impacto nas questões programáticas, pelo voto da maioria dos filiados.

Há propostas na mesa.

Contudo, como somos um povo viciado a buscar solução nas consequências dos problemas e não nas causas, andam por aí alguns a brigar contra os fundos partidário e eleitoral e a advogar candidaturas avulsas. Que sigam em frente, mas que se lembrem que somos uma sociedade de poucos milionários e temos um modelo de governo que faria dos candidatos avulsos, eleitos sem alma.

Estamos em boa hora para rever o modelo.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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O discurso é uma música

O ano era 2016. Tempo de campanha para presidente dos Estados Unidos. Na disputa, Hillary Clinton e Donald Trump. O escritor americano Michael Moore apareceu no principal reduto do Trump, Ohio, para pedir votos para Hillary. O que ele disse e, do modo como disse, merece registro como uma peça importante da campanha. 

Usando de forma perfeita a retórica, a entonação, e a encenação, Michael Moore é didático, como poucos oradores políticos são. Mas, na didática, ele separa Hillary e Obama com uma dura crítica ao Obamacare. Eu vi isso como um problema, numa sociedade que tem fidelidade quase absoluta aos partidos. 

Para nós, brasileiros, a peça tem significado maior, pela proximidade dos argumentos do Michael Moore com as razões do voto, aqui, no Bolsonaro. Palavras para se pensar. 

Vamos ao principal trecho, mas o discurso todo, disponível no YouTube, é muito bom: 

“Porque eu conheço um monte de pessoas em Michigan que pensam votar no Trump e eles não gostam dele, necessariamente tanto, para isso. E, necessariamente não concordam com ele. São só pessoas decentes, bastante desesperadas. Depois de falar com alguns deles, eu separei algumas coisas para dizer para eles. 

Donald Trump veio para o CLube Econômico de Detroit e ficou na frente dos executivos da Ford e avisou: – se vocês fecharem as fábricas em Detroit para transferi-las para o México, eu colocarei uma tarifa de 35% para a importação dos carros produzidos por vocês lá e trazidos para cá. Vocês não conseguirão vendê-los. 

Foi uma coisa incrível de se ver. Nenhum político republicano ou democrata tinha dito nada parecido e isso foi música para os ouvidos de pessoas em Michigan. Ohio, Pensilvânia, Wisconsin.  Você mora aqui em Ohio. Você sabe do que estou falando. 

Mas, o que Trump significa é irrelevante, porque ele está dizendo coisas para as pessoas que estão feridas emocionalmente. É por isso que cada pessoa deprimida, sem nome, esquecida trabalhando duro, que costumava ser parte do que foi chamado de classe média, ama Trump. Ele é o coquetel molotov humano que as pessoas estavam esperando. A granada de mão humana que pode, legalmente, jogar no sistema, que roubou a vida das pessoas. 

No dia 8 de novembro, dia da eleição, apesar das suas contas nos bancos terem sido fechadas. Em seguida, veio o divórcio, a esposa e os filhos se foram, o carro foi confiscado, eles não tiveram férias de verdade em anos. Eles estão presos com uma merda de um plano de saúde Bronze do Obamacare, onde você não pode mesmo tratar uma simples dor de cabeça ou uma caganeira. Eles, essencialmente, perderam tudo o que tinham, exceto uma coisa. A única coisa que não lhes custa um centavo e é garantido pela Constituição Americana – o direito ao voto. 

Eles podem estar sem dinheiro, eles podem estar sem teto. Eles podem estar ferrados. Não importa, porque um milionário tem o mesmo número de votos que a pessoa sem emprego. E há mais da digna classe média do que há na classe milionária. Assim, no dia 8 de novembro, dia da eleição, o revoltado vai caminhar para a cabine de votação, pegar uma cédula, fechar a cortina e com uma caneta colocar um X bem grande no nome do seu candidato, que ameaça derrubar o próprio sistema, que arruinou suas vidas….

A eleição do Trump será o seu grito de foda-se o sistema. O maldito sistema. E todos se sentirão bem…por um dia, por uma semana…por um mês. E então, se arrependerão, porque usaram o voto para exprimir uma revolta. Estarão ferrados”.

Por Jackson Vasconcelos

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Um tsunami atropelou a oposição na Previdência

Sabe-se que as ondas do mar são formadas pelo encontro dos ventos com as águas e também que o tamanho das ondas depende da força e duração dos ventos na superfície. Esse fenômeno explica o que se viu no plenário da Câmara dos Deputados, na hora em que se votou a reforma da Previdência.

Num ambiente de águas agitadas, uma enorme onda se formou, rapidamente, em razão dos ventos da articulação política acontecida entre o presidente da casa, Rodrigo Maia, e os líderes dos partidos da base de sustentação. A onda deu um capote na oposição.

Eu estive lá na terça e na quarta-feira e percebi os movimentos. Rodrigo Maia só compareceu ao plenário para presidir as sessões quando os votos para obstruir a obstrução e aprovar a reforma estavam contados e certos. O processo de votação, pelas normas legislativas, se dá em duas fases, uma de discussão e outra de votação.

A primeira aparição do deputado Rodrigo Maia no plenário aconteceu às 21h de terça-feira e com o objetivo de acelerar a etapa de discussão da matéria, para entrar na fase de votação.

Quando assumiu a presidência – entrou no cenário –, Rodrigo Maia encontrou uma oposição cansada pelas horas intensas de debate sobre um assunto completamente irrelevante: as vaquejadas. A sessão das vaquejadas, maçante, provocou o discurso revoltado de um dos deputados, às 20h, que bradou ao microfone: “Estou aqui desde cedo para votar a reforma e nada acontece. Isso é um absurdo”.

A estratégia do deputado Rodrigo Maia e dos líderes da base funcionou. Em poucas horas, exausta, a oposição viu entrar a madrugada e encerrar-se o período de discussão da reforma da Previdência.

No dia seguinte, quarta-feira, encerrada a discussão, se teria a votação do texto base. O deputado Rodrigo Maia repetiu a dose. Ele deixou o plenário cansar com homenagens à Igreja Universal e discussões estéreis sobre a reforma, mas sem impactos no processo deliberativo. Assim ele levou a coisa toda até perto das 17h.

Com a oposição rouca de tanto esbravejar, o deputado Rodrigo Maia chegou ao plenário, pouco antes das 17h, assumiu a presidência dos trabalhos e, com mão e pulso firmes, respaldado nos acordos feitos durante todo o dia com os líderes da base de sustentação, tocou o processo de votação. Os ventos fortes das negociações nos bastidores bateram na superfície do plenário e formaram um tsunami que arrastou a oposição para uma derrota e tanto!

O passo seguinte seria a votação dos destaques (emendas que podem modificar o texto original), mas o deputado Rodrigo Maia percebeu que a situação começava a ficar fora de controle. Então, imediatamente, suspendeu a sessão e voltou às articulações nos bastidores para buscar jogo.

A limitação férrea de acesso de não parlamentares às áreas próximas do plenário da Câmara foi outra providência inteligente, porque deixou que as conversas entre deputados e deputadas, nos corredores, acontecessem sem constrangimentos.

Fiquei quase todo o tempo sediado na liderança do PSD. A sintonia dos líderes dos partidos da base aliada com o presidente da Câmara era tão ajustada que eles tiveram o controle absoluto sobre a hora exata de cada um dos passos que o presidente daria.

Quem se der ao trabalho de conhecer a história das duas Casas do Congresso Nacional confirmará um fato relevante: os momentos mais intensos de produção legislativa foram todos sob a batuta de presidentes de pulso forte na Câmara dos Deputados.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Sincericídio ou sincerivida?

Diz Denise Frossard que os políticos usam as palavras para esconder os pensamentos. Confirmo, com um adendo ousado: “Eles e elas, mas eles do que elas, na política, usam as palavras para esconderem os pensamentos”. É a elegância verbal a favor de quem não queira qualificar os políticos – eles e elas – como hipócritas. 

A hipocrisia tem sido tão fundamental na comunicação política, que se criou uma sentença: o “sincericídio”. Político sincero morre como peixe, pela boca. 

Entretanto, há algo diferente no ambiente da comunicação política, que poderá ser útil na análise do comportamento: Jair Bolsonaro. O cara usa as palavras para dizer o que pensa. O problema dele com a imprensa e com os adversários não está, portanto, no que ele diz, mas no que ele pensa, que é exatamente o que ele diz. 

O caso é boa oportunidade para quem lida com a comunicação política entender  que rumos ela terá a partir da experiência da sociedade com Jair Bolsonaro, que venceu a eleição para a presidência usando as palavras para expor o pensamento e governa com a mesma atitude. 

Juan Carlos Ortiz, orientador da campanha vitoriosa de Iván Duque à Presidência da Colômbia, integrante do Fórum Econômico Mundial de Davos, numa entrevista ao Meio & Mensagem – edição de 3 de junho – dá um indicativo sobre o que confere credibilidade à comunicação no mundo hoje: 

“Quando as pessoas compartilham conteúdo, a credibilidade salta. Os modelos de credibilidade mudaram. Antes os meios tradicionais davam credibilidade. Hoje, não é assim. A credibilidade vem com as pessoas compartilhando. Eu denomino a situação de efeito cardume. Nos movemos como um cardume e acreditamos no peixe ao lado para nos mover. Você nunca vê um cardume mobilizando-se com um peixe líder. Simplesmente é a confiança e a credibilidade do peixe ao lado que nos move”. 

E eu complemento: É impossível ser hipócrita por muito tempo com o “peixe ao lado”, porque, por experiência própria e semelhança conosco, ele saberá sempre se o que eu digo é o que penso e se o que penso é exatamente o que ele também pensa. 

Eis o retrato fiel da comunicação praticada pelo Jair Bolsonaro. 

Mas, quero aproveitar um pouco mais a possibilidade de compartilhar com vocês o que disse Ortiz ao Meio & Mensagem: 

“Classifico as marcas como bípedes. Um pé é storytelling emocional e o outro tecnologia. Para ganhar você tem que ser bípede”. O que são os políticos? Uma marca, que tem uma história de vida, que precisa de correias de transmissão para que a história que contam, cheguem às pessoas que precisam ouví-la. 

A moderna comunicação dá vida à sinceridade – algo como “sincerivida”. 

Por Jackson Vasconcelos

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A reforma essencial

A reforma essencial não é a da previdência que, sem dúvida necessária e urgente, acontecerá mesmo como remendo, se o sistema de capitalização não substituir o de repartição. A reforma essencial é a da legislação, que ordena o sistema político, causador de todos os males, inclusive daqueles que obrigam a população brasileira a rever a Previdência Social.

O sistema político brasileiro justifica, por exemplo, as ocorrências recentes entre a Prefeitura do Rio de Janeiro e a Câmara Municipal, prática comum no relacionamento entre os poderes da República em todos os níveis da federação.

Em janeiro de 2018, os vereadores do Rio de Janeiro, desconfiados com o prefeito, que demonstrava certa independência com relação a eles, enxertaram um deles no sistema administrativo da Prefeitura: o vereador Paulo Messina foi nomeado Chefe da Casa Civil e se colocou, rapidamente, no papel de um “primeiro-ministro”.

Tudo andou bem, até que a expansão dos poderes do Chefe da Casa Civil mexeu com os brios do prefeito. Momento em que Paulo Messina começou a ser tolhido.

Os vereadores, então, assessorados pela Casa Civil, criaram os argumentos para processos de impeachment do prefeito e Paulo Messina retornou à Câmara com a alegação, no primeiro momento, de defender o prefeito. Estava dada a mensagem de captura integral da prefeitura pela Câmara. A partir daí, o prefeito ampliou o número de secretarias, remanejou funções e entregou os cargos aos vereadores. Tudo isso porque a legislação brasileira autoriza que membros do Poder Legislativo, sem perderem os mandatos originais, exerçam funções administrativas no Poder Executivo, um dos defeitos do nosso modelo.

Isso acontece na relação entre a Câmara Municipal e a Prefeitura do Rio, como acontece na relação entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo no Brasil todo e em todos os níveis e cria a situação complicada de gente eleita para aprovar os orçamentos públicos e fiscalizar a aplicação deles, exercendo o papel de também executá-los. Muita gente para gastar, quase ninguém para fiscalizar.

A reforma essencial é de reorganização do sistema, para arrumar a bagunça que os vícios fizeram e têm feito.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Governo sabatinado

O Ministro Sérgio Moro foi sabatinado durante dez horas pelo Senado Federal. Lá esteve outras vezes. O Ministro Paulo Guedes, outras tantas. Os dois ministros da educação também. A Ministra Damares, idem. A Ministra Tereza Cristina, da mesma forma.

Não aprofundei a minha pesquisa. Mas, certamente todo o primeiro escalão do governo foi sabatinado pelos Senadores e Deputados Federais e participou de longas entrevistas à imprensa em razão das sabatinas nestes poucos meses de um governo de quatro anos.

Algo semelhante tem acontecido, com certeza, com os demais escalões do Poder Executivo.

Todo esse trabalho e retrabalho produziu notícias, debates e opiniões. E o povo brasileiro ganhou o quê com todo esse movimento? Muito, muito pouco… talvez nada.

O compositor Arnaldo Antunes compôs a música “Muito Muito Pouco”. A letra se encaixa direitinho no que tem sido a relação entre os poderes e o povo brasileiro:

“Tem muita gente e muito pouco pão

Tem muito papo e muito pouca ação

Tem muito pouca dúvida e muita razão

Tem muito pouca ideia e muita opinião

Muita pornografia e muito pouco tesão

Muita cerimônia e muito pouca educação”

O tempo gasto pelo governo com explicações no Congresso Nacional, a grande maioria de absoluta inutilidade pelo conteúdo e repetição, seria demais em qualquer lugar do mundo.

Contudo, representa um peso enorme sobre os ombros dos contribuintes brasileiros, pelo grau de dependência que a sociedade tem do Estado e o tamanho da conta que paga em tributos.

Não se fez ainda o cálculo exato do custo de uma sessão no Congresso Nacional, mas, sem o risco de errar, é possível trabalhar na casa do milhão. Estamos, portanto, diante de um problema.

Qual seria a solução? Estaria em se oferecer à opinião pública a informação preciosa do custo e do benefício das vezes em que os membros do Poder Executivo são obrigados a abandonar o trabalho para serem sabatinados pelos membros do Poder Legislativo. A informação envergonharia ou, quando menos, constrangeria os parlamentares na relação deles com o povo, esta sim, com poder suficiente para mudar o rumo da história.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Política pública só funciona com estratégia

A primeira peça essencial numa campanha eleitoral deve ser o discurso, porque ele dirá da razão de ser candidato. Não precisa ser bem elaborado no início no processo, mas precisa ser convincente. Quando se faz campanha para funções de Estado, como é o caso das campanhas para vereador, prefeito, deputados, senadores, governadores e presidente, o discurso precisa estar atrelado às políticas públicas, porque elas é que dão sentido à função pública.

Uma das funções da estratégia é identificar os pontos fortes e fracos de um projeto ou desafio, para dar facilidade à realização deles. Uma das questões críticas para as funções de Estado é o atendimento médico, que forma com a falta de segurança pública a equação do insucesso de um projeto político dos governantes, principalmente no Rio de Janeiro.

Uma situação se comunica diretamente com a outra, porque os crimes lotam os hospitais e a lotação deles dificulta o atendimento à população. Disso, a gente tira uma lição importante sobre administração pública: quer reduzir a pressão sobre os hospitais? Aplique dinheiro e inteligência na prevenção das causas que levam as pessoas ao sistema de saúde.

Se os governos fossem mais atenciosos com a segurança pública – atenciosos e eficazes – o sistema de saúde pública teria algum alívio.

Mas, ao considerar a falta de segurança pública como uma das causas de hospitais e postos de atendimento da saúde estarem lotados e sem condições de atendimento digno, podemos fazer o mesmo com relação a todas as políticas públicas. Por exemplo, a educação e informação. A gravidez precoce que movimenta os hospitais e postos de atendimento poderia ser evitada se as meninas e moças recebessem informação e educação. A falta de cuidado com a natureza, que produz valas negras e áreas sem sol são situações outras que impactam sobre o sistema de saúde.

Em resumo: não é aconselhável pensar política pública sem estratégia de atuação, porque a ausência dela cria a situação que a gente está cansado de conhecer: a tentativa de resolver os problemas pelas conseqüências e não pelas causas. Por isso, os governos acreditam que as dificuldades de atendimento médico estão vinculadas à falta de pessoal adequado, de hospitais, de remédios e exames. Os problemas da política pública de saúde estão muito mais na falta de políticas de prevenção do que no atendimento médico curativo.

Só com a estratégia correta se resolverá o problema da saúde. Eis aí um bom motivo para se preparar um plano de governo para as campanhas eleitorais: pensar a política pública com base em elementos de estratégia.

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos

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Quero a velha política

“Onde estiver o teu tesouro estará também o teu coração”

Essa advertência bíblica deveria pautar o debate sobre o Fundo Partidário, criado para sustentar os partidos políticos, assim como o caixa dois passou a existir para pagar as campanhas eleitorais, que causam vergonha ou medo aos financiadores. Passou a ser assim, porque a política deixou de apaixonar para ser uma atividade quase criminosa e sem sentido, sendo esta última característica a razão para a fuga das mulheres, que são bem mais pragmáticas que nós homens.

A última eleição é um alento para quem gostaria de ver a política com o perfil de outros tempos. Sim, porque houve época, não muito distante, em que os partidos e a política eram sustentados pelos militantes. Eu me lembro desse tempo.

Em 1982, vim de Brasília, minha residência naquele tempo, para organizar um partido e algumas campanhas no Rio de Janeiro. Cheguei à sede do PFL, na Almirante Barroso, no Centro do Rio, e encontrei um oficial de justiça com um comunicado judicial de obrigação de pagamento em sete dias, dos seis meses de aluguéis atrasados, sob pena de despejo logo em seguida.

Resolvi o problema em cinco dias, com uma campanha relâmpago de arrecadação que animou 816 filiados. Logo depois, providenciei a mudança de endereço para um local mais barato, cumprindo a promessa que fiz na campanha de arrecadação. A paixão dos militantes enchia os auditórios das convenções e eventos, sempre financiados com o dinheiro dos filiados. O débito em conta de mensalidades para o partido era um procedimento de rotina.

A contribuição de pessoas jurídicas era proibida como hoje é. Quando a paixão desapareceu, criou-se, primeiro, a contribuição de pessoas jurídicas e fez-se a ligação entre o financiamento das campanhas e os interesses comerciais das empresas financiadoras. Surgiu o caixa dois, porque, como em pauta estavam os interesses, era preciso preservá-los independente dos resultados de cada eleição. Misturou-se a política com os interesses comerciais, a corrupção cresceu e, para escondê-la. surgiu o Fundo Partidário.

“Misturou-se a política com os interesses comerciais, a corrupção cresceu e, para escondê-la. surgiu o Fundo Partidário.”
Ao que parece, o povo cansou de tudo isso e começou a promover mudanças. A paixão volta devagar, numa situação que os desavisados chamam de radicalização.

Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos, na autobiografia “Minha Vida”, avisa: “As campanhas presidenciais bem sucedidas exigem três pontos básicos. Primeiro, as pessoas têm de ser capazes de olhar para você e imaginá-lo presidente. Depois, você precisa ter dinheiro e apoio suficientes para se tornar conhecido. Depois disso é uma batalha de ideias, mensagens e questões”.

Nos Estados Unidos, a primeira batalha é pelo financiamento. O candidato que mais arrecada mostra que é capaz de apaixonar, de fazer com que o dinheiro caminhe na direção do coração.

Sei não, mas me parece, ao olhar as últimas eleições, que algo positivo começar a acontecer por aqui. Já tem partido que entendeu que o Fundo Partidário não é bom negócio, porque não qualifica o voto. Quem sabe, não voltará a velha política, aquela em que contribui quem acredita?

*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.

Por Jackson Vasconcelos