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Uma Carta? É só isso mesmo?

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Temos agora uma Carta-Manifesto em favor da Democracia. Mas, de que tipo de democracia estamos a defender e que autoridade têm os missivistas ? Antes de avançar com as minhas considerações sobre o tema do momento – uma carta – sugiro que os meus leitores, gente que tem, com certeza, paciência infinita comigo, leiam a entrevista que Vargas Llosa concedeu à Folha de São Paulo no final de semana. Destaco duas passagens, numa ele sintetiza a opção pelo liberalismo e na outra, provocado pelo entrevistador, Vargas Llosa me lembrou uma passagem na entrevista que Catarina Rochamonte concedeu ao canal do Boletim da Liberdade. 

Sobre a conversão de Vargas Llosa ao liberalismo: “Isso foi uma experiência que tive nos anos que vivi na Inglaterra, nos anos de Margareth Thatcher (1979-1990). Impressionou-me muito a maneira como a Inglaterra, que havia entrado em decadência gradual, se levantava com grande energia, convertendo-se no primeiro país europeu…”

Sobre o que nos disse Catarina Rochamonte: É um grande erro, disse Vargas Llosa, “tomar o liberalismo como desenvolvimento econômico e não ter em conta os problemas que existem em cada sociedade. Isso o liberalismo mostra de maneira maravilhosa – cada sociedade tem uma problemática que deve resolver. A resolução demanda um conjunto de medidas”. 

Bem, vamos à tal Carta em Defesa da Democracia. 

Com 11 anos de idade, eu soube que o Presidente da República tinha sido apeado do poder, por uma declaração simples do Presidente do Senado Federal, Senador Auro de Moura Andrade. Achei aquilo um absurdo, mas meu pai me disse: “O povo quer assim. Esse é o preço da democracia. Quando o povo quer alguma coisa, o Poder tem que ceder”. 

E, de fato, o povo parecia querer aquilo. A imprensa falou em mais de 1 milhão de pessoas nas ruas do Rio de Janeiro, em São Paulo, em Minas e as rádios clamavam por uma “Rede pela Democracia”. 

O povo foi para as ruas pedir que o Exército tomasse o poder, antes que o Comunismo o fizesse. Aquilo tudo me parecia confuso, porque o Presidente João Goulart estava no poder pelo fato de ser vice-presidente da república, quando o Presidente Jânio Quadros renunciou. Mas, não era um vice-presidente desses que temos hoje que são eleitos na garupa do Presidente. Era um Vice-Presidente eleito pelo povo para, quando houvesse necessidade – e houve – assumisse, em nome do povo, a Presidência da República. Eu olhava tudo aquilo e pensava:  será que esse povo não sabe exatamente o que quer? 

Eu tive a resposta antes de completar 12 anos de idade. O povo serviu de degrau para a mais dura ditadura depois de Getúlio e precisamos atravessar um deserto, sem Deus no comando. Não houve quem do céu fizesse chover o pão. A “Marcha da Família com Deus pela liberdade”, perdeu a companhia de Deus e a liberdade. 

A travessia foi difícil e dolorosa e muitos ficaram pelo caminho. Com muita luta, o povo obteve de volta a prerrogativa, que ele mesmo, de vontade própria, entregou aos verdugos.  

É o que acontece agora com esse monstrengo que as elites brasileiras vangloriam-se de assinar, lideradas por um ex-presidente que ainda deve explicações ao povo brasileiro. A Carta é um Manifesto que se diz a favor da democracia, mas ela não contém um parágrafo, uma palavra sequer que indique a necessidade de aprimorar as conquistas obtidas a duras penas para nos livrar das consequências do golpe que, em 1964, defenestrou um Presidente eleito pelo povo. 

Na verdade, a Carta é um libelo político construído pela oposição ao Presidente da República e tem como argumento as dúvidas que ele levanta sobre a segurança das urnas eletrônicas. E, por ser uma manifestação de vontade de uma parte do povo, a Carta deixa de ser um ato a favor da democracia. É, simplesmente, um panfleto de campanha. 

No Brasil fala-se e ouve-se de tudo sobre as urnas eletrônicas. O que se precisa resolver, na verdade, é se o Tribunal Eleitoral pode permanecer com a prerrogativa que o sistema de votação lhe dá, de ser o fiscal dos resultados em nome do povo, porque é desse modo que o modelo funciona. O eleitor vai à urna, indica suas preferências, o Tribunal apura e diz que o resultado é a fiel manifestação da vontade do eleitor. Mas, não é disso que a Carta trata. 

Outros modelos levam os partidos para a ponta da conferência da vontade dos eleitores, como já aconteceu no Brasil, antes da existência das urnas eletrônicas. Houve uma enxurrada de fraudes, isso é verdade, mas, novamente, o povo brasileiro optou por resolver seus problemas pelas consequências e não pelas causas. 

Eu tenho certeza que o povo, esse elemento esquecido pelas elites políticas e culturais, se consultado, saberia responder se confirma ou não a prerrogativa que está dada ao Tribunal Eleitoral. Simples, não? É ouvir o povo, ato essencial para se conceituar um sistema como democrático. 

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