Eu gostei do que houve em Washington. Não gostei do que fez o imperador Zuckerberg. Em Washington, o povo americano mostrou o quanto evoluiu a relação da polícia com a população. Zuckerberg reafirmou que não tem essa de liberdade de expressão nas redes dele, que nós, muitas vezes, julgamos serem nossas – meu facebook, meus faceamigos, meu Twitter ou meu Instagram. Tudo isso pertence a uma só pessoa, ao senhor Mark Elliot Zuckerberg. Ele é o dono, decide com quem você fala o que fala.
Você, certamente, viu as cenas da invasão do Capitólio e ouviu os repórteres e comentaristas sobre a ocorrência. Para completar o conjunto, há a matéria de Ernesto Neves na VEJA da semana, que mereceu capa e um box de memória assinado por Monica Weinberg. No box está a entrevista do Presidente Trump às Amarelas em 2014. A chamada tem tudo a ver com a gente: “Brasileiros, me aguardem”. Nós aguardamos e ele aqui chegou em 2018. Se estamos a gostar disso ou não, cada um tem liberdade para sentir e dizer.
O trabalho do Ernesto Neves tem uma passagem – um trecho curto – que dá a dimensão do conhecimento que ele tem da História. Está escrito: “Foi como se – numa comparação exagerada, mas didática e necessária – Roma fosse tomada pelos bárbaros. Numa palavra: vergonhoso”. A comparação não é exagerada, menos ainda didática, ela é equivocada, porque bárbaros eram povos não romanos e vergonhoso era o comportamento dos imperadores. Nos tumultos em Washington, os americanos fizeram todo barulho. Enfim, é a imprensa que temos.
Adiante! Sugiro que você, minha cara leitora, meu caro leitor, com os olhos nisso tudo assista – se você ainda não assistiu – “The Trial of the Chicago 7” – no Brasil, “Os 7 de Chicago”, disponível no NETFLIX. Assista, mesmo que você conheça plenamente o caso ou tenha lido Battleground Chicago. O filme é a reprodução no cinema do julgamento de um grupo de jovens ativistas, que foi ao Lincoln Park em Chicago para protestar contra a Guerra do Vietnã. Escolheram Chicago pela visibilidade que a Convenção Nacional dos Democratas daria ao evento – “o mundo todo está nos vendo”. Afinal, o Democrata Lyndon B. Johnson estava na Presidência dos EUA e tinha autorizado a ida de mais 500 mil soldados americanos para a guerra.
O mundo ferveu em 68 e nos EUA o calor se fez maior, com o assassinato de Martin Luther King e Robert Kennedy.
O filme, tanto para quem sabe a história real como para quem não sabe, é um bom exercício para se conhecer o comportamento da polícia em 1968 e agora. Por todos os motivos de pressão popular, a polícia nos EUA me pareceu um tanto melhor. E, se melhorou de fato, isso se deve a uma questão fundamental: o povo reage sempre às violências da polícia, seja contra negros, seja contra brancos. Um povo que não reage a elas e as aceita como inevitáveis, um dia será a vítima.
Outro ponto relevante: as cenas do julgamento dos jovens ativistas, um deles negro, agridem quem tem a exata noção do que é a liberdade de expressão e nesse ponto, entro com o mago Zuckerberg.
No julgamento dos sete de Chicago, que foram durante um tempo, oito, o Juiz Julius Hoffmann manda amordaçar e amarrar na cadeira o réu negro, Bobby Seale, para impedir que ele continuasse a pedir a presença de um advogado ou a ter o direito a fazer a própria defesa. O juiz negou-lhe o advogado e a defesa pessoal e também negou ao júri o depoimento essencial de uma testemunha apresentada pela defesa.
Quando o Facebook, o Twitter, o Instagram e etc amordaçam quem os contraria, nos dão uma notícia: os espaços que usamos têm dono e não somos nós, assim como acontece e sempre aconteceu com a imprensa tradicional. O acesso é selecionado pela opinião. Por isso, às vezes o povo prefere ir gritar nas ruas, não importa quem seja o déspota. O ser humano nasceu para a liberdade. Imaginem o que acontecerá ao senhor Zuckerberg se os usuários dos espaços dele resolverem buscar outro caminho. Será a aplicação melhor de uma regra básica do mercado: é dono quem paga pela propriedade.
*Artigo publicado no Boletim da Liberdade.
Por Jackson Vasconcelos