São quatro da manhã. Terça-feira. Às três, bateu a insônia, uma velha companheira, que andava meio sumida. Nunca deixou saudades. Mas, quando chega parece acender a paixão pelo silêncio e escuridão. Como é bom ouvir o silêncio!
Vivo os tempos tensos de mais uma campanha eleitoral, uma rotina à qual eu já deveria estar acostumado. Não estou. Eu me envolvo nesse troço até à medula. Nunca consegui, neste campo, fazer o meu trabalho, receber por ele e tocar a vida, independente do resultado.
Culpo-me por isso. Não enriqueci, como outros conseguiram enriquecer, mas paguei as minhas contas, que hoje somam alguns remédios. Nada grave. Só esses de controlar pressão e evitar a diabetes. Há também um comprimidos para aumentar a imunidade. Teve um tempo que ela baixou. Meu Deus, me deu trabalho.
Este ano, em especial, eu não deveria estar preocupado, porque a campanha não merece o nome. A anterior também não mereceu.
Faz tempo que os deputados federais e senadores colocaram na cabeça que melhor é ter mandatos sem ter campanhas. Natural, porque campanhas eleitorais com festas, discursos, palanques, jingles, lembram democracias e o Brasil não gosta muito disso. Está mais afeiçoado às ditaduras e não poderia perder a chance de inovar, de criar mais um tipo: a ditadura dos partidos políticos. Melhor dizendo: dos donos dos partidos políticos. Sim, porque é isso o que temos por aqui, uma ditadura dos caciques que comandam os partidos. Eles escolhem os candidatos que vão disputar, são os donos dos tempos de TV e rádio e, de uns tempos pra cá, donos também do único dinheiro que se pode gastar com campanhas.
Já tivemos a ditadura do Getúlio, tivemos as dos generais, estamos sob a batuta da dos juízes e, que mal faz, somar esta a dos donos dos partidos?
É assim que pensam os legisladores, deputados e senadores. Chegamos onde eles sempre sonharam chegar: eleições sem campanhas, para extrair de vez o povo do processo. Pra eles, povo é bicho chato, que incomoda, que cobra, que tá ficando de saco cheio e irritado de só pagar a conta das festas sem participar dos banquetes.
Com certa melancolia, percebo que a minha profissão acabou. Sinto-me um fabricante de galochas e ceroulas, coisas que ninguém usa mais.
Mas, vamos à derradeira. Depois dela, quem sabe, possa interessar a alguém pagar algum dinheiro para ouvir as histórias que as campanhas criaram por aí. Já comecei a andar nesta trilha com “Que raios de eleição é essa?”
Vamos em frente. Vou assistir o amanhecer.
Por Jackson Vasconcelos