Jackson Vasconcelos, 09 de dezembro de 2024
Toda vez que Emmanuel Macron é o tema, cabe lembrar, rapidamente, que ele chegou à Presidência da França impulsionado por dois elementos essenciais numa campanha eleitoral: estratégia e sorte. Para organizar a estratégia, Macron observou de perto os movimentos políticos que surgiram na Europa (Podemos na Espanha e Cinco Estrelas na Itália), analisou a campanha de Barack Obama nos Estados Unidos e usou todas essas informações na composição de uma pesquisa qualitativa com amplo arco de consultas, para identificar distritos e setores mais representativos da França dispostos a ouvir o discurso dele. Além disso, Macron percebeu que com os partidos tradicionais ele não conseguiria dar credibilidade ao papel de outsider. “Decidi não pagar nenhum tributo a um sistema político que nunca me reconheceu verdadeiramente como um dos seus”, disse Macron ao gritar o movimento En Marche!, que agregou uma multidão de eleitores por toda a França.
Houve também a sorte. O candidato favorito, que apresentava chances reais de vitória, François Fillon, centro-direita, foi apanhado numa denúncia de nepotismo e desintegrou-se.
No momento, o senhor Presidente da França, Emmanuel Macron, quebrou a cara. Ele, duas vezes, desafiou o parlamento francês e deu com os burros na água. Duas vezes! A primeira aconteceu quando o partido dele foi derrotado na eleição para o Parlamento Europeu. Ele, então, dissolveu o parlamento e convocou novas eleições. Fazia pouco tempo que ele tinha vencido com folga a eleição para um segundo mandato. Deve ter acreditado que o povo não lhe faltaria. Mas, um povo que se preza é sempre soberano – tem o poder de fato e de direito.
Na nova eleição, o partido do Senhor Presidente não conseguiu a maioria das cadeiras no parlamento. Essa qualidade ficou com a extrema-esquerda. Restou para Macron o consolo de ter a extrema-direita de Marine Le Pen, sua adversária relevante, no terceiro lugar e ele em segundo.
Macron não aceitou o resultado com facilidade e levou meses para indicar um novo Primeiro-Ministro. Queria fugir da obrigação de entregar a função à vencedora extrema-esquerda. Procurou daqui, buscou dali e indicou Michel Barnier, representante da centro-direita, várias vezes ministro. Uma escolha, portanto, um tanto lá, um tanto cá.
Michel Barnier, contudo, durou pouco. A esquerda unida à direita, por todos os extremos, firmou uma moção de censura e obrigou Barnier a renunciar. A imprensa francesa já aponta pesquisas com o desejo da maioria dos eleitores pela renúncia do próprio Macron, que, imediatamente, foi à TV discursar para os eleitores franceses: “O mandato que vocês me deram é de cinco anos e eu o exercerei até o fim”.
Há, na França, portanto, uma crise política, mas nada que o próprio modelo político não resolva sem ti,ti,ti ou mi,mi,mi dos políticos. O Poder Judiciário? Esse nem se atreve!
Eis a vantagem do parlamentarismo. Mas, o povo brasileiro, apesar de todos os problemas políticos que temos por aqui, foge dele como o diabo foge da cruz. Pena, não?
Mas, não posso encerrar esse texto sem comentar um pouquinho a mais sobre o senhor Emmanuel Macron. Tenho nas minhas estantes dois bons livros sobre Macron, um deles escrito pelo próprio com o título “Emmanuel Macron Revolução – A Autobiografia de um líder” e o outro, “Macron por Macron”, uma coletânea de entrevistas feitas com ele antes da chegada dele à Presidência.
Do meu primeiro livro – Revolução – destaco uma curta passagem quando Macron relata a experiência dele como Ministro da Economia, bem apropriado para esse momento. Diz ele: “Tive também fracassos, os quais reconheço com tristeza”. E quando detalha esses fracassos, que ele atribui às dificuldades impostas a ele pelos agentes políticos, ele declara: “Quaisquer que tenham sido os entraves encontrados em minha ação, essa iniciativa nunca foi construída “contra” e sim “para”. “O contra não existe”, dizia Malraux. Sou um homem do “para”.
Do segundo livro, uma obra curtíssima, com 124 páginas somente, retiro a resposta de Macron a uma pergunta que cabe bem aos políticos do Brasil neste momento. A pergunta foi:
O que deve ser combatido para mudar o sistema?
Macron: O fatalismo e a desconfiança. Fatalismo é pensar que não existe uma alternativa dentro do sistema político, apenas sucessão. Decidimos que nosso sistema político foi confiscado pelos aparelhos que decidem por nós, que funcionam como filtro…Esse fatalismo é terrível, porque alimenta a aversão ao político, o ceticismo e o ensimesmamento. Leva às carreiras longas e ao estabelecimento de uma relação patrimonial com a vida política. Além disso, leva a aceitar, em certos períodos, a derrota elegante que preserve um aparelho político para, em seguida, ressurgir. Isso é inaceitável para quem ama seu país e as ideias…O papel da política é o de explicar, de levar uma ideologia no sentido nobre do termo, levar uma visão do país para uma comunidade, levar valores.”