Poderia um senador ser preso e permanecer senador? Continuar preso, se é senador? A prisão do senador Delcídio Amaral abriu o caderno de dúvidas e o Senado ficou enrodilhado nele um tempo considerável. A sessão no plenário principal começou de um jeito e terminou de outro, porque os canais da internet entupiram com mensagens de eleitores berrando pela permanência do senador na prisão.
Delcídio está preso, então, diz o Senado Federal que um senador pode ser senador na cadeia. Estranho, não? Sabem por quê? Porque está preso um sujeito que tem as prerrogativas de:
- Processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Ministros de Estado, os Comandantes das três Forças Armadas, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República, o Advogado-Geral da União, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, nos crimes de responsabilidade e os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles.
- Aprovar previamente, a escolha de Magistrados, Ministros do Tribunal de Contas da União, Governadores dos Territórios, Presidentes e Diretores do Banco Central, o Procurador-Geral da República.
E não para aí. Tem mais. Há um sujeito preso que, por continuar senador, tem a atribuição de:
- Autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e Municípios.
- Suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.
E há muito mais no artigo 52 da Constituição Federal.
Em tal situação, como deveriam ter agido os poderes da República?
O Ministério Público, ao conhecer as gravações que incriminam o senador e outras pessoas, deveria solicitar a prisão dos que não têm mandato e, imediatamente, entregar o caso do senador ao Supremo Tribunal Federal, que daria conhecimento do fato ao Senado. Por sua vez, o Senado encaminharia o assunto ao Conselho de Ética pela quebra de decoro. Vencido os protocolos, o plenário cassaria o mandato do senador, que seria, imediatamente, preso.
Nisso nascem duas questões? Quanto tempo tudo isso levaria? O senador seria mesmo cassado?
Ah! Aqui está o problema que justifica todo o procedimento com o senador Delcídio Amaral. O Senado Federal que temos não deveríamos ter. O Presidente está sob investigação pela suspeita de haver cometido crimes semelhantes ao do colega Delcídio. No Plenário está o senador Fernando Collor, tem todo o jeitão de um dia ser colega do Delcídio também de cela.
Na Câmara dos Deputados, casa vizinha do Senado por localização geográfica e irmã siamesa nos procedimentos, há um deputado que manobra como quer o Conselho de Ética para não perder o mandato. Ele é o exemplo melhor do como seria o caminho do processo de cassação do Senador Delcídio Amaral.
Bem, não dá pra terminar o artigo sem sugerir uma saída. Eu vejo o descumprimento da Constituição Federal como fizeram os poderes da República para manter preso o Senador Delcídio, até que a Constituição seja digna do nome ou o Senado, a Câmara e o governo, enfim, sejam dignos do papel que a Carta lhes confere.
Para poderes podres, uma Constituição sem valor é o melhor remédio. E, pra pensar até o nosso próximo encontro: Como será o Brasil se, porventura, a Presidente da República for presa? Haverá no presídio uma sala grande o suficiente para reunir todos os ministros nos dias de reunião ministerial?
Por Jackson Vasconcelos